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O Ladrão de Sanduíche

Summary:

Alguém no trabalho começou a roubar o almoço de Jason todo dia.

E a deixar cartas idiotas no lugar.

Notes:

essa é mais uma fanfic traduzida por mim!
a fanfic original foi escrita por amperstellar, e o link para o perfil e para a fanfic em inglês está acima.

:)

Chapter 1: O Primeiro Bilhete

Notes:

(See the end of the chapter for notes.)

Chapter Text

Inacreditável! — Jason exclama, fechando a porta da geladeira com força. Ele encara a Tupperware em sua mão, irritação o possuindo — Sumiu. De novo!

Nico desvia o olhar do seu macarrão sendo aquecido no micro-ondas — O que?

— Meu sanduíche! — Jason sacode a lancheira vazia na frente dele — Já é a segunda vez em dois dias.

Nico mastiga um biscoito preguiçosamente — Você colocou o seu nome?

— O que você acha que é isso? — Ele mostra a tampa da vasilha para Nico, em que claramente se lê: NÃO TOQUE. Esse sanduíche pertence a Jason Grace.

— Alguém continua ignorando a minha etiqueta — ele diz, irritado — e eu sei que estão fazendo isso de propósito — ele joga o recipiente vazio no balcão dramaticamente, com uma expressão de repulsa.

Nico, por sua vez, tem a audácia de revirar os olhos para ele. — Por que você está tão irritado? É só um sanduíche. Um sanduíche que você tem comido todo dia no trabalho por semanas. Talvez ele ter sido roubado é uma coisa boa, agora você pode experimentar algo diferente.

Jason bufa — Como se algo pudesse se comparar ao meu sanduíche.

Nico abre o micro-ondas. — Eu acho que macarrão de ontem é um adversário à altura.

Macarrão de ontem? Você só pode estar brincando. Eu acordo meia hora mais cedo só para preparar aquele pedacinho de pão grelhado e divino —

— Ah, qual é, nem é tão bom assim —

— a combinação perfeita de cogumelos, cebolas, maionese, queijo gorgonzola, mostarda, pimenta-caiena —

— Você disse pimenta?

— levemente torrado em ambos os lados para quando chegar a hora, ele derreter na boca, com todos os sabores se complementando para produzir uma sinfonia perfeita de —

— Você é tão presunçoso, não é nem engraçado.

— e agora algum bárbaro está provavelmente engolindo ele enquanto conversamos, sem nem sequer saboreando ou apreciando o amor e o trabalho duro que foram despejados naquele —

— Aquilo é um bilhete?

Jason para no meio da frase — O que?

Nico havia pegado a vasilha que Jason jogara no balcão e aberto a tampa. — Tem um bilhete aqui! — ele anuncia, entusiasmado — O seu ladrão de sanduíche te escreveu algo.

— Você está brincando — Jason se aproxima, arrancando o bilhete da mão de Nico e ignorando o seu “Ei!”.

É um pedaço de papel de caderno, um pouco amassado e oleoso (Jason consegue ver o cara comendo o seu sanduíche enquanto escrevia). O bilhete está escrito em uma caligrafia quase ilegível, com as letras se atropelando, e em tinta lilás. A cor nem é a coisa mais esquisita, na verdade. É a mensagem em si:

É mesmo? Acho que estou com ciúmes.

— Que diabos? — Jason franze o cenho, levemente irritado — Que desenho é esse?

— É uma piscadela.

— Uma piscadela? — Jason olha de relance para Nico, que por algum motivo parece maravilhado — E o que isso significa? Com ciúmes de que?

— Da sua etiqueta, Jason — Nico mostra a tampa para ele — Você disse que o sanduíche pertence a você, lembra?

Jason olha de relance para o bilhete. Seu coração acelera à medida em que ele se dá conta do que o bilhete quer dizer de verdade — Ah.

— Alguém tem uma admiradora secreta — Nico cantarola.

— Não tenho não — Jason diz apressadamente, tentando não corar — para com isso.

— De jeito nenhum. Você sempre faz um escândalo toda vez que eu recebo flores ou qualquer outra coisa, mesmo sabendo que é tudo do Will. Eu vou ficar tão empolgado quanto você por causa dessa sua admiradora secreta.

— Não é uma admiradora secreta! É só alguém que acha que eu sou fácil — que acha que se me elogiar eu não vou ficar com raiva por ter roubado minha comida.

— É tão difícil assim de acreditar que alguém gosta de você?

— Não — Jason responde com convicção — só estou dizendo — se alguém gostasse de mim, iria me comprar comida, não roubar de mim.

Nico dá de ombros — Talvez ela estivesse com fome.

— Bom, fico feliz que meu sanduíche ajudou — Jason resmunga — Essa é a piscadela mais idiota do mundo.

— Tá bom, talvez ela não seja boa em flertar. Ou desenhar. Mas ao menos sabemos que ela é meio amigável? Da próxima vez, escreva um bilhete de volta explicando por que você ama tanto o seu sanduíche. Se ela gosta mesmo de você, não vai mais pegar.

— E se ela não gosta de mim?

— Acho que não precisaremos nos preocupar com isso — Nico diz, sorridente.

Jason solta uma risada — Posso jurar que eu te disse a mesma coisa quando estávamos conversando sobre o Will há alguns meses.

— Pois é, e foi bem encorajador — Nico responde com gratidão — Tem um motivo para você escrever a seção de conselhos, sabe.

— Falando em trabalho — Jason suspira — eu ainda não terminei de responder todas as cartas. Annabeth vai me matar se eu não me apressar.

— Mas você ainda tem tempo para almoçar.

Jason dá de ombros — Acho que vou só comprar alguma coisa naquela lanchonete aqui perto.

Ele enfia o bilhete no bolso. Nico não deixa de notar o movimento, erguendo as sobrancelhas para Jason, antes de dar a ele o resto do macarrão que estava comendo. — Posso conseguir comida com o Will — ele explica.

— Você provavelmente vai se alimentar dele também — Jason murmura. Quando Nico só sorri em resposta, Jason arregala os olhos — Ai, meu deus, eu estava brincando! Nico, você não deveria fazer isso no trabalho!

— Fazer o que no trabalho? — Nico diz inocentemente, já se movendo em direção à porta — Não faço ideia do que você está falando.

— Quando eu for denunciar a ladra de sanduíche — Jason fala para Nico enquanto ele se afasta, rindo — nem pense que eu não vou denunciar vocês dois também!

~*~

Jason passa o resto do dia pensando no assunto. Ele pensa sobre isso enquanto lida com suas correspondências, respondendo cada triste carta com o melhor conselho que ele pode dar. Ele pensa no assunto enquanto conversa com seus colegas de trabalho, enquanto assegura Reyna de que a sua seção ficará pronta dentro do prazo. Ele pensa no assunto enquanto come o macarrão que Nico deu para ele, enquanto joga jogos no celular, e enquanto lê e relê o bilhete em seu bolso.

Por fim, ele decide quem deve ser. Apenas algumas horas depois do intervalo de almoço, ele vai ao encontro de Piper.

Ela está com os pés em cima de sua mesa, lendo um caderno e de vez em quando anotando alguma coisa nele. Ela entrevista pessoas meio famosas, e a sua seção da revista é sem dúvidas a mais lida. Ela é boa no que faz — sua personalidade amigável encanta a todos que ela conhece, e ela faz todas as perguntas certas e do jeito certo.

Ela o olha de relance quando ele entra, e se volta para o seu caderno — Oi, Jason. Se está procurando por Nico, eu o vi desaparecendo para o banheiro masculino com o Will agora há pouco. Eu acho que eles não sairão de lá tão cedo.

— Eu aposto — ele murmura — Na verdade, estava procurando você.

Isso chama a sua atenção — Para quê? — ela pergunta cautelosamente.

Sem falar mais nada, ele tira o bilhete do bolso e o deposita na mesa dela. Ela o olha com curiosidade, abaixa as pernas e o examina.

Jason aguarda com os braços cruzados, esperando ela sorrir envergonhada para ele, admitir que era uma pegadinha e devolver o seu maravilhoso sanduíche. Ao invés disso, ela levanta o olhar, o encara com uma sobrancelha erguida e diz: — Não entendi.

— O que não dá para entender? — ele diz o mais friamente que consegue — Me devolve o meu sanduíche.

— O que?

— Meu sanduíche, Piper! O sanduíche que você roubou? Devolve.

— Eu não roubei o seu sanduíche — Piper responde, parecendo genuinamente ofendida — Por que diabos eu roubaria? Como se eu não tivesse nada melhor para fazer.

— É simplesmente o sanduíche mais incrível já feito durante toda a história da Terra. Por que você não o roubaria?

— E eu faria o quê com ele? — ela exclama — Eu trouxe o meu próprio almoço e o comi. E o que um sanduíche roubado tem a ver com isso? — Ela gesticula para o bilhete.

— Eu encontrei isso na minha lancheira vazia, perto do espaço vazio gigante onde meu sanduíche deveria estar — Ele se inclina sobre a mesa e a encara nos olhos — Onde está meu sanduíche, Piper?

Ela se recosta em sua cadeira e deliberadamente coloca os pés de volta na mesa, perto do rosto de Jason — Eu não estou com ele e não sei quem está. Eu não tenho certeza se você sabe disso, mas eu tenho trabalho de verdade para fazer aqui durante o expediente. Eu não perco tempo roubando o almoço dos outros e deixando mensagens enigmáticas no lugar. Quer dizer — ela joga as mãos para o alto — com ciúmes de que? Isso nem faz sentido.

Jason a estuda com os olhos estreitos. Ela não desvia o olhar, e, por fim, ele pega o bilhete da mesa — Do meu sanduíche, aparentemente.

Piper franze o cenho — Alguém quer que você o coma?

Jason lança um olhar significativo para ela, e sua expressão de confusão instantaneamente se transforma em um sorriso.

— Entendi — ela sorri maliciosamente — alguém quer que você coma ela.

— Piper — Jason grunhe.

Ela arqueia as sobrancelhas para ele — Quem é ela?

— Eu não faço ideia. Não tem um nome no bilhete.

— Você pode descobrir muito a partir de um simples bilhete, meu amigo. Aqui, deixe-me ver — ela salta e o apanha, analisando-o com interesse renovado, como se fosse uma detetive tentando desvendar um caso. Agora que Jason para para pensar nisso, Piper é de fato muito boa com todo esse negócio de romance. Jason nunca tinha notado isso quando eles estavam namorando, provavelmente porque ele estava muito envolvido, mas ela sempre soube o que fazer em situações como essa. Ele recorre a ela sempre que recebe cartas sobre términos de namoro, e ela o ajuda a responder — tanto que ele se pergunta se ela não deveria receber metade do seu salário por isso.

Depois de muito tempo ela olha para ele, um brilho sábio nos olhos. Jason espera para que ela o aconselhe no que fazer. Ela abre a boca para falar.

— Essa pessoa desenha muito mal.

Jason grunhe, passando as mãos nos cabelos — Isso é tudo? É o melhor que pode fazer?

Ela estreita os olhos para o pedaço de papel — Talvez, hã, não seja uma mulher? Eu não sei, não sou especialista.

Eu te considero uma especialista.

— Desculpa — ela ri — Eu realmente não sei como te ajudar. Você poderia procurar por alguém com uma caneta lilás?

— Só porque está escrito em tinta lilás, não quer dizer que a caneta em si também seja lilás.

— Bom, pense nisso. Quantas canetas com tinta lilás você já viu que não são nem um pouquinho lilases? Tem sempre alguma identificação.

Jason morde o lábio — Eu acho que você tem razão. Mas eu não vou sair por aí fuçando pelas coisas dos outros, né?

Piper inclina a cabeça para o bilhete — Essa pessoa obviamente trabalha aqui. Talvez até nesse andar?

— Eu conheço todo mundo desse andar. Ninguém roubaria de mim. — Ele franze o cenho — pelo menos eu acho.

Piper dá de ombros, entregando o bilhete e colocando os pés de volta na mesa — Bom, então isso é tudo que posso fazer por você por agora. O mais fácil seria ficar de olho em alguém que talvez possa estar afim de você, mas muita gente é boa em esconder esse tipo de coisa, então eu não tenho certeza.

— Tá bom — Jason diz, miserável, dobrando o bilhete de novo — Se você descobrir alguma coisa, vai me contar?

— É claro. Mas, Jason?

— Que foi?

Piper fica em silêncio por um tempo, como se pensando no que dizer — Se essa pessoa está mesmo roubando a sua comida — com bilhetinho provocante ou não, isso é meio irritante, tenho que admitir — e você quer mesmo descobrir quem é, eu acho que você deve tentar algo um pouco mais radical do que procurar por canetas lilás.

Jason hesita — Como assim?

— Eu mesma não tenho certeza — Piper diz, rindo um pouco — Só o que estou te dizendo é que trabalhamos em um ambiente bem calmo. Não tenha medo de quebrar as regras um pouco, causar um pouco. Isso definitivamente entreteria a todo mundo.

— Nossa editora-chefe não vai ter algo a dizer sobre isso?

Um sorriso lentamente aparece no rosto de Piper — Eu cuido da Reyna. Agora vaza — ela volta sua atenção para o seu caderno — diferente de você, alguns de nós tem trabalho de verdade para fazer.

~*~

No final do expediente, Jason e Nico descem de elevador até o térreo. Enquanto os andares passam, Nico puxa sua jaqueta para mais perto de si e fala com atrevimento: — Alguma pista sobre a sua admiradora secreta?

— Ladra de sanduíche — Jason o corrige, ignorando suas risadinhas — E não, eu não faço ideia de quem possa ser. Mas depois de uma conversa esclarecedora com Piper, eu acho que tenho um jeito de descobrir.

Nico para de rir e olha para Jason com cautela — E de que jeito seria? — ele pergunta lentamente.

— Bom — Jason fala, tentando soar descontraído, mas mal conseguindo disfarçar a empolgação — essa pessoa espera que eu traga outro sanduíche amanhã, não é? E ela vai roubar esse também.

— Deixa eu adivinhar. Você vai escrever para ela um bilhete bem ofensivo?

Jason ri — É, eu vou escrever um bilhete. Não tenho certeza se vai ser ofensivo, mas nós temos que nos comunicar, certo?

Nico, desconfiado, estreita os olhos em resposta à evasiva de Jason — Tá bom, eu tô ficando um pouco assustado, Jason. O que você planeja fazer?

Jason sorri — Você vai ter que esperar para ver.

Notes:

as notas traduzidas da autora seguem abaixo:
"eu queria escrever jercy e um universo alternativo de admirador secreto e um ua de ladrão de snaduíche então isso sou eu fazendo tudo isso de uma vez.
(isso já estava previsto para acontecer. para o meu suposto otp, eu não faço muita coisa por esse casal)
eu espero que vocês tenham gostado do primeiro capítulo! me contem o que acharam :D"

Chapter 2: O Segundo Bilhete

Chapter Text

No dia seguinte, Jason se levanta mais cedo que o normal para ter tempo de sobra para preparar o seu sanduíche com perfeição. Ele caminha para o trabalho, sobe de elevador até o seu andar, diz oi para as poucas pessoas já presentes e coloca o seu sanduíche na geladeira do refeitório, completo até com uma etiqueta com o seu nome em letras maiúsculas e uma carta enfiada no canto da lancheira.

Caro(a) Ladrão(a) de Sanduíche,

Eu não sei quem você é ou por que você acha que pode roubar meu sanduíche, mas de uma coisa eu sei: eu não vou ficar sentado e deixar você fazer o que quiser, pelo menos não sem lutar. Quando se trata do meu sanduíche, eu não estou disposto a arriscar. Então, se sabe o que é bom para você, vai cair fora. Até lá, se divirta comendo o almoço de outra pessoa.

Sinceramente, Jason Grace

P.S. Você não consegue nem desenhar uma piscadela. Que vergonha.

A sua mesa fica apenas a alguns metros do banheiro feminino, então todo mundo que entrar lá vai passar por ele. Por mais bizarro que isso soe, é vital para o plano de Jason. Quanto ao banheiro masculino — ele mesmo pode entrar lá, então não é problema.

Mas o que é um problema é quando ele vai deixar suas coisas na sua mesa — e dá de cara com uma Annabeth zangada.

Annabeth leva o seu trabalho como redatora muito a sério, e a verdade é que a revista já teria falido se não fosse por ela. Todos os funcionários são ótimos no que fazem, mas no que eles não são bons é em cumprir prazos. E sinceramente, quem é?

Jason é um dos poucos que até então conseguiram concluir os deveres um ou dois dias antes do prazo final, então ele sempre esteve livre da ira de Annabeth. Eles se darem bem também ajuda (ao contrário de Leo e Annabeth, que discutem regularmente e proporcionam entretenimento a Jason e Nico, que assistem enquanto dividem um balde de pipoca).

Jason presta atenção por quinze minutos inteiros enquanto Annabeth o repreende por não ter entregado sua coluna pronta no dia anterior, como ele havia prometido. O prazo final é hoje e Jason ainda não está nem na metade, e ele precisa entregar no máximo até o almoço. Quando Annabeth finalmente vai embora, Jason começa a trabalhar, todos os pensamentos sobre o ladrão de sanduíche esquecidos.

~*~

Escrever a seção de conselhos não é nem metade do trabalho que Jason gostaria de ter. As pessoas à sua volta escrevem entrevistas e matérias fascinantes, entregam as mais incríveis fotos e artigos pessoais — os de Nico estão quase sempre em destaque, um talento que o tornou importante o suficiente para ter seu próprio escritório, mesmo que pequeno.

E tem o Jason. O conselheiro sentimental.

A maior parte dos seus conselhos não vem nem dele. Metade da sua função é andar por todo prédio, pedindo conselhos de pessoas que ele conhece sobre problemas que ele acha que elas saberão algo sobre. Só o que ele tem que fazer é digitar o que lhe contam. Isso faz com que ele sinta como se até as suas cartas de fãs tivessem sido enviadas para a pessoa errada — pessoas o agradecendo porque ter seguido seu conselho foi “a melhor decisão”, e não sabem que o conselho não veio nem dele.

É claro que é ótimo poder ajudar pessoas com os problemas do jeito que ele puder, mas, no fim das contas, é só uma coluna de conselhos. É tudo anônimo, então desconhecidos nunca reconhecem o seu nome como reconhecem o de Nico ou de Piper — eles nunca mandam um: “Ai, meu deus, eu amei aquele artigo que você escreveu!”.

Ele não é um escritor de verdade, não tem o emprego que ele gostaria de contar aos outros que tem, e às vezes ele se sente como se estivesse sobrando. Eles poderiam substituí-lo em um piscar de olhos e ninguém notaria. Se a revista continuasse sem sua seção, eles simplesmente expandiriam um artigo para preencher o espaço e ninguém ficaria sabendo.

É o tipo de coisa que o mantém acordado à noite, encarando o teto do seu quarto, tentando se convencer de que tudo o que importa está indo bem, então ele não deveria ficar procurando defeitos e se fazendo sentir miserável. Na maior parte do tempo ele está muito feliz, principalmente por ter um grupo de amigos incrível e um local de trabalho divertido, coisas pelas quais ele é muito grato.

Mas às vezes ele sente como se estivesse preso, e ele não consegue reunir força suficiente para se libertar.

Ele parece que sempre pensa nessas coisas quando está se apressando para terminar suas tarefas — provavelmente por sempre se perguntar se sequer vale a pena se apressar por isso — mas as horas seguintes passam sem ele perceber. Quando ele desvia o olhar de sua mesa, exausto (emocionalmente exausto, principalmente — teve uma carta de um homem tentando superar a morte da namorada que o deixou com lágrimas nos olhos), ele percebe que passou o almoço todo trabalhando.

Ele estica os braços para cima e relaxa por um momento, já imaginando o quão maravilhoso vai ser quando ele comer o seu delicioso sanduíche.

E então ele se lembra.

Ele salta da cadeira, olha de novo para o relógio. Ele tem certeza de que ninguém passou o dia inteiro no banheiro feminino, então, sem perder mais tempo, ele abandona sua mesa e corre até o banheiro masculino.

O banheiro está completamente vazio, a porta escancarada, e Nico e Will estão parados na frente dela, ambos com os rostos vermelhos e envergonhados, com as roupas e os cabelos bagunçados. Compreensível, visto que Reyna está ocupada dando um sermão para eles por alguma coisa, ao que parece. Piper está do seu lado, obviamente tentando acalmá-la.

Franzindo o cenho, ele se aproxima do grupo — O que está acontecendo? — ele pergunta.

— O que não vem acontecendo? — Reyna praticamente rosna, o pegando de surpresa. Como se esperando por isso, Piper se aproxima, colocando um braço em volta da Reyna.

— Qual é, não é culpa do Jason — ela diz suavemente — ele ficou o dia todo trabalhando. Eu passei pela mesa dele mais cedo para dizer olá e ele nem me notou.

Jason ergue uma sobrancelha para ela. Ela não tinha aparecido para “dizer olá”, ela jogou um pacote de batata Lays na cabeça dele e gritou: “Para um pouco pra comer, bobão!” enquanto passava de braços dados com Frank.

Reyna simplesmente olha feio pra ele — Assumo que ele sabia o que estava acontecendo e esqueceu de relatar para mim.

— Eu não faço mesmo ideia do que está acontecendo — Jason diz, o mais inocentemente que consegue.

— Jason não sabe. Eu não contei para ele que nós estávamos... hã, você sabe — Nico se manifesta.

— Seria extremamente perturbador se você tivesse contado — Will acrescenta.

— Espera aí — Jason levanta as mãos, encarando Nico com incredulidade — Vocês.... estavam...?

Nico dá de ombros.

O queixo de Jason cai — De novo?

— Como assim, de novo? — Reyna dispara.

— Nada — Piper interrompe — ele é idiota, não dê ouvidos a ele. Agora, eu acho que já passamos tempo suficiente falando sobre o quão inapropriado isso foi, e creio que Nico e Will aprenderam sua lição?

Ela levanta as sobrancelhas com expectativa e ambos acenam com a cabeça.

— Absolutamente — Will responde.

— Nós prometemos que não vai acontecer de novo — Nico diz.

— Pelo menos, não aqui — Will murmura, corando intensamente quando Reyna olha feio pra ele.

— Eu vou deixar isso passar por agora — ela diz — Eu sei que a atmosfera nesse escritório é relaxada e descontraída, mas isso não quer dizer que eu permitirei isso. Vocês deveriam ter mais juízo — especialmente você, Nico.

— O que? Por que eu?

— Você é mais... — ela lança um olhar de desgosto a Will — sensato.

— Não se preocupa — Piper sussurra para um Will ofendido — ela olha pra todo mundo assim, é só o rosto dela.

— Piper.

— Sim, Reyna?

— Por favor volte ao trabalho.

— Sim, Reyna.

— E quanto a vocês dois — Reyna continua enquanto Piper se afasta, apontando o dedo na direção de Nico e Will — façam o favor de manterem uma conduta profissional de agora em diante. Se vocês acham que não conseguem, estão livres para irem para casa — e ficarem lá.

Após ela ir embora, Jason se vira para Nico com as sobrancelhas arqueadas — Sexo no banheiro masculino. De novo?

Nico dá de ombros — Nós estávamos entediados, e o banheiro estava vazio.

— Nico, você tem um escritório.

— Que nojo, Jason, eu trabalho naquela mesa. Eu não vou corromper o meu local de trabalho assim. Sinceramente, você é tão vulgar às vezes.

— Ela não vai nos demitir, vai? — Will pergunta, mordendo o lábio — Tenho certeza de que foi o que ela insinuou.

— Ela não vai fazer isso de verdade — Jason diz — Ela gosta demais do Nico. É por isso que ela deixou vocês se safarem dessa vez.

— E quanto a mim?

— Bom, não é como se fôssemos sentir muito a sua falta.

— Ele só está sendo malvado, todo mundo te ama — Nico diz, fazendo carinho no braço do namorado quando ele começa a fazer beicinho para Jason — De qualquer jeito, Reyna gostar de mim não teve nada a ver com isso. Ela só nos liberou porque Piper veio ao resgate.

— Piper não vai estar sempre presente. Vocês dois deveriam ter mais cuidado. Vocês moram no mesmo apartamento, pelo amor de deus. Por que não mantêm essas atividades, vocês sabem, no quarto de vocês?

Nico bufa — Tá bom, como se você nunca quisesse fazer isso no trabalho.

— Mesmo se eu quisesse, minha primeira opção não seria o banheiro masculino — Ele olha pela porta aberta, encarando as cabines com desgosto — Lembram quando Leo achou um rato morto em uma das privadas?

— Ele estava coberto com pedacinhos de chocolate por algum motivo — Nico recorda com o olhar distante. Jason e Will se entreolham, entretidos, concordando ao mesmo tempo em não contar para Nico que definitivamente não eram pedacinhos de chocolate.

— Qual quer que seja o caso, nós não vamos repetir isso tão cedo — Will fala, colocando um braço ao redor de Nico — Quer dizer, nós podemos — ele complementa rapidamente quando Nico ergue uma sobrancelha para ele — Mas não em um banheiro público. Teve um cara que acabou com o clima.

Jason solta um risinho — Alguém esbarrou em vocês?

— Não, eu tranquei a porta.

— Você trancou a porta de um banheiro público?

Will dá de ombros — Eu achei que só iriam ao banheiro de outro andar. Mas teve esse cara que ficou batendo na porta e gritando para deixar ele entrar —

— Provavelmente deveríamos ter deixado — Nico o interrompe — Parecia ser uma emergência.

— Havia outras emergências acontecendo naquele momento também, se você não se lembra — Will sorri com malícia para Nico, que ri e abaixa a cabeça para esconder o rosto vermelho — Mas sério, cara, você deveria ter ouvido ele. Ele bateu na porta e gritou por pelo menos uns 5 minutos antes de ir embora, e — Jason, você está bem?

Jason, que estava encarando Will de boca aberta, desperta. Ele avança e agarra um Will surpreso pelos ombros — Você se lembra da voz dele?

— Hã?

— A voz dele! Você se lembra dela? Ou a reconheceu?

— Bom, eu estava um pouco ocupado então... não? Por quê?

Jason solta ele e se vira para Nico — Aquele cara — ele diz, pausando para dar ênfase — era o ladrão de sanduíche.

As sobrancelhas de Nico se erguem — O que? Como você sabe?

— Porque ele teria precisado muito, muito de um banheiro hoje — provavelmente por horas. Eu estava pensando em checar o banheiro masculino de vez em quando, mas eu fiquei tão concentrado no trabalho que esqueci — Ele dá um tapa na própria testa — Tão burro.

Trabalhar durante o expediente ao invés de perseguir o cara que roubou o seu almoço? — Will estala a língua — Que coisa mais insensata a se fazer.

Jason o encara — Como você sabe sobre o meu ladrão de sanduíche?

— Como você acha? — Will inclina a cabeça na direção de Nico.

— Ei, você não esperava mesmo que eu não fosse contar para ele — Nico diz defensivamente quando Jason olha feio pra ele.

— Não importa se eu sei ou não. A pergunta é — Will ergue as sobrancelhas para Jason — o que você colocou naquele sanduíche para forçar um cara a ficar em um banheiro por horas?

Seus olhos azuis estão brilhando com curiosidade, enquanto os de Nico parecem vagamente apreensivos. Jason se perguntou algumas vezes essa manhã, enquanto preparava seu sanduíche, se ele estava fazendo algo nocivo. Agora, com uma leve pontada de culpa no coração, ele murmura: — Um laxante.

Os olhos de Will se arregalam em horror. Nico, enquanto isso, tenta parecer horrorizado, e ele consegue por alguns segundos — até que ele bufa alto. Então ele para de tentar, desabando contra a parede e se dissolvendo em gargalhadas.

— Nico! — Will exclama em horror — Não é engraçado!

— Eu sei, eu sei, desculpa — Nico diz, ofegando entre risadas — É só que... ele colocou laxantes no sanduíche! Ai, meu deus, coitado.

— “Coitado” mesmo — Will diz com preocupação. Ele está praticamente torcendo as mãos. Jason nunca o viu assim — Isso é tão, tão errado.

— Eu sei — Jason deixa escapar. Nico continua rindo, e isso só está fazendo ele se sentir pior. Seu rosto está queimando — Mas eu não podia não fazer nada! Ele roubou o meu sanduíche!

— Que se dane o sanduíche! Você tem ideia de como isso pode ser perigoso?

Nico para de rir abruptamente — O que?

— Tem um monte de coisa que pode dar errado — Will diz — e ele sujar as calças não é nem uma delas.

Jason sente como se alguém tivesse colocado um peso em seu coração — Eu só coloquei um pouquinho — ele diz baixinho.

— Quanto?

— Só uma ou duas pílulas moídas. Isso não é tão ruim, certo?

— Como eu saberia? — Will exclama, agitado — Eu pareço um médico para você?

— Bom, na verdade —

— Devíamos contar para a Reyna — Nico o interrompe — Se há uma chance do seu admirador secreto estar precisando de ajuda, deveríamos contar para alguém, não?

— Isso foi tão irresponsável, Jason — Will fala, com a voz séria e grave. O que é irônico vindo de um cara que estava transando com o namorado no banheiro do trabalho.

— Ei, eu tinha tudo planejado! — Jason protesta — Ele iria comer o sanduíche, correr para o banheiro, e então eu o seguiria até lá. Ele se... aliviaria e eu descobriria quem roubou o meu sanduíche. E, você sabe, faria ele pagar.

— Eu acho que você já o fez pagar — Nico diz solenemente — E pensar que aquele cara tem uma queda por você. Só de pensar no que você fez deve machucar mais do que a diarreia.

Suas palavras fazem o coração de Jason parecer ainda mais pesado. No que ele estava pensando? Ele só colocou um pouquinho no sanduíche — ele não era um completo idiota, afinal — mas ele não devia ter colocado nada. Na sua mente, ele consegue imaginar o seu ladrão de sanduíche, sem rosto ou nome, entrando no refeitório de fininho, comendo o seu sanduíche com vontade, e então percebendo o que Jason fez. Ele não sabe nem quem é, mas ele sente um desejo poderoso de se desculpar de alguma forma, talvez abraçando ele — isto é, quando ele tiver terminado de cagar, é claro.

— Eu sou uma pessoa ruim — Jason murmura.

Nico aperta o ombro de Jason — Não vamos nos precipitar, tá bom? Talvez ele nem tenha comido todo o sanduíche. Você checou para ver se o sanduíche sumiu? Talvez ele tenha te deixado um bilhete?

Jason encara Nico, lentamente processando suas palavras. Então ele corre para o refeitório, arrastando Nico com ele.

~*~

A lancheira infelizmente está vazia, mas eles conseguem ver um pedaço dobrado de papel dentro, e quando abrem a tampa, Jason fica aliviado ao descobrir que não é a sua carta para o ladrão de sanduíche. Na verdade, sua carta sumiu — em seu lugar, há um pedaço de papel de caderno rabiscado em tinta lilás.

Ignorando o sorriso entusiasmado e as olhadinhas de Nico para o papel, Jason o desdobra e o alisa no balcão.

Curiosidade nº 1: laxantes tem um gosto horrível que os entrega (mas laxantes em líquido quase não tem gosto)

Curiosidade nº 2: você adoravelmente entregou o seu plano em seu bilhete, mas não se sinta tão idiota porque

Curiosidade nº 3: mesmo assim eu comi tudo, então sou mais idiota que você

Agora eu roubei o seu almoço, você me fez correr muito, então o placar está empatado. Aguardando ansiosamente pelo que vem a seguir do meu lar temporário no banheiro!

P.S. não se sinta muito culpado por isso se você está se sentindo culpado. Afinal, eu venho roubando seu almoço há alguns dias (e eu pretendo te compensar por isso)

P.P.S. Se você esbarrar nos babacas que trancaram o banheiro masculino, fala para eles eles que eles vão ter de responder pelos pecados deles no Inferno, onde ninguém irá ajudá-los

P.P.P.S. Eu vou praticar as minhas piscadelas se você continuar escrevendo cartas dramáticas. Elas são a coisa mais fofa que eu já vi

O bilhete está completamente rabiscado com sorrisinhos e corações, até mesmo um demônio muito mal desenhado perto da palavra “Inferno”. Como ele escreveu isso tudo e colocou na geladeira enquanto lidava com seus problemas privados está além compreensão de Jason.

— Eu não sou um babaca — Nico murmura — tem banheiros nos outros andares também! Diz isso para ele quando você responder.

Jason abre a boca para responder a Nico, mas uma risada escapa. Antes que ele se dê conta, ele está escorado contra a porta da geladeira tentando segurar o riso, enquanto Nico o aguarda, exasperado.

— Eu nem vou perguntar por que — ele revira os olhos, mas ele tem um sorriso no rosto.

Jason olha de novo para o bilhete, vendo a letra feia e as carinhas sorridentes deformadas. Apesar de ainda sentir o peso fantasma da culpa no seu coração, os cantos de sua boca continuam se repuxando e um calor percorre as suas veias.

Esse ladrão de sanduíche é algo especial. Talvez até algo bom.

— Isso significa que você não odeia mais ele? — Nico pergunta com um ar de sabedoria — A sua culpa e a simpatia dele te converteram?

— Nem um pouco — Jason fala, dobrando o bilhete cuidadosamente, alinhando os cantos e bordas perfeitamente — Na verdade, eu quero descobrir quem ele é mais do que nunca. Só que agora — ele enfia o bilhete no bolso, se certificando de não amassar os cantos — eu acho que isso pode ser divertido.

Chapter 3: O Terceiro Bilhete

Chapter Text

— Estou desconfiado — Jason diz.

Nico olha para ele. — Como assim?

— Pode estar envenenado.

— Eu duvido disso.

— Ah, é mesmo? Depois do que eu fiz para ele da última vez? — Jason estreita os olhos para a comida na mesa de Nico. — Eu definitivamente iria me vingar — ele diz sinistramente, ignorando o revirar de olhos de Nico e o olhar arregalado de Will em sua direção.

Ele se pergunta por uns momentos se ele deveria mesmo ter colocado a comida na mesa de Nico, considerando para que o móvel estava sendo usado há apenas alguns minutos — o cabelo de Nico ainda estava bagunçado e o zíper de Will não estava totalmente fechado (Will corava em um tom de vermelho intenso sempre que ele ficava envergonhado, então Jason decidiu não dizer nada).

Aparentemente, a bronca de Reyna no dia anterior não foi levada muito à sério pelos dois, e eles decidiram mudar o lugar das suas fugas do trabalho. Quando Jason tinha entrado no escritório de Nico há poucos minutos, ele tinha sido recebido com um grito dos outros dois, que estavam deitados na mesa de Nico (bom, Will estava. Nico estava... em outro lugar). Jason soltou um “Ai meu deus!”, e tampou seus olhos com a mão. Quando ele se virou, ambos estavam felizmente vestidos novamente, e Nico estava abanando o rosto vermelho de Will com uma revista enquanto olhava feio para Jason. Sua carranca desapareceu assim que ele viu o que Jason estava segurando.

Jason supõe que ele devia se desculpar por não ter primeiro batido na porta. Quando ele e Nico conversaram de manhã (a pilha de cartas de Jason para pedir-conselho-de-Nico estava surpreendentemente grande hoje), ele parecia triste, sem prestar atenção em Jason e murmurando sempre que Jason parava de falar, e mesmo que Jason saiba que não deveria se intrometer, sempre tinha um motivo para isso. Ele faz um lembrete mental para perguntar a Nico sobre isso mais tarde.

Pelo menos ele parece estar com um humor melhor agora, sorrindo enquanto gira a Tupperware de um lado para o outro. Os episódios do ladrão de sanduíche o deixam tão animado quanto Jason — o que não significa que eles deixam Jason animado. Sério, é só mais um acontecimento na correria que é a sua vida. Um irrelevante, aliás. Decididamente insignificante.

A carta de Jason, que ele colocou perto do seu sanduíche de manhã como de costume, era muito mais simpática que a outra, até na opinião dele. Nico deu uma lida nela antes de eles saírem do refeitório, levantando uma sobrancelha para Jason enquanto lia. Jason tinha corado e mandado ele calar a boca. Nico não tinha dito nada, mas a expressão de malícia em seu rosto tinha sido suficiente.

A carta era algo como:

Caro Ladrão de Sanduíche,

Tá bom, eu não vou mentir, eu me senti um pouquinho culpado por causa de todo o negócio do laxante. Porém, isso não significa que eu vou pegar leve com você, e quando eu descobrir quem você é — e acredite, eu vou você estará ferrado. Ferrado. Os seus comentários fofos e sedutores não vão te salvar.

E, está bem, talvez eu tenha sido um pouco descuidado da última vez, mas eu estou falando sério agora. Pare de roubar o meu sanduíche ou eu terei que tomar medidas radicais.

Além disso, POR FAVOR conserte os seus “e”s, eu não consigo diferenciá-los dos seus “c”s e o qual o problema com o pingo dos seus “i”s e “j”s??? É um pingo, não uma ravina. Sinceramente, COMO você espera seduzir QUALQUER PESSOA (muito menos eu) se você não consegue manter sua letra sob controle? Me faz querer te dar aulas de caligrafia, eu juro por deus.

Sinceramente,

Jason Grace

P.S. minhas cartas são extremamente ameaçadoras, tá bom? Elas não são nem um pouquinho adoráveis, e eu também não sou.

Algumas horas depois, quando Jason voltou ao refeitório, a lancheira tinha sumido. Ele entrou em pânico por um momento, até que ele a viu dentro do micro-ondas. Isso só fez sentido até ele abrir a porta do micro-ondas e ver a Tupperware cheia de comida — mas não de sanduíche.

— Isso não é o máximo? — Will fala. Ele está sentado à mesa de frente para Nico, com o queixo apoiado nas mãos, olhando para a lancheira. Ela está entre os dois, e Jason do lado dela, com os braços cruzados. — É como se ele tivesse virado o jogo.

Não é — Jason insiste. — Não tenta fazer ele parecer esperto.

— Você já leu o bilhete? — Nico pergunta.

— Não.

— Você não leu o bilhete e não provou a lasanha? Seu monstro.

— Pode ter qualquer coisa nela, Nico! — Jason exclama, balançando os braços. — Eu coloquei laxante na comida dele...  na minha... na nossa... na minha comida! Cala a boca — ele dispara, apontando o dedo para o sorrisinho se formando nos lábios de Nico. — Isso pode ter qualquer coisa aí, qualquer coisa!

— Alguém quer saber o que eu acho? — Will pergunta.

— Não.

Eu acho — Will continua — que ele pode estar se sentindo culpado por ter roubado o seu sanduíche por todos esses dias e provavelmente estava preocupado por você ficar sem almoço e se você estava comendo, e esse — ele gesticula para a fatia de lasanha na lancheira de Jason de dar água na boca — é o jeito incrivelmente atencioso dele de te compensar.

— Tem um jeito melhor de me compensar por isso. Ele poderia só não roubar o meu sanduíche.

Nico bufa. — Ah, por favor. Não é nem mais sobre o sanduíche. Podemos provar a lasanha agora? Só um pouquinho?

— Parece tão deliciosa — Will concorda.

— Tá bom, podem provar —Jason suspira, puxando uma cadeira. Nico e Will trocam um sorriso e então avançam na lasanha sem perder mais tempo.

— Meu deus, olha! — Will dá um gritinho. Ele afasta a lasanha do lado vasilha e tira de lá um garfo de plástico enrolado em um guardanapo. — Que rapaz mais gentil e atencioso — ele diz, enxugando uma lágrima imaginária.

— Cala a boca — Jason diz, mas ele já consegue sentir sua resistência desmoronando ao ver isso.

A lasanha parecer ter saído direto de uma revista de culinária também não ajuda. Uma torre de camadas perfeitamente distintas, com queijo e molho escorrendo e com carnes e vegetais visíveis. O macarrão — uma camada marrom-dourada coberta com queijo ralado — está perfeitamente dobrado dos lados, e tem até uma folhinha em cima. Ela preenche o escritório com um aroma apimentado que o faz salivar. Ela está quente também, Jason consegue dizer pela da condensação na tampa da vasilha.

Ele torce para que ela não esteja tão boa quanto parece, mas o gemido de Nico ao prová-la pela primeira vez rapidamente o refuta. — Ela — ele geme, enquanto Will pega o garfo da mão dele e prova também — está muito, muito boa.

Will tem uma reação parecida, deixando o garfo cair de volta na vasilha e cobrindo o rosto com as mãos. — Meu deus — ele suspira —, se eu morrer agora, morrerei feliz.

— Eu quero me casar com essa lasanha — Nico diz. E ele até parece estar com os olhos marejados.

— Onde você esteve a minha vida toda? — Will pergunta da lasanha, adoração pura estampada em seu rosto.

— Ah, pelo amor de deus! — Jason exclama, pegando o garfo. Ele fica irritado com o drama deles durante exatamente meio segundo, até ele também provar a lasanha. Em seguida, ele mal consegue se manter erguido na cadeira.

Nico sorri com a sua reação. — Melhor que sexo — ele afirma.

— Eu não estou nem ofendido com isso — Will diz. — É a verdade.

Os três se inclinam-se sobre a mesa, dividindo o prato e fazendo sons obscenos o tempo todo. Will descreve o sabor como uma explosão, mas Jason acha que é mais como uma dança coreografada perfeitamente na sua boca — uma combinação impressionante de salgado e azedo, que junto do queijo delicioso e do macarrão macio, faz as suas papilas gustativas ficarem de pé e aplaudirem. Tem um gostinho de alguma coisa que Jason nunca experimentou antes, e ele se pergunta se é umami, o que é deliciosamente inesperado.

A lasanha é — ele se atreve a dizer — melhor que o seu sanduíche. O que o traz à questão: por que diabos o seu ladrão de sanduíche está roubando o seu almoço se ele tem a habilidade de preparar pratos dignos de restaurantes?

— Eu não tenho mais dúvidas — Jason sussurra, quase dormindo por causa do quentinho confortante radiando de sua barriga.

— Do que? — Nico pergunta, terminando de comer o resto da lasanha.

— Ela está envenenada. Tem que estar. É boa demais para ser verdade.

— Nenhum de nós está morto ainda, então eu acho que não — Will diz. Ele se inclina para frente, limpa um pouco de molho do canto da boca de Nico e lambe de seu dedo, ignorando os sons de vômito de Jason.

— Você ainda não leu o bilhete, Jason — Nico puxa o bilhete de baixo da lancheira e empurra para ele.

As pontas de seus dedos formigam com entusiasmo. Will e Nico se aproximam para dar suporte a ele enquanto abre o bilhete.

Awww, eu sabia que você se sentia culpado! Mas não se preocupa, tá tudo bem, eu só passei algumas horas no banheiro te xingando (tô brincando, eu jamais te xingaria a não ser que você goste desse tipo de coisa)

A propósito, o que você acha das minhas piscadelas? Elas ficaram melhores, hein?

Para ser sincero, eu não acho que eu tenho sido muito justo com você. Eu não quero ficar roubando a sua comida e te deixando sem nada, então como prometido, essa lasanha linda na sua frente é a minha forma de te compensar! Eu fiz ela com muito amor e carinho. Eu espero que ela te faça não sentir tanta falta do seu sanduíche.

E o seu sanduíche, você me pergunta? Bem, ele estava extra delicioso hoje. Eu comi em tempo recorde. Meio que sinto muito por você ter perdido isso, até. Talvez da próxima vez nós possamos repartir ele.

P.S. Meu deus do céu POR FAVOR me dê aulas de caligrafia isso não é nem um flerte eu só preciso MESMO melhorar minha letra e a sua é tão boa nossa senhora

P.P.S. suas cartas são fofas demais para eu suportar e você é exatamente vinte e sete vezes mais fofo que elas, não discuta comigo nessa

— Meu deus do céu — Nico já está dizendo antes mesmo de eles terminarem de ler. — Isso é muita fofura para o meu coração. Jason, que loucura é essa?

— Vinte e sete — Jason murmura. Ele pode sentir o calor em suas bochechas. — Isso é tão aleatório.

— Qual é a das piscadelas? — Will franze a testa.

O olhar de Jason continua fixo no bilhete. — Piada interna.

Will troca um olhar com Nico. — Você está certo.

— Eu não disse? — Nico assente.

— O que? — Jason fala, levantando o olhar. — O que ele disse?

— Ah, nada. Só que eu não ficaria surpreso se você tivesse um namorado quando isso acabar.

— Eu nem sei como ele se parece! E okay, tudo bem, ele parece legal o suficiente em teoria — Nico e Will trocam mais um olhar —, mas isso não quer dizer que ele na verdade não seja esquisitão.

— Você tem um ponto — Will diz depois de um tempo. — Mas não temos exatamente uma maneira de descobrir quem ele é.

E Jason não tem intenção de ser rude — não tem mesmo — mas por que nós? É assim que é agora? Ele e esses dois bobões procurando por um ladrão de sanduíche? Ele e Will nem são amigos direito, para ser sincero.

Mas ainda assim ele não pode negar que isso é divertido. O seu ambiente de trabalho também é animado — com o drama diário entre a Annabeth e o Leo; as peripécias da Piper e do Frank ignoradas pela Hazel, a diretora de design; Nico e Will agindo como coelhos ninfomaníacos; e mais um monte de gente que traz a vida pessoal para o trabalho e se diverte conversando sobre ela, sem se importar com o que qualquer um dos superiores dizem — mas isso, isso é verdadeiramente a coisa mais divertida que aconteceu com ele desde que chegou aqui.

Ele sorri para o bilhete. Ele está meio que grato ao seu ladrão de sanduíche por fazer ele se sentir assim.

Perdido nos próprios pensamentos, ele quase não escuta as palavras de Nico: — Eu acho que temos como descobrir.

Ele levanta o olhar e vê Nico com a mão no queixo, pensativo. — Essa lasanha estava incrível, a melhor coisa que já provei na minha vida. Mas ela tinha um gosto familiar.

Os olhos de Jason se arregalam. — Você já comeu ela antes?

Nico bate os lábios por um momento, então passa o dedo pela lancheira, pegando os restos, e fica provando eles por um tempo. É uma prova do desespero de Jason para saber e da paciência de Will que nenhum deles fala nada o tempo todo, só observam Nico pensar.

Finalmente, ele fala. — Acho que sim.

Um sorriso surge no rosto de Jason. — Nico, isso é ótimo! Quem fez ela para você?

A expressão pensativa de Nico se transforma em uma quase de vergonha. — Bom, é aí que tá. Eu não sei.

— Como assim?

— Lembra do almoço que a Reyna organizou aqui uns meses atrás? Para todos os funcionários. Você não veio porque você estava visitando a sua irmã na época e é claro, o Will não trabalhava aqui ainda.

— Meu deus — Jason grunhe. — Por favor, não me diz que...

Mas Nico já está assentindo. — Tinha uma lasanha lá. Ela acabou bem rápido, então eu só comi um pedaço da fatia de Hazel, mas definitivamente era a mesma receita.

— E você não lembra quem que trouxe?

Nico dá de ombros. — Foi mal, eu nunca perguntei.

Logo quando Jason estava pronto para vestir preto e ficar de luto pelo resto da semana (ele sempre teve um talento para o drama — é o que Thalia fala), Will fala: — Espera aí. Não tem alguém que fica encarregado de organizar o almoço?

— Sim.

Will ergue as sobrancelhas. — E essa pessoa não teria uma lista inteira com pessoas, e o que cada uma levaria para o almoço?

Nico pisca — uma, duas, três vezes. — É.

Jason quase abraça o Will. — Nico — ele diz, estendendo as mãos —, por favor me diz que você sabe quem organizou o almoço.

— Eu sei — Nico suspira. — Mas você não vai gostar disso.

~*~

Hazel Levesque.

De todas as pessoas para organizarem um almoço. Poderia ter sido a Reyna mesmo. Talvez a Annabeth, o braço-direito da Reyna. Ou até Frank, o editor de cópia.

Mas não. Tinha que ser a Hazel.

Ela está sentada em seu escritório — bem maior do que o do Nico — e recostada em sua cadeira giratória, se movendo para frente e para trás, para frente e para trás, encarando ele com um sorriso brilhante no rosto. Ele acabou de dizer para ela o que ele precisa saber dela e ela vai fazer esse momento durar para sempre.

Quando eles se conheceram, Hazel não confiava nele nem um pouco — ele podia sentir isso nos seus ossos quando ela olhava para ele. Naquela época, ela nem olhava para ele por muito tempo, imagina encarar como ela está fazendo agora. Ela pegava documentos das mãos dele, fechava a porta na cara dele, marchava por ele, e quando ele e Nico viraram amigos, ela ficou absolutamente embasbacada. Talvez ela tenha achado que só porque não gostava dele, seu irmão também não gostaria.

Nico foi o motivo de eles sequer terem virado amigos. Não muito tempo depois de ele e Nico terem começado a passar tempo juntos, Hazel apareceu na mesa dele e disse algo como “você é o melhor amigo do meu irmão, melhor te conhecer logo”.

Agora, as coisas são bem diferentes. Algumas pessoas acham que eles não se dão bem, mas muito pelo contrário. Com o tempo, Jason passou a pensar nela como uma irmã — algo que ele só percebeu quando, umas semanas atrás, alguém falou as palavras “sua irmã” para ele, e imagens tanto de Thalia e quanto de Hazel apareceram em sua mente por um instante. Ele não tem certeza de como Hazel passou a considerar ele, mas ela foi a primeira pessoa a lhe desejar um feliz Ano Novo, deu dois presentes no aniversário dele, e semana passada os dois tiveram uma maratona dos filmes de O Senhor dos Anéis — de O Senhor dos Anéis! — então ele acha que pode ser algo legal.

Eles têm uma amizade peculiar, só isso. Uma em que ela se deleita em intimidá-lo, e ele age como se não se sentisse intimidado por ela, e nem como se na verdade ele se divertisse com como ela diverte-se com isso.

Ele não sabe por que ele tem medo dela, para ser sincero. Ninguém mais parece ter. Bom, exceto o Frank, o Nico e o Will — mas esses são o seu namorado, seu irmão e o namorado do seu irmão respectivamente, então eles meio que tem que ter, não tem?

Céus. São homens. Ela intimida homens. Jason está horrorizado e orgulhoso ao mesmo tempo.

— Eu só vou fazer uma pergunta — ela enfim diz. — Por quê?

A coluna de Jason está reta como uma vara. Ele cruza as pernas e limpa a garganta. Ela faz ele se sentir como se estivesse sendo entrevistado. — É por causa do meu lance com o ladrão de sanduíche. Nico disse que ele contou para você sobre isso.

Isso desperta o interesse dela. Ela se inclina para frente. — O que uma lasanha tem a ver com isso?

Quando Jason termina de explicar, o sorriso de Hazel fica ainda maior. — Isso é tão fofo.

— Fofo? Ele roubou minha comida.

— E te deu mais em troca. Isso é mais do que muita gente faria.

Jason se indigna. — Ele não teria nem que fazer isso se ele deixasse o meu sanduíche em paz.

Ela bufa. — Ah, faça-me o favor, Jason, você sabe que está lisonjeado por causa dessa coisa de admirador secreto.

Admirador secreto. Ela tem conversado com o Nico. Ele vai mutilar aquele cara. — Ele não é um admirador secreto, ele é um ladrão de sanduíche.

— Por que ele não pode ser os dois?

Jason solta um grunhido. — Só me dá o nome!

Hazel ergue as sobrancelhas. Jason se ajeita na cadeira. — Por favor.

— E o que e ganho em troca?

— A ciência de que você ajudou um amigo a capturar e punir um ladrão impiedoso?

— Eu posso ver por que você chamaria os seus beijos de punição.

— Ei!

Ela levanta as mãos — talvez em rendição, talvez para calar a boca dele. Provavelmente os dois. — Só o que eu estou pedindo é algo em troca. Qual é, Jason, você não sabe como negociar mercadorias e/ou serviços?

— Eu poderia, hã, massagear seus pés?

— Argh, não, eu já tenho Frank para isso. Eu estava pensando mais no sentido de... ser o meu espião? — ela sorri brilhantemente para ele.

Jason franze o cenho. — Um espião? Pra que?

— Só pra, sabe, relatar as coisas para mim.

— De que coisas estamos falando, exatamente?

Ela dá de ombros, claramente tentando parecer casual, o que o deixa ainda mais desconfiado. — Só coisas normais. Acontecimentos do dia a dia. Algo como, digamos, coisas do Will e do Nico?

O rosto de Jason assume uma expressão de tá de brincadeira comigo. — Você quer que eu te conte o que está acontecendo na relação do seu irmão. Hazel, isso é mais esquisito do que os bilhetes do meu ladrão de sanduíche.

— Eu só quero saber se ele está bem. É tão ruim assim?

— Ele está ótimo. Você se preocupa demais.

— Você nãos sabe que artigo Reyna quer que ele escreva para a próxima edição, sabe?

— Hã, não. O que é?

Ela balança a cabeça. — É só uma sugestão, e ela fala que pode passar para a Piper, mas ele não quer perder o destaque. Só que ele não está se sentindo à altura.

— Eu não sabia disso — Jason afunda um pouco em sua cadeira, franzindo a testa para o nada. Pode não ser nada, mas o tom de Hazel faz ele pensar que é o que quer que tenha deixado Nico tão preocupado hoje. E aqui está ele focado no seu ladrão de sanduíche.

Hazel vê os pensamentos no rosto dele. — Ei, não se preocupa com isso. Cuidar dele não é só responsabilidade sua, é? Só se certifica de que ele está bem de vez em quando, e me deixe saber. Eu não consigo conversar com ele tanto quanto eu gostaria. — Quando Jason continua fazendo beicinho, ela estende o braço por cima da mesa e, quando outra pessoa seguraria a sua mão ou daria tapa de leve no seu ombro, dá um tapinha em sua bochecha, o que Jason estranhamente prefere. — Se anima — ela diz. — Então você queria um nome, certo?

Jason pisca — Você vai me contar por nada? De graça?

— Eu não iria, mas você parece tão tristinho. — Ela começa a vasculhar as gavetas de sua mesa — Você me pegou em um momento de fraqueza, eu acho. Melhor aproveitar enquanto dura. Aqui está!

Ela puxa um papel amassado e o alisa sobre a mesa. — Tá bom, vejamos, lasanha, lasanha, la...

Ela se interrompe, seus olhos se arregalando comicamente e sua boca se abrindo em um grande O. Ela olha para Jason, incrédula. Jason pega a página e a vira para si.

Ali, na letra nítida dela:

Lasanha — Leo Valdez

~*~

Ele espia Leo, sentado à sua mesa, por trás da divisória por cinco minutos inteiros até reunir coragem o suficiente para ir conversar com ele.

Assim que Leo o vê, Jason sente vontade de dar meia-volta, mas o rosto de Leo se ilumina com um sorriso. — E aí, Jason! — ele grita. — Vem aqui, cara. Quanto tempo, hein.

Ele joga uma pilha de papéis em sua mesa, puxa uma cadeira para Jason e dá uma batidinha nela. Hesitantemente, Jason se senta, tentando não se afastar de Leo quando ele puxa a sua cadeira para mais perto. Ele apoia os cotovelos nos joelhos e mexe as sobrancelhas para cima e para baixo.

— Então — ele diz, alongando o A —, o que foi?

A garganta de Jason está seca. A única coisa passando pela sua cabeça é: o Leo não, o Leo não, meu deus do céu qualquer um menos o Leo e diferentes versões de por que Leo por que?

A pessoa em questão franze um pouco o cenho. — Tá bem, mano?

— Sim, eu tô — Jason limpa a garganta — bem. Eu só tenho uma pergunta para fazer.

— Claro, cara, manda aí.

Você perdeu a cabeça? — Você ainda está namorando aquela garota?

Leo assente. — Sim.

— E vocês não têm tido problemas no relacionamento?

— Hã, não? Quer dizer, um ou outro aqui e ali, mas quem não tem? — Ele sorri. — A gente dá um jeito neles, se é que você me entende.

Jason ri sem jeito, sem ter certeza se entende o que ele quer dizer. Leo está olhando para ele com curiosidade agora, claramente captando a atmosfera tensa. — Você precisava de algo, Jason?

— Não, eu só... bom, sim, eu... — ele suspira, decidindo ir direto ao ponto. — Leo, você sabe que é o melhor amigo, certo? Ou pelo menos, um deles.

— Aham.

— Então você sabe que pode me contar o que quiser? Não importa o que seja, eu vou estar aqui para te apoiar.

A testa de Leo parece estar franzida permanentemente agora. — Eu não sei se eu entendi o que você quer dizer — ele diz devagar.

Jason esfrega o rosto com uma das mãos. Isso é mais difícil do que o esperado. Melhor ele ir direto ao ponto. — Leo, você é hétero, certo?

— Sim?

— Isso é uma pergunta?

— O que quer dizer com isso?

— Leo — Jason diz com seriedade —, se você gosta de um cara, sabe que isso é normal, certo?

— Tá bom.

— E se você já gostou de um cara alguma vez, Leo...

— Tipo uma queda?

— ... é, tanto faz. Você deveria saber que eu estou cem por cento aqui para você, e que eu meio que já sei quem é...

— Sabe?

— ... e Leo, foi mal, fico lisonjeado e tudo mais, mas...

— Eu só estou com medo da Hazel me matar.

O cérebro de Jason dá um curto-circuito. — Hã. O que?

— A Hazel — Leo dá de ombros, parecendo incrivelmente indiferente para alguém que está supostamente conversando com quem ele gosta. — Eu meio que tenho pavor dela. Mas ninguém sabe disso melhor do que você, né?

— Por que a Hazel iria querer te matar?

— Por causa da minha queda pelo Frank?

Os olhos de Jason saltam das órbitas. — Frank Zhang? — ele exclama, saltando da cadeira e assustando a Leo. — Meu deus, Leo! Você não tem vergonha?

O queixo de Leo cai. — Eu achei que você tinha dito que tava tudo bem!

— Frank Zhang? Você faria aquilo com o Frank?

— Ele é bem musculoso, tá?! — Leo grita. — De quem raios você achou que eu estava falando?

— De mim! Você é o meu ladrão de sanduíche?

O rosto de Leo se contorce em nojo. — Eu não sou! Sai de perto de mim, seu doente!

— Você que fez aquela lasanha! — Jason aponta o dedo na cara de Leo acusadoramente. — A lasanha que o ladrão de sanduíche deixou para mim... é a exatamente a mesma receita da lasanha que você fez para aquele almoço uns meses atrás. Não minta para mim, Leo.

— Então é por isso? — Leo tira a mão de Jason de seu rosto com um tapa. — Cara, poderia ter sido qualquer pessoa.

— É  a sua receita.

— E é mesmo, e sabe de uma coisa? Ela é incrível, e é por isso que umas seis pessoas pediram pela receita para mim durante o almoço. Eu disse para todo mundo que uma hora eu colocaria no quadro de avisos no corredor, e eu coloquei. Literalmente qualquer um poderia ter anotado de lá. — Ele dá um chute em Jason. — Agora sai de perto de mim, seu pervertido.

Jason sai, encarando Leo, processando as suas palavras. Os últimos minutos deram a ele uma dor de cabeça. — Não é você — ele enfim diz. — Você não é o meu ladrão de sanduíche.

— Claro que não. Por que diabos você acharia que eu tenho uma queda pelo meu mano? Isso é incesto, cara.

— Você não é o meu ladrão de sanduíche.

— Ah, e a propósito, eu sou muito hétero, não estou nem brincando. Eu sei que é difícil de acreditar nesse lugar, onde praticamente ninguém é hétero, mas eu sou. Dar uma conferida no meu amigão de vez em quando não quer dizer nada. Quem diz que não faz isso está mentindo.

Ele tem razão. —  O Frank é bem musculoso — ele concorda.

— Por que você está sorrindo?

— Eu não estou — ele diz, mas está sorrindo sim, porque o Leo não é o seu ladrão de sanduíche e graças a deus que Leo não é o seu ladrão de sanduíche.

Leo logo entende. Ele ri dele, então se levanta da cadeira e bate em suas costas. — Não se preocupa, cara. Eu não tenho dúvida de que o seu ladrão de sanduíche é um cara bonitinho que frequentemente escreve artigos de destaque e lê, tipo, Tolstoy.

Jason solta uma risadinha. — Esse nem é o meu tipo.

— O tipo “bonitinho” é.

Jason ri e, antes que ele perceba, está abraçando Leo, que parece espantado, mas não de um jeito ruim. Ele bate nas costas de Jason de novo. — Olha só você, cara. Todo esse negócio de admirador secreto está te deixando mole.

Jason se afasta. — Eu não vou mentir, estou muito, muito, muito feliz que não é você. A verdade é que eu estou meio que empenhado nisso agora, e seria bem decepcionante descobrir que é algum amigo que eu não consigo me imaginar namorando, ou pior, uma pegadinha cruel.

— Se for mesmo uma pegadinha cruel, não se preocupa, eu vou deitar o cara na porrada por você.

— Ou chamar o Frank — Jason ri. — Ele é mais musculoso.

~*~

Jason pega a receita da lasanha com o Leo e passa a tarde preparando-a. Ele sabe que é exatamente a mesma receita que o ladrão de sanduíche fez para ele, mas de alguma forma não tem o mesmo sabor.

Chapter 4: O Quarto Bilhete

Chapter Text

Jason está preparando o seu sanduíche para guardar na geladeira quando um lembrete mental apita em sua cabeça, então ele se vira para Nico e pergunta:

— Ei, qual é a desse artigo que a Reyna está te fazendo escrever?

Nico, que estava lendo as notificações no quadro de avisos, se surpreende com a pergunta repentina. — O que?

— Hazel me contou. Ela disse que você estava chateado por causa disso. É sobre o que?

— Eu não estou chateado — Nico diz rapidamente, o que é um sinal óbvio do quão chateado ele está. — O que a sua carta diz hoje?

— Boa mudança de assunto. Uma transição impecável, sério.

— Cala a boca — Nico dispara, pegando a Tupperware dele. Ele vasculha toda a vasilha, e então arqueia uma sobrancelha para Jason. — Não tem nada aqui.

— Não, não tem — Jason diz presunçosamente, colocando o sanduíche na geladeira. — Porque ele não vai roubar o sanduíche hoje.

— E como você sabe disso?

— Porque eu vou ficar bem aqui no refeitório — ele dá uma batidinha na mesa ao lado deles — o dia inteiro para pegar ele.

— Annabeth não vai deixar você fazer isso. Ela vai te reportar para a Reyna.

— Por que ela faria isso? Eu ainda vou estar fazendo o meu trabalho. Eu só vou trazer ele para cá. Onde eu trabalho não deveria ser importante, contanto que eu trabalhe.

— Seguindo essa lógica, eu deveria poder levar meu computador para o parapeito da janela do último andar e escrever matérias lá, enquanto as minhas pernas balançam sobre a cidade.

— É, vai lá e faz isso — Jason sorri com aprovação. — Melhor para você. Falando em artigos — ele puxa uma cadeira e se senta à mesa, gesticulando para Nico fazer o mesmo —, me conta sobre esse artigo.

Nico nem se dá o trabalho de recusar. Ele só pega o seu celular e volta sua atenção para ele, ignorando-o. Jason sabe por experiência própria que Nico consegue continuar ignorando ele por muito tempo (seu recorde é de uma semana e meia, até que o Will arrastou um Nico mal-humorado até o apartamento de um Jason mal-humorado e fez eles se desculparem e serem amigos de novo).

Jason toma o celular dele e guarda no bolso, e num piscar de olhos, Nico está de pé e indo em direção à porta. Jason quase derruba ele no chão.

— O que — ele exige, fazendo Nico se sentar — tem de tão ruim sobre esse artigo?

Nico cruza os braços sobre a mesa e enterra sua cabeça neles. — Eu não quero falar sobre isso.

— Eu só quero ajudar.

Nico silenciosamente levanta os braços e cruza eles sobre sua cabeça. Suspirando alto, Jason desaba em sua cadeira.

— Eu te falei, eu vou ficar aqui o dia todo. E eu também não vou te deixar ir embora, então você deveria conversar comigo.

Nico nem se mexe. Jason estava planejando pegar seu material de trabalho da sua mesa assim que tivesse colocado a isca para o ladrão na geladeira, mas pelo jeito isso não vai acontecer tão cedo. Ele se recosta em sua cadeira e observa as pessoas.

Depois de um tempo, Nico olha para ele pela fresta entre seus braços. A sua voz está abafada quando ele fala. — É ridículo. Você vai rir de mim.

— Não, eu não vou — Jason ri, porque, sinceramente, essa é uma ideia tão absurda. — Se eu não ri quando você me contou sobre o seu medo de Furbies, eu não vou rir agora.

— Aquilo não era engraçado. Todo mundo tem medo de Furbies. Você que é esquisito por não ter medo deles. — Quando Jason só o encara, ele afunda em sua cadeira. — É sobre a transição entre ser uma criança e ser um adulto, toda essa coisa de como se espera que adolescentes sejam crianças num dia, e adultos responsáveis no outro. Reyna sabe que muitos dos nossos leitores são dessa faixa etária, tipo de dezessete até vinte e dois anos, por aí, então ela queria abordar esse assunto. — Ele franze o cenho. — Eu não sei por que ela pensou em mim.

— Você é o escritor mais novo aqui. Talvez ela tenha achado que você se identificaria.

Ele balança a cabeça. — É uma boa ideia, mas eu não sou a pessoa certa para isso. Eu não tive exatamente a infância mais normal. Eu tive que crescer aos dez anos, não aos dezoito. Sempre que eu tento escrever sobre isso, me lembro de tempos muito ruins, e eu já passei por coisas suficientes para saber que isso não é bom para mim. — Ele esfrega os olhos, cansado. — Eu não quero decepcionar Reyna.

Jason não tem certeza do que dizer. Ele sabe pouca coisa sobre a infância de Nico, mas as coisas que ele sabe fazem ele querer enrolar Nico em um cobertor verde e felpudo e abraçá-lo enquanto os dois assistem Como Treinar Seu Dragão de novo, de novo e de novo.

Mas por mais simpático que esteja com a situação de Nico, ele não consegue não pensar sobre como ele faria um ótimo trabalho com essa matéria. Ele nem sabe dos detalhes desse artigo, mas Jason gosta de pensar que durante a adolescência ele era uma pessoa bem resolvida, e que ele também assumiu as suas responsabilidades e deveres como um adulto sem dificuldades. Ele não iria tão longe a ponto de dizer que era popular no ensino médio, mas todo mundo até que gostava dele — e a faculdade foi ótima para ele, deixando de lado toda a ansiedade que ele teve por causa dos estudos.

Quanto mais ele pensa sobre isso, mais ele se convence. Ele se sairia muito bem escrevendo esse artigo — se ele não fosse um conselheiro sentimental. Logo, a melhor solução seria passar a matéria para alguém que pudesse se sair tão bem quanto ele.

— Eu acho que você deveria passar para a Piper — ele diz para Nico. — Não tem por que ficar se torturando por causa disso, e para mim parece que a Piper seria ótima nisso.

— Ela vai ser. Eu pensei sobre isso antes. Talvez eu deva só entregar para ela — Nico suspira. Ele encara o nada por um tempo, pensando, e então se levanta. — Enfim, eu vou deixar você voltar para o seu negócio de admirador secreto. Eu posso trazer as suas coisas da sua mesa se você quiser.

— Você não vai ficar aqui comigo? — Jason diz, surpreso.

Nico bufa. — Não. Até parece que a Annabeth vai te deixar ficar aqui o dia todo, e eu não quero enfrentar a ira dela.

— Ela não ficar zangada assim, vai? — Jason diz, mordendo o lábio.

Nico dá um sorrisinho. — Eu acho que você vai descobrir, não vai?

~*~

Jason implora a todo mundo que ele encontra para que não o dedurem para a Annabeth, e assim ele consegue passar duas horas e meia no canto do refeitório, trabalhando e ficando de olho no seu ladrão, antes de ela descobrir ele.

Durante essas duas horas, Jason termina de ler as cartas que ele recebeu e escreve respostas até aceitáveis para a maioria. Apenas três ou quatro delas são sequer publicadas por edição, mas Jason tenta encaixar o máximo que consegue no pequeno espaço reservado para ele na revista, deixando suas respostas curtas, porém simpáticas.

Ele já leu metade das cartas quando sua mente divaga e ele começa a pensar de novo sobre o artigo de Nico. O assunto da matéria era bem vago, e ele sabe que é preciso muito mais informação do que aquilo para começar a escrever um artigo — sem falar que os escritores em destaque sempre fazem um rascunho ou um esboço primeiro e enviam para Annabeth, e é só quando ela dá o sinal verde que eles podem iniciar de verdade o processo de escrita.

Tem muito mais por trás de elaboração de texto do que Jason sabe, mas ele quer descobrir tudo sobre isso. Principalmente para que ele possa usar esse conhecimento para ver o quão bom ele é de verdade — até onde ele sabe, ele pode ser um péssimo escritor.

E não seria um ótimo treinamento ele mesmo escrever o artigo de Nico? Só por diversão, é claro. Afinal, Nico trouxe o seu notebook. Sendo sincero, Jason começou a escrever essa matéria em sua cabeça quando escutou sobre ela, então qual é o problema?

Talvez seja por saber que ninguém vai ler, e por ser só por diversão, que ele coloca tudo que está pensando no texto, sem nem se importar com o limite de palavras, parando por um ou dois segundos só quando uma palavra específica foge de sua mente. Ele está pensando no último parágrafo quando uma mão bate com força em sua mesa, fazendo ele dar um salto e fechar a tampa do seu notebook por instinto (ele já foi flagrado vezes demais pesquisando coisas muito embaraçosas na internet).

E ali está o seu pesadelo, de pé na frente dele, fuzilando-o com olhos cinzas ferozes. — O que você está fazendo aqui? — ela dispara.

Jason cerra o maxilar, recusando-se a demonstrar fraqueza. — Trabalhando.

— Você tem uma mesa, Jason.

— Eu sei. Mas eu decidi trabalhar aqui.

Annabeth se inclina na direção dele. — Você não pode fazer isso — ela diz lentamente, enfatizando cada palavra.

Um gritinho se forma em sua garganta, mas Jason o engole. — Não tem nenhuma regra que diz isso — ele argumenta. — Eu posso me sentar no refeitório se eu quiser, e você não pode me impedir.

— Não posso? — ela arqueia uma sobrancelha e Jason imediatamente se arrepende de suas palavras. Ela não tem autorização para bater nele, certo?

Eles se encaram pelo que parece ser uma hora, enquanto Jason grita internamente para ele mesmo não desistir. Finalmente, logo quando os seus olhos começam a lacrimejar, Annabeth se afasta e marcha para fora do refeitório, lançando um olhar para ele por cima do ombro que o faz pensar que ainda não se safou.

Mas ele não consegue nem suspirar em alívio. A porta nunca se fecha atrás de Annabeth porque uma nova horda de pessoas entra, tagarelando uma com as outras, rindo e se empurrando, se amontoando ao redor da geladeira e do micro-ondas para pegarem suas comidas e depois juntando-se nas mesas. Jason olha para o relógio.

É hora do almoço.

Sem perder nem mais um segundo, ele salta da sua cadeira e se posiciona perto da geladeira, onde ele poderá ver qualquer um que tocar no seu almoço. Algumas pessoas o olham estranho — ele tenta parecer casual, mas ao invés disso ele acaba coçando o queixo enquanto olha para um canto do teto.

Ele fica de olho no seu sanduíche, mas ninguém toca nele. Ninguém nem parece reparar nele.

Desconfiado, ele volta o olhar para as pessoas ao seu redor, pausando nas que fazem seus alarmes dispararem.

Tem um cara com cabelo enrolado escuro que parece meio bêbado, mas fora isso não tem nada de interessante, e ele sequer olha na direção de Jason. Outro cara, com cabelo castanho claro e uma boina, anda engraçado quando passa por Jason, quase como se estivesse indo mais devagar perto dele, mas então Jason se dá conta de que é só o jeito que ele anda. Outro tem cicatrizes no rosto e o braço engessado, e um outro está tomando uma bebida perturbadoramente azul, e tem um homem impressionantemente musculoso com uma tatuagem interessante de arco-íris no bíceps. Jason conhece alguns deles, e eles até o pegam encarando algumas vezes, o que acaba com ele acenando sem jeito e dizendo oi de longe.

Seu sanduíche está intocado. Nenhum deles é o seu ladrão.

Ele desistiu? O pensamento deixa um gosto amargo na boca de Jason. Ele não faria isso, não depois de flertar daquele jeito. Faria?

Ele não deveria estar grato porque ele tem o seu sanduíche todo para ele? Ele abre a porta da geladeira e o encara por alguns segundos. Ele foi muito cuidadoso enquanto o preparava essa manhã — como tem sido nos últimos dias. Tudo foi corretamente medido e esquentado antes de ser adicionado, todas as camadas distribuídas igualmente, com a mostarda cuidadosamente colocada para que não derramasse, e então o sanduíche foi prensado até ficar com uma altura comestível.

Ele nunca tomou esse tanto de cuidado para fazer para ele mesmo. Ele fez esse sanduíche para o ladrão idiota. E o cara nem sequer apareceu.

Ele fecha a porta e cruza os braços, desviando o olhar de todos ao redor dele. Ele pode sentir suas sobrancelhas franzindo e seus lábios fazendo um bico por aborrecimento. Ele não consegue manter sua decepção e mágoa escondidas por muito tempo.

Com a mandíbula cerrada, ele se senta à sua mesa e volta ao trabalho.

~*~

O refeitório está quase vazio quando Annabeth o encontra de novo.

Ela está acompanhada da Reyna, o que ele deveria ter imaginado. Nico anda ao lado delas, tentando muito justificar as ações de Jason. Jason quer fazer um carinho na cabeça dele pela sua lealdade, mas nesse momento ele se sente muito para baixo até para se mexer.

Meu deus, ele é tão dramático. Talvez seja por isso que ninguém quer ele.

Reyna para do lado da mesa dele. — Jason — ela diz com as mãos na cintura.

Ele solta um longo suspiro. — Eu sei, eu sei. Nada de trabalhar no refeitório.

—  Você tem uma mesa por um motivo. Se você não quer usá-la, fique à vontade para me avisar para que eu possa usar o espaço para alguma outra coisa.

Ela vai transformar o seu local de trabalho em um depósito. Ele se levanta da cadeira e começa a recolher suas coisas. — Eu já estava indo embora mesmo.

— Isso é por causa de todo aquele negócio do ladrão de sanduíche? — Annabeth exige. — Porque se ele está atrapalhando em sua produtividade, Jason...

— Não, ele não está — Jason a interrompe. — Está tudo bem agora.

Nico franze o cenho. — Você está bem?

— Aham. Me ajude com essas coisas?

Ele não perde os olhares que os outros três trocam antes de Annabeth e Nico prosseguirem para ajudá-lo. Jason aninha o seu notebook ao peito, pensando se ele deveria mencionar a Nico que escreveu um artigo inteiro que provavelmente nunca vai ver a luz do dia.

Ele ainda está com as costas viradas para seus amigos quando Reyna fala, soando estranhamente embasbacada: — Hã... Jason?

— O que? — ele diz cansadamente.

— Hã...

— Entrega para Jason Grace?

Jason congela. Silêncio completo envolve todo o refeitório, e uma bela e refrescante fragrância se espalha ao redor dele.

Devagar, ele se vira – e é recebido com um monte de flores no rosto.

O buquê é enorme, facilmente metade da sua altura, tão grande que a Hazel seria esmagada debaixo dele e sairia como panqueca de Hazel. É um festival de cores e fragrâncias, flores de todas as cores do arco-íris exibidas lado-a-lado tão magnificamente que você se perguntaria por que elas não crescem naturalmente desse jeito. E tem tantas – rosas, amarílis, orquídeas, tulipas, lírios... Jason nem conhece a maioria delas.

Todo mundo no refeitório está olhando de boca aberta para o buquê. Ao lado de Jason, um Nico com olhos arregalados sussurra “É tão feio”, e Reyna dá uma cotovelada tão forte nele que ele se curva.

Um rosto surge atrás do buquê, uma entregadora sem entusiasmo olhando para ele com expectativa. — Você é Jason Grace? — ela pergunta, estourando seu chiclete.

Ele demora um instante para encontrar sua voz. — Sim.

— Isso é seu — ela diz, e então prossegue para despejar o buquê em seus braços. Reyna e Annabeth se apressam para ajudá-lo (Nico ainda está incapacitado) e quando ele desenterra sua cabeça das flores, cuspindo pétalas, uma prancheta é enfiada de baixo do seu nariz. — Assine aqui — a entregadora demanda.

Jason segura o buquê com um uma mão enquanto assina com a outra, grato por todas aquelas horas gastas na academia. A garota vira para ir embora, mas Jason a chama — Espera! Quem te deu isso?

Ela estoura seu chiclete de novo. — É anônimo. Não posso te contar. Regras da empresa. Mas você provavelmente pode descobrir pelo cartão.

— Cartão? — Ela aponta para o buquê. Jason vira a cabeça e ali, entre dois cravos, tem um simples cartão branco.

Na parte de cima do cartão, escrito em lilás: Achou que eu tinha esquecido, não achou? E então aquela maldita piscadela.

Jason mal consegue manter suas risadas dentro dele. Seus lábios já estão se abrindo em um sorriso permanente. Nico pega o cartão e abre para que ambos possam ler:

Na verdade, eu não esqueci NEM UM POUCO. Eu cheguei no refeitório NA HORA e Jason Grace está parado do ladinho da geladeira esperando por mim. Isso foi bem inteligente da sua parte, aliás, mas não inteligente o bastante. Você não vai me pegar tão facilmente.

E sim, antes que você pergunte, eu vi sim você fazendo um beicinho fofo por eu não ter aparecido. Eu não tinha ideia de que você gostava tanto de pessoas roubando seu almoço. Por falar nisso, POR FAVOR tenha cuidado enquanto faz expressões adoráveis, você quase me deu um ataque do coração.

Mas eu me senti culpado. Então aqui está o meu pedido de desculpas, por flores. Eu não sei a sua favorita, então fique com todas elas. Eu fiz almoço para você hoje também, mas a entregadora disse que não conseguiria carregar isso E o buquê. O que é uma pena também. Você perdeu uma pizza caseira muito boa. Ah, bem, nós comeremos nossos próprios almoços para variar.

P.S. Me desculpe se você é alérgico a qualquer uma dessas flores e está espirrando muito agora. Você provavelmente fica muito fofo espirrando então tem isso também

Antes que Jason possa se segurar, ele ri. Ri de verdade. Reyna e Annabeth o encaram com olhares surpresos idênticos, mas Nico parece que já esperava isso há algum tempo.

A entregadora ainda está parada lá. — Isso é tudo? Eu tenho mais entregas para fazer.

Jason sorri para ela, guardando o cartão no bolso. — Que tal mais uma?

~*~

Enquanto a entregadora espera, Jason rapidamente escreve de volta um bilhete:

Querido Ladrão de Sanduíche,

Tá bom, eu admito. Você foi mais esperto do que eu. E você é incrivelmente gentil. Isso são dois pontos para você.

O buquê foi muito caro? Pareceu ter sido. Se você quiser, pode me mandar a conta? (E sim, eu sei que você não vai mandar de verdade, mas é educado oferecer)

Meu deus do céu, eu perdi PIZZA? E tudo porque e tentei te pegar. Nunca mais vou tentar de novo. Fique à vontade para me mandar quanta comida você quiser. Eu só vou sentar aqui e aproveitar.

Mas sério. Você ainda me irrita, mas não tanto quanto antes e eu sinceramente posso dizer que se você me contar quem você é, podemos virar amigos. Sem brincadeira, eu gostaria muito, MUITO de te conhecer. MUITO MUITO. Então é com você.

Sinceramente, Jason Grace

P.S. Não se preocupe, eu não sou alérgico a nenhuma delas. Mas sim, eu fico fofo pra caramba mesmo quando espirro, se é que posso dizer.

Ele esquenta o sanduíche, coloca sua carta com cuidado dentro da vasilha, paga extra à entregadora e manda ela embora, se recostando em sua cadeira.

Nico ergue uma sobrancelha para ele.

— Você não vai seguir ela para ver para onde ela vai? Eu achei que era por isso que você estava fazendo isso.

É uma boa ideia, mas Jason não quer mais procurar por ele. Ele quer que o ladrão de sanduíche venha até ele — ou pelo menos que ele lhe dê uma dica óbvia de quem ele é, se ele tiver vergonha.

— Não — ele diz para Nico, tocando as pétalas do buquê, fascinado pela sua beleza. — Eu acho que vou esperar por ele em vez disso.

Chapter 5: O Quinto Bilhete

Chapter Text

Jason compra um vaso gigantesco naquela noite e coloca as flores na água antes de ele ir embora. Quando chega o fim da semana alguma delas já estão murchando, então ele escolhe as que mais gosta e prensa elas entre páginas dos seus livros favoritos. Ele sabe que não pode preservá-las para sempre, mas ele pode ter esperança.

Ele não recebe nenhum bilhete de admirador secreto durante todo o fim de semana, é claro, mas ainda assim ele verifica o seu correio por um todo dia. Ele está meio que aliviado por não ter recebido nenhum bem na porta de casa. Mesmo com a sua mente delirando de alegria, ele pode afirmar que isso seria um pouquinho bizarro.

Mas ele passa o fim de semana todo com a cabeça nas nuvens, ainda mais quando avista as flores ou os bilhetes (os quais ele grudou na porta da sua própria geladeira).  Quando a segunda-feira chega, ele está preparado para lidar com qualquer coisa – começando por aquele artigo.

Ele ajeitou um pouco o texto em casa, editou aqui e ali. Ele o imprime e entra a passos confiantes com a cópia no escritório de Nico, ansioso para mostrar a ele e obter um feedback.

O que ele obtém, no entanto, é uma visão completamente indesejada do Nico e do Will seminus, grudados um no outro como ímãs.

— Essa — Nico dispara enquanto se veste, — é a segunda vez em duas semanas, Jason!

— Eu não entraria se você trancasse a porta!

— Eu tentei — Will resmunga, — mas alguém gosta do fator de risco que isso adiciona e não me deixa.

Não é necessário dizer que Nico expulsou Will do escritório não muito tempo depois daquele comentário. Enquanto Jason expurgava o odor de sexo com um aromatizador (o tempo todo segurando sua camiseta tampando o nariz como se ele estivesse em um lixão), Nico desaba em sua cadeira e olha para os papéis nas mãos de Jason. — O que é isso?

— Não, eu não vou te deixar tocar nisso até que você lave as mãos.

— Meu deus do céu.

— Estou falando sério. Eu vi onde as suas mãos estavam, Nico Di Angelo, e não foi bonito. — Ele se senta na frente do Nico. — Eu posso esperar.

Olhando feio para ele o tempo todo, Nico pega um desinfetante de mãos e as limpa, e então as estende para Jason inspecionar. Jason passa muito tempo cutucando com um lápis as suas mãos enquanto Nico grunhe em frustração, antes de assentir em aprovação e estender o seu texto.

Nico apanha os papéis. — Você está muito alegrinho esses dias. Me faz querer arrancar sua pele e esfregar sal em você.

Jason só sorri para ele enquanto ele folheia os papéis, repentinamente nervoso. Ele observa conforme a expressão de Nico muda de irritação, para confusão, para surpresa. Enfim, ele olha para Jason e diz: — Esse é o meu artigo. Mas você... escreveu ele?

Jason concorda com a cabeça. — Foi só por diversão. Você disse que não tinha ideia de como escrever ele, mas eu não achei que seria muito difícil para mim então eu só... — ele gesticula para a folha — escrevi. É verdade que ainda não é um rascunho final, mas...

— Você quer que seja publicado?

A certeza com que Nico fala, como se tudo o que Jason precisa dizer é sim e ele vai estar na próxima edição, surpreende Jason. — Hum. Bem. Eu não estava pensando nisso. — Nico parece confuso de novo. — Eu não sou um escritor, Nico. E está bem inacabado. Seja como for, ele não pode ser publicado.

— Mas você não está me mostrando isso para que eu possa repassar para a Annabeth?

Jason pisca. — Você pode?

— Aham. Ela e a Reyna vão decidir se é bom o bastante para ser publicado, mas — ele passa o olho pelo texto — eu não acho que vai dar muito trabalho para arrumar./precisar arrumar muita coisa.

A mente de Jason ainda está processando isso. Ele nunca esperou que o texto fosse ser publicado. É o seu próprio vômito de palavras. Ele pensou que ajudaria Nico a escrever o artigo em si — no máximo, talvez motivaria Jason a escrever um pouco. Ele nem é um escritor.

— Nico, mesmo assim, esse... esse é o seu artigo. Eu não posso simplesmente roubar o seu artigo.

— Você não está roubando nada, Jason. Para ser sincero, eu ia repassar ele para Piper mesmo. — Seu olhar suaviza. — Não importa o quão bom escritor eu me torne, eu nunca vou conseguir escrever sobre certas coisas do jeito que quero. Mas parece que você consegue, então por que você não deveria ter essa oportunidade?

Jason o encara. Os olhos de Nico são sinceros e ele acena encorajadoramente com a cabeça para ele. Jason solta um longo suspiro. — Você... você acha mesmo que eu poderia ser um escritor?

Nico sorri largo. — Eu acho. Se você quiser.

— Se eu quiser? — Jason ri, seu coração expandindo a cada respiração até ele sentir que pode explodir.

— Fantástico — Nico sorri. — Mas não vamos nos apressar, tá bom? Precisamos fazer um bom caso para a Annabeth e a Reyna deixarem você prosseguir, e só conseguiremos fazer isso se o seu artigo for tão perfeito que a Reyna vai se perguntar por que você ainda não é um escritor.

Jason está praticamente pulando em sua cadeira. — Como a gente faz isso?

Nico sorri, pega uma caneta vermelha e tira a tampa. — Hora da edição.

~*~

Se Jason aprendeu alguma coisa cercado por escritores nos últimos anos, é que cada um e todos eles possuem uma combinação extraordinária de arrogância e insuficiência que ele não encontrou em outras pessoas. Todos eles realmente pensam que seus textos são inferiores aos dos seus colegas, mas ao mesmo tempo acreditam que tudo o que escrevem merece ser aclamado como revolucionário. Eles admiram e criticam o trabalho de outras pessoas tanto quanto os próprios, e tudo ao mesmo tempo. Nico fala para Jason que cada parte disso é necessária se você quer melhorar sua escrita, mas ele pode dizer que Nico não faz ideia do que está falando.

Mesmo assim, apesar de escrever só uma coluna de conselhos por grande parte de sua carreira (e histórias não publicadas aqui e ali), Jason parece ter sido vítima desse mesmo pensamento. Ele sabia que estava duvidando de si mesmo até antes de ter começado a escrever, mas não é até Nico começar a cobrir seu texto com marcas vermelhas que ele percebe o quão absolutamente certo ele estava de que o seu artigo era o melhor dos melhores.

E o Nico é tão casual com isso tudo, omitindo ou substituindo palavras, reorganizando parágrafos inteiros, eliminando frases completas. Ele apoia a cabeça na sua mão enquanto ele destrói (melhora?) o artigo, e já passou tempo demais até ele perceber que Jason está o encarando boquiaberto.

— Ah, não se preocupa — ele dispensa o choque de Jason, — não é que está ruim. Você só é novo nisso, então obviamente tem coisa para arrumar. É na verdade impressionante para a sua primeira vez escrevendo.

— Impressionante — Jason repete enquanto Nico rabisca uma frase dele mesmo no final de um parágrafo.

— Aham. Toda revista tem um estilo de escrita, sabe, e todos os escritores têm de seguir isso para que não fique uma bagunça para o leitor. E isso é difícil, porque todo mundo tem um estilo diferente de escrita. São como digitais. Podem ser muito parecidas, mas uma nunca é exatamente igual à outra.

— Ah.

— É isso que deixa o nosso trabalho tão difícil. Temos que escrever de acordo com o método geral, mas também temos que adicionar algo nosso, para que os leitores eventualmente comecem a reconhecer — e amar — a sua marca. Para que eles possam escolher favoritos, basicamente. E o favorito tem que ser você. — Ele sorri para Jason. — Entende o que quero dizer?

— Isso é bem mais difícil do que eu achei que seria.

— Você vai pegar o jeito, como todo mundo. — Ele ri. — Você parece tão preocupado.

— Você tá pintando tudo de vermelho, é claro que eu estou. — Ele afunda na sua cadeira. — Eu comeria meu lanche em consolação, mas já comi.

Nico pausa, a caneta pairando sobre o papel. — Ainda não é hora do almoço.

— Eu estava com fome.

Nico abaixa a caneta e levanta uma sobrancelha para ele. Jason revira os olhos. — Tá legal! — ele se rende. — Eu queria saber dele.

É só o que basta. Nico esquece do artigo em tempo recorde, voltando sua atenção completamente para Jason, com um sorriso enorme no rosto, esperando pelo bilhete.

Jason suspira. — Não tinha nenhum bilhete.

O sorriso cai do rosto de Nico como se ele tivesse acabado de dizer a ele que morreria hoje. — Nenhum bilhete? Você escreveu um?

— Não, é a vez dele agora.

— Mas ele não mandou um? Ele nunca fez isso antes.

Jason dá de ombros. — Eu sei lá, mas não estou preocupado.

— Você... não está?

— Nem um pouco. Eu teria duvidado de tudo isso uns dias atrás, mas não mais. Eu acho que ele tem uma carta na manga e eu estou disposto a esperar até ele revelar o que é.

Nico o estuda com olhos estreitos. — Você está bem certo de si.

Jason sorri com moleza. — Devem ter sido as fajitas incríveis que ele fez para mim.

Nico arregala os olhos. — Nem a pau.

— Eu estou te dizendo, Nico, eu achei que tivesse morrido e ido para o paraíso quando provei.

Nem vem. Você não guardou nada para mim!

— Eu teria guardado, mas você tinha algo totalmente diferente na sua boca na hora.

Nico taca sua caneta em Jason, que só ri da cara dele. — Eu espero que ele não te responda, — Nico resmunga. — Não, eu espero que ele responda, e que vocês dois se encontrem e gostem um do outro, amem um ao outro e namorem por muito tempo e fiquem noivos e os dois estejam incrivelmente felizes e vão se casar e então ele te abandona no altar.

Jason o encara. — Você é um coelhinho do mal, Nico.

— Não — Nico aponta para ele — me chame de coelhinho.

~*~

— É estranho — Annabeth diz, perplexa. — é realmente bom.

Jason bufa. – Bom, obrigado.

Ela está segurando uma cópia nova e editada (por Nico) do seu artigo nas mãos, que Nico repassou para ela, e que ela agora veio para a mesa de Jason para discutir sobre. Ela fica olhando de relance para ele enquanto lê, como se para ter certeza de que é mesmo ele. Ele estaria ofendido se ela não estivesse exagerando de propósito (ou pelo menos ele acha que ela está).

— O Nico te ajudou com isso?

— É, ele ajudou. Na verdade, era o artigo dele antes, mas...

— Eu sei. Isso não atrapalhou na produção da sua coluna, atrapalhou?

— Nem um pouquinho — Jason sacode a cabeça fervorosamente. A edição do mês está quase pronta, para ser publicada amanhã, então é claro que ele já escreveu a sua coluna.

Annabeth acena com a cabeça. — Eu fiquei feliz que esse artigo vai entrar na próxima edição, porque estava preocupada que o Nico não conseguiria entregar dentro do prazo. Mas eu suponho que ele não vai mais precisar se preocupar com isso.

Jason sente seu coração se encher de felicidade. — Então é bom o suficiente para ser publicado?

— Sinceramente? Eu acho que sim. Mas — ela rapidamente levanta uma mão — não comemore ainda. Reyna precisará aprovar no final, e eu vou mandar isso para Frank dar uma olhada primeiro, claro.

— Mas é bom o bastante?

— Eu acabei de dizer que sim, não disse?

Jason não consegue se segurar. Ele avança e abraça ela. Ele se afasta rapidamente caso ela dê uma joelhada nele, mas ela não parece insultada. Na verdade, seus lábios estão se repuxando nos cantos. — Você tem estado feliz demais esses dias — ela observa.

— Isso é uma coisa ruim?

— Nem um pouco — ela responde na hora. — É legal ver alguém ficar empolgado assim com escrita. Só não tenha muitas expectativas, tá bom? Reyna pode não aprovar.

Jason sabe disso, mas ele sinceramente acha que nem se importaria. Ele esteve aqui tempo o suficiente para saber quantos rascunhos novos escritores têm que submeter aos editores até que eles cheguem em um que pode ser publicado. Se isso acontecer com ele de primeira, ele vai ser astronomicamente sortudo.

Se não acontecer, ele vai só tentar de novo.

~*~

É só depois da hora do almoço que Jason abre a caixa de e-mails da sua coluna. Ele passa a maior parte do seu tempo vagando perto do escritório do Frank. Annabeth disse que mandaria o seu artigo para o Frank e quando Jason tivesse tempo livre, ele deveria passar por lá para que Frank pudesse editá-lo na frente dele. Jason juntava coragem para bater na porta, mas ela desmoronava assim que ele levantava sua mão para bater.

Deixa para lá, ele pensa, eu tenho trabalho para fazer.

Ele apoia os pés na mesa, estende o braço para a primeira carta e começa a rasgar o envelope antes de notar que não tem nenhum. Só papel.

Papel de caderno dobrado.

Com as sobrancelhas erguidas, Jason se endireita rapidamente e inspeciona os seus arredores, como se o seu ladrão de sanduíche fosse estar lá com um crachá grudado ao peito. Se recostando na cadeira, Jason abre lentamente o bilhete, sem nem sequer tentando controlar o seu sorriso bobo.

Querida Tia Grace,

Isso vem me aborrecendo faz tempo, eu ficarei surpreso de verdade se você conseguir pensar em uma solução. Veja bem, tem esse cara no trabalho que eu gosto muito, mas ele não faz ideia, o que é ridículo porque seríamos realmente incríveis juntos. Nós nem trabalhamos no mesmo setor (então eu sou diariamente privado da fofura dele o que sinceramente é um crime). Eu não sei como ir chamar ele para sair mas roubar o almoço dele todo dia e deixar cartas no lugar provavelmente não é uma boa, certo?

Os sanduíches dele são ótimos, mas sério, eu só quero segurar a mão dele. O que eu faço?

Seu, O Admirador Secreto

Jason nem revira os olhos para a assinatura. É claro que ele está se descrevendo como um admirador secreto.

Ele passa o dedo sobre o eu só quero segurar a mão dele e, pela primeira vez naquele dia, sente uma pontada de tristeza. As cartas só o deixaram felizes até então, mas agora ele não pode deixar de pensar: Bom, por que você só não pede para segurar?

A probabilidade do seu ladrão de sanduíche ser revelado a ele sempre foi uma certeza, mas agora que ele parou de procurá-lo, ele se pergunta se ele vai mesmo. E se eles continuarem trocando cartas e nada mais? E se ele nunca o conhecer?

A possibilidade o deixa mais chateado do que deveria.

O som frenético de passos correndo em sua direção desvia sua atenção. Nico praticamente esbarra em sua cadeira, com os olhos arregalados e horrorizados.

— Nico? — Jason o segura pelos ombros — Você está bem?

— Frank... — Nico murmura.

— O que aconteceu? Devo ligar para a emergência?

Ele já está para pegar o seu telefone quando Nico dá um tapa na mão dele. Jason segura seus dedos e recua, se perguntando se ele pirou de vez.

— Frank... — Nico diz lentamente, — Frank bateu o ponto hoje.

— E?

Nico agarra os braços de Jason. — Ele usou uma caneta lilás.

~*~

É enquanto ele espreita pela porta do escritório do Frank de um canto, se sentindo tão ridículo quanto quando ele foi falar com o Leo, que ele percebe o quão idiota ele está sendo. — Não pode ser o Frank. Como poderia ser o Frank?

Nico dá um tapa tão forte nele que ele dá um pulo. — É claro que não é ele. — Seus olhos estão arregalados e nervosos. — Ele está namorando a Hazel. Ele ama ela. Por que ele escolheria você?

— Eu sempre amo os seus discursos motivacionais. Tão motivantes.

— É sério. Ele não gosta de homens, eu acho que ele nem gosta de garotas sem ser a Hazel. — Ele começa a sacudir a cabeça. — Não, não, nós não vamos destruir o relacionamento da minha irmã. Nem pensar.

— Nico, se acalma — Jason põe uma mão na cabeça de Nico. Ele a encara por um momento, se perguntado aonde ele vai com isso, então só continua e começa a fazer carinho na cabeça do seu melhor amigo. — Ele nunca assinou com aquela caneta antes, assinou?

— Não. Não, não, não–

— Então ele acabou de comprar ela, — Jason explica, fazendo mais carinho. Nico parece mesmo relaxar conforme Jason continua, o que reforça a teoria de Piper de que Nico é metade gato. — A gente só vai descobrir se perguntar dele. Eu tenho que ir encontrar com ele mesmo, então eu vou...

— Você não vai destruir o relacionamento da minha irmã.

— É o Frank, Nico. É claro que eu não vou. Agora vai pegar a sua bolinha anti-stress, você está me deixando tenso.

~*~

Jason não tem vergonha de dizer que trouxe com ele a carta mais recente do ladrão de sanduíche. Por apoio ou por prova — ele não sabe, mas ele está feliz por ter trazido.

Não tem canetas lilás em nenhuma das lapiseiras do Frank, a não ser que elas só não se pareçam lilás. Frank sorri calorosamente para ele enquanto lê o seu artigo, e Jason tenta fazer com que os seus sorrisos em resposta não sejam tão forçados.

— Eu tenho que dizer, Jason, — Frank finalmente diz para ele, — isso é incrivelmente profissional. Se eu não soubesse, eu acharia que...

— Você comprou uma caneta nova recentemente?

Frank para. — Hã. O que?

Sangue corre para o rosto de Jason. — Uma caneta nova. Eu não vejo nenhuma caneta nova por aqui.

Frank o estuda cautelosamente e então aponta para uma de suas canetas. — Aquela é relativamente nova.

— Posso? — Sem esperar pela resposta de Frank, Jason pega a caneta e rabisca sua palma com ela.

É preta.

— Você tem alguma lilás?

— O que lilás?

Canetas, Frank. Canetas lilás.

Frank não responde por um tempo, e então, com movimentos lentos, como se tentando não assustar Jason, ele pega a caneta da mão dele e põe de volta no lugar. — Jason — ele diz, colocando as mãos entrelaçadas na mesa, usando sua voz de conselheiro —, me conte o que está acontecendo.

— Você bateu ponto com uma caneta lilás. — Jason se inclina para frente e agrava a sua voz. Ele quer que Frank entenda a gravidade da situação. — O meu ladrão de sanduíche escreve os bilhetes com uma caneta de tinta lilás.

Frank franze a testa por alguns segundos, sem entender, até ele compreender. E então, para a sua surpresa, ele não responde com exasperação como Piper, ou nojo como Leo, em vez disso ele ri — gargalha alto. Surpreso (e um pouquinho ofendido), Jason o encara.

— Você não acha mesmo sou eu? — Frank ri. Por causa da expressão de desconforto de Jason, ele só ri mais alto. — Ai meu deus, isso é demais. Jason, eu emprestei aquela caneta de alguém. Eu não tinha uma comigo na hora.

— Sério? Bom, de quem foi?

Frank controla o riso, olhando para o nada enquanto pensa nisso. — Hum... não consigo me lembrar.

É claro que ele não se lembra. Típico. Ele está começando a se perguntar se o seu ladrão de sanduíche é um fantasma. Um fantasma particularmente legal.

— Desculpe por não poder ajudar — Frank diz timidamente.

— Tá tudo bem — Jason desconsidera —, eu não acho que ele vai se revelar, mas tudo bem, estou disposto a esperar. Eu acho.

Ainda tem um sorriso no rosto de Frank enquanto ele pega o artigo de novo. — Sabe, eu tenho alguns suspeitos para essa sua coisa do sanduíche. Pessoas que eu acho que possam ser. Quer ouvir?

— Não, obrigado. Com a minha sorte, provavelmente não é nenhuma delas.

— Se você tem certeza — Frank cede. — Eu acho que terminamos aqui.

— Mas... o meu artigo?

— Você acha mesmo que podemos conversar normalmente sobre o seu artigo depois disso? Eu vou mandar ele para Reyna e elogiá-lo, é claro, e ela vai te dizer o que ela achou dele amanhã. Mas agora... — ele abafa o riso enquanto pega o seu celular — Eu tenho que contar isso para Hazel.

E, bem, ele mencionou a Hazel, então o Jason ter fugido correndo do escritório e não ter parado até estar seguro trancado no de Nico é completamente justificado.

~*~

O resto do dia é frenético, Jason andando por todo o prédio para que ele consiga enfiar a resposta à carta do seu ladrão de sanduíche na próxima edição enquanto se esconde de Annabeth, porque ele sabe que ela vai achar que ele não terminou seu trabalho a tempo, e amaldiçoando o seu ladrão de sanduíche o tempo todo em sua cabeça.

Ele sabe que ele não precisa publicar a carta ou a resposta. É tão em cima da hora, e ele podia só deixar na sua lancheira no dia seguinte para ele encontrar. Mas ele mandou para a coluna de conselhos, e quando Jason pensa na comida, nas flores, e meu deus nos laxativos, ele quer mesmo fazer isso.

De alguma maneira, ele dá um jeito de enfiar ela na edição. Elas serão impressas no dia seguinte, tanto a carta quanto a sua resposta:

Caro Ladrão de Sanduíche,

Vá em frente e se mostre. Ele quer saber quem você é mais do que você pode imaginar. Você não pode segurar a mão dele se nunca tentar alcançá-la.

Chapter 6: O Sexto Bilhete

Chapter Text

Hoje é o dia. Jason tem certeza.

Hoje faz exatamente uma semana desde que ele recebeu o primeiro bilhete do ladrão de sanduíche, e que dia seria melhor para o seu ladrão se revelar do que hoje?

Jason ter sugerido isso de forma tão eficaz na sua resposta para o último bilhete também ajuda. Ele está sentado à sua mesa, com a edição mais recente da revista em mãos, lendo de novo e de novo as suas palavras e as do seu ladrão de sanduíche publicadas na seção de Pergunte à Tia.

...esse cara no trabalho que eu gosto muito, Jason lê, seríamos realmente incríveis juntos.

Hoje tem de ser o dia. Se não for agora, então quando? Por mais fofos que todos os seus bilhetes têm sido, a excitação gerada pelo mistério já começou a passar. Jason não pode ficar trocando cartas com ele para sempre. Ele precisa saber quem ele é, mas mais do que isso, precisa que o ladrão de sanduíche se revele voluntariamente ao invés de Jason tentando o encurralar como ele fez antes.

É claro, tudo isso depende do ladrão de sanduíche. Talvez ele seja tímido demais. Ou talvez ele só goste de torturar o Jason, o que é bem mais provável.

— Por que essa cara? Espera, não me diga que Reyna já te rejeitou.

Nico está encostado em sua mesa, com o cenho franzido, enquanto mastiga alcaçuz vermelho. Aparentemente, Will viu o buquê gigante do ladrão de sanduíche como um desafio, especialmente porque Nico não parava de falar sobre o quão bonitas as flores eram, e presenteou o namorado com uma cesta de doces grande o suficiente para rivalizar o buquê. Nico distribuiu metade dos doces pelo escritório e estava ocupado comendo o restante, que era o motivo de sua boca estar constantemente cheia de chocolate e torrones esses dias.

— Não, ela não rejeitou — Jason responde, recusando com a cabeça quando Nico o oferece um pouco do seu alcaçuz. — Eu queria falar com ela bem cedo hoje de manhã, mas a Annabeth disse que ela vai estar ocupada com o departamento de Publicidade o dia todo. Eu vou tentar falar com ela depois.

— Ah. Então por que está tão triste?

Jason suspira. Ele inclina a revista na direção de Nico. — Eu só quero saber quem ele é. Eu não entendo por que ele está demorando tanto.

— Talvez ele só não queira ainda. Eu sei que ele praticamente declara o amor dele por você em cada um dos bilhetes, mas é muito mais difícil olhar para alguém no olho e expor seus sentimentos.

Jason franze as sobrancelhas. — Você está falando do Will?

Nico abafa uma risada. — Algo assim. Confia em mim, ele virá até você quando ele quiser. Até lá, só aproveita. — Ele inclina a cabeça — Ou nós poderíamos continuar preparando armadilhas para ele. Ainda tem um milhão de coisas que a gente ainda não testou.

Jason sacode a cabeça. — Não pareceria certo achar ele assim.

— Então nós poderíamos fazer alguma coisa por diversão, para tirar a sua cabeça dessa situação.

— Nico, a sua ideia de diversão no trabalho é transar com o Will na sua mesa — Jason faz uma careta, lembrando de hoje mais cedo quando ele esbarrou neles de novo, — o que é estranho já que eu me lembro de você me dizendo que seria nojento se fizesse isso.

Nico dá de ombros. — Eu mudei de ideia. Não critique até você ter experimentado.

Jason suspira, voltando o olhar para a revista. — Do jeito que está, isso nunca vai acontecer.

~*~

Ele passa a maior parte do dia nos andares de cima do prédio, resolvendo uns problemas na publicação que apareceram por causa da sua adição de última hora à edição. Quando ele termina, ele encontra um elevador vazio e se escora por alguns segundos na parede do fundo, com os olhos fechados, até ele escutar as palavras: — Segure a porta!

Jason dá um salto para frente, pressionando a mão contra as portas em movimento, no exato momento em que alguém vira apressadamente o canto e esbarra a mão em cima da dele.

Jason levanta o olhar até se fixar com um par de olhos verdes que se arregalam impossivelmente quando o veem. Os dois ficam parados por um tempo até Jason perceber que as portas deslizaram de baixo das mãos deles, e eles só estão imóveis encarando um ao outro enquanto dão as mãos.

— Ah — Jason cora, extraindo sua mão. — Desculpe.

Ele sorri com seus dentes brancos. — Está tudo bem.

Ele entra no elevador e pressiona o botão para o andar térreo. Ele está vestindo jeans e uma camisa colada ao corpo que é quase tão preta quanto o seu cabelo bagunçado, e está carregando uma caixa enorme cheia de arquivos e pastas. A sala de arquivos fica no andar mais baixo, ele deve ser um recepcionista...

Mas ele parece tão familiar. Jason já o viu antes, não viu?

— Espera, eu te conheço — ele deixa escapar. O cara, que estava sorrindo para a sua caixa de documentos por algum motivo desconhecido, olha para cima e levanta as sobrancelhas. Ele está mordendo o lábio como se estivesse tentando conter uma risada.

— É mesmo? — Ele pergunta. Sua voz é grave e cheia de alegria. Isso desperta uma memória.

— Você é o amigo do Nico! — Jason exclama.

As sobrancelhas dele se levantam mais ainda. — Amigo do Nico? Não posso dizer que já fui descrito assim muitas vezes.

— Nico di Angelo! Nos conhecemos daquela vez no aniversário dele... calma aí, você não trabalha aqui como recepcionista, trabalha? Eu poderia jurar que não foi assim que o Nico nos apresentou. — Ele cora. — Desculpe, não estou falando nada com nada, eu nem sei o seu nome.

O semblante dele cai. Como se Jason tivesse desligado um interruptor, o brilho em seus olhos enfraquece e o seu sorriso se desmancha. — Você não sabe meu nome?

— Ah, hum... — É só o Jason, ou os olhos dele realmente entraram em modo cachorrinho? Ele parece tão magoado, Jason quer dar um tapa em si mesmo. Ele vasculha o seu cérebro — Eu, hã...

— Percy. — Seus lábios se repuxam um pouco nos cantos ao ver Jason dar um tapa na própria testa em exasperação e sussurrar “Percy!” para si mesmo. — E você é o Jason.

Jason pisca. — Hum, é — Percy dá um sorriso de lado para ele, e Jason sorri de volta sem perceber. — Você sabe quem eu sou?

— Claro! — ele sorri largo, aquele tom de risada voltando para a sua voz. Jason se pergunta se ele sempre fala desse jeito. É meio que fofo. — Não seria um crime trabalhar nesse prédio e não saber quem a grande Tia Grace é?

— Ai, meu deus — Jason suspira, cobrindo o rosto (leia: o sorriso) com as mãos. — Não é para essa coisa ser anônima?

— Muita coisa é para ser anônima, mas eu sei de tudo. — Quando Jason abaixa as mãos, Percy está balançando as sobrancelhas para ele. — Mas não se preocupa, eu não vou contar para ninguém.

— Ainda bem, eu não iria querer que ninguém soubesse da minha vida dupla secreta.

Uma risada escapa dele naquele momento, tão radiante e feliz quanto o resto dele. Jason se pega rindo junto, toda a tensão da manhã o deixando em ondas.

— E não, respondendo à sua pergunta — Percy continua uma vez que se acalma. — Eu não sou recepcionista. Mas eu trouxe todas essas coisas para o meu escritório — ele inclina o queixo para a caixa — e eu preferiria não dar mais trabalho para alguém ter que descer com tudo isso e guardar, então decidi que eu mesmo faria isso.

Jason olha para a caixa com curiosidade e Percy a segura mais alto para ficar mais fácil de ele ver. As mãos dele seguram com mais força as beiradas dela, as linhas dos seus tendões se destacando, e quando ele levanta a caixa, os músculos em seus braços se tensionam sob sua pele — que é mais bronzeada do que Jason havia imaginado, um marrom dourado que fica muito bonito nele...

— Jason?

A voz de Percy está mais grave e, quando Jason levanta o olhar, seu rosto está mais perto do que antes.

— Esse é o seu andar — ele continua. Jason não precisa se virar para saber disso. Ele pode escutar a risada estridente de Leo até daqui, acompanhada pelos gritos da Piper de “HAZEL LEVESQUE, OU VOCÊ COLOCA ESSE BUMERANGUE NO CHÃO OU ENTÃO ME AJUDA!”. Ele nem se importa com o que está acontecendo.

Os olhos de Percy são bem mais escuros do que ele pensava.

— Você quer uma ajuda? — Jason deixa escapar. — Para guardar isso e tudo mais?

Percy pisca. Uma, duas vezes. Então um sorriso se abre em seu rosto. — Como quiser, Tia Grace.

~*~

— Então. O que é esse negócio de ladrão de sanduíche?

Jason quase esbarra em um armário. Ele olha para Percy por cima do ombro, o seu rubor se espalhando para o pescoço. — O que?

Percy está sentado em uma cadeira na única mesa da sala de arquivos, vasculhando uma gaveta cheia de documentos na frente dele. — O seu ladrão de sanduíche. Nico me contou.

Jason solta uma risada nervosa. — Nunca pensei que Nico sairia espalhando coisas por aí.

A mão de Percy para sobre os documentos. — Você prefere não falar sobre isso?

Para ser sincero, Jason preferiria não falar sobre isso com Percy. Eles só estão aqui há quinze minutos, mas Jason já está sentindo como se estivesse traindo o seu ladrão de sanduíche ou algo assim. O que é ridículo, porque não é como se ele devesse um encontro ao ladrão. Mas ele gosta muito mesmo dele, o suficiente para imaginar cenários com o cara sem rosto enquanto ele está deitado em sua cama à noite, e ainda assim, aqui está ele, periodicamente conferindo alguém que ele conheceu há menos de uma hora.

Mas Jason não pode ser culpado de verdade. Ele não sabe como deixou isso passar no aniversário do Nico — ou onde quer que seja que ele conheceu Percy pela primeira vez — mas o cara é, em poucas palavras, muito gostoso. E ele tem olhos incríveis, o que todo mundo sabe que é o ponto fraco do Jason. Ele é amigável e simpático também, e tem um senso de humor adoravelmente idiota que combina perfeitamente com ele.

Sem contar que ele é uma pessoa real. Não sem rosto como o seu ladrão de sanduíche. Na verdade, ele tem um rosto bem atraente.

E Jason está se sentindo culpado por ter notado isso.

O ladrão de sanduíche não é seu namorado, ele lembra a si mesmo. Só porque ele te faz comida e te compra flores e toma laxativos por você e te escreve bilhetes fofos... aonde eu estava indo com isso?

Algo leve colide com o lado de sua cabeça. Jason olha para baixo e vê uma bola de papel amassada aos seus pés e estreita os olhos para Percy, que estava ocupado amassando outra. — Você não respondeu quando eu falei seu nome. Eu estava preocupado que você estivesse tendo uma convulsão ou algo do tipo.

— E a sua primeira ideia foi tacar coisas em mim?

— Funcionou, não foi? — Percy dá um sorriso largo. — Nós estávamos falando sobre o seu ladrão de sanduíche.

Ele se inclina para frente como se estivesse ansioso para ouvir o que Jason tem a dizer. Jason se senta à frente dele. — Não tem muito o que contar.

Percy franze o cenho. — O que você quer dizer? Não é legal? Ter um admirador secreto e tal?

— Bom, é, e ele é bem fofo e tudo mais, mas...

— Mas?

— Mas esse é o ponto. Ele é tão legal e simpático e eu sei que nos daríamos muito bem se a gente se encontrasse, mesmo se a gente acabasse não namorando, então por que ele não se mostra logo? O mistério, os bilhetes e os presentes são legais por um tempo, claro, mas eu quero conhecer ele também. Eu quero falar com ele cara-a-cara e agora... — ele suspira — eu só estou esperando ele dar o próximo passo.

Percy fica em silêncio por muito tempo enquanto estuda o Jason. Jason tenta manter o contato visual, mas é muito difícil quando ele está o encarando tão intensamente como está.

Parece ter se passado muito tempo até Percy umedecer os lábios e dizer: — Talvez ele esteja com medo do que vai acontecer se você descobrir quem ele é. Talvez seja muito menos assustador se esconder atrás de papel e caneta.

— Ele não pode se esconder para sempre, pode? Eu espero que ele não se esconda para sempre.

Percy sorri, abaixando os olhos. Ele está brincando com a borda de uma folha, dobrando para lá e para cá. — Ele provavelmente só está se sentindo intimidado por você.

— Por quê? Eu não sou intimidante.

Percy ergue uma sobrancelha.

— O que? Eu não sou!

— Talvez não como amigo — Percy responde, rindo um pouco. — Mas como um paquera, eu não teria tanta certeza.

A voz dele ficou silenciosa e sóbria, desprovida daquele tom de riso que Jason começou a apreciar. Ele se pergunta o que disse de errado.

— Eu não estou dizendo que ele está errado em estar assustado — Jason fala. — Eu também já chamei pessoas para sair, eu sei que ele estaria. É bem possível que eu só queira ser amigo dele. Mas também é bem possível que eu não queira. E como a gente vai sequer saber se ele não tentar?

— Isso parece muito com o que você falou para ele antes — Percy diz, e o coração de Jason dá um salto. Cenários impossíveis passam pela sua cabeça, até Percy olhar para ele e dizer: — Você sabe, na última edição da revista, quando ele escreveu para você.

— Ah — Jason desvia o olhar rapidamente, um nó de decepção pesando no seu coração. — É, eu esperava que ele fosse entender a dica depois daquilo.

Percy solta uma risada, ainda brincando com a pasta. — Ele deve ser muito burro.

Jason sorri quando Percy sorri. — Deve ser.

~*~

Jason e o seu novo amigo se separam no elevador de novo, e quando Jason sai no seu andar e pergunta para ele se vai ver ele de novo, Percy dá uma piscadela e diz — Mais cedo do que você pensa.

Jason não está nem preocupado com o que isso significa, contanto que ele veja.

~*~

Quando chega a hora do almoço, Jason pega a sua lancheira da geladeira e decide almoçar no parque perto dali.

Ele passa um tempo andando por aí, ajuda algumas crianças a alimentar os patos no lago, bate um papo com uma senhora que está lá com os netos. É só quando ele está sentado sozinho em um banco debaixo da sombra de um grande carvalho que ele abre a vasilha e olha o que tem dentro.

Brownies. Ele fez brownies para Jason, completos com cobertura de chocolate e granulado de arco-íris.

A única coisa estranha é que dessa vez o bilhete não está escrito em um pedaço de folha de caderno. Está em um Post-It colado na parte de dentro da tampa, rabiscado com pressa em sua característica tinta lilás. Jason dá uma mordida no brownie ao mesmo tempo que ele vira a tampa para ler a mensagem.

É curto e simples:

Eu tentei fazer algo tão doce quanto você, mas eu não tinha açúcar o suficiente.

Um passarinho me contou que você está se sentindo para baixo hoje, então eu achei que você poderia pegar emprestada uma coisinha minha. Eu deixei no canto da vasilha. Não se preocupe, eu coloquei em um daqueles saquinhos Ziploc para que não ficasse cheio de chocolate.

Espero que isso o faça se sentir melhor! Você pode me devolver quando a gente se ver.

Jason encara a última frase por um minuto inteiro, com a metade de um brownie na boca. Quando ele percebe que provavelmente parece doido para outras pessoas, ele se apressa para encontrar o que quer que o ladrão deixou para ele.

Quando acha, ele primeiro tira uma camada de guardanapo, então abre o saco de plástico e sacode o objeto para fora.

É um broche, como aqueles inspiracionais que dizem Acredite em você.

Exceto que esse é branco, com nada além de uma piscadela estilizada no topo.

~*~

Quando ele volta para o escritório, com um sorriso feliz no rosto, ele dá só dois passos antes de Nico se materializar do nada, com um pirulito na boca, e o agarrar pelos ombros. — Onde você estava? — ele exclama. — Reyna voltou há quase meia hora e eu tenho certeza de que vi ela lendo o seu artigo e você não estava em lugar nenhum!

Os olhos de Jason saltam para o escritório da Reyna e ele consegue ver ela lendo algumas folhas grampeadas através das paredes de vidro. — Ai, meu deus. É isso. — Ele segura Nico, sacudindo-o — É isso! Ela vai me dizer se eu vou virar escritor!

— E você vai! — Nico o sacode de volta.

— Eu vou virar escritor!

— Se acalmem, vocês dois — Will diz do lado deles. Ele está encostado na parede, sorrindo divertido para eles em volta da barra de chocolate que está mastigando. Jason nem percebeu que ele estava ali. — Não comemorem ainda. Primeiro você precisa falar com a Reyna.

— Você está certo. — Nico solta Jason. — Seu cabelo está uma bagunça. Will, pente.

— Como é? — Jason pergunta, mas Will já tirou um pente do bolso de trás. Jason só tem alguns segundos para lançar um olhar altamente crítico a Will (que Will responde gesticulando para o próprio cabelo tipo você não tem um cabelo desse sem dar duro por isso) antes de Nico começar a passar o pente pelo seu cabelo, praticamente arrancando o seu couro cabeludo.

— Ai! Nico!

— Cala a boca — Nico ordena, segurando seu maxilar para que ele não consiga se afastar. Ele passa o pente por tempo e com força suficientes para fazer lágrimas se acumularem nos olhos de Jason e então finalmente recua. — Pronto. Agora você está decente. Só não toca nele.

Jason bufa. — Tá bom, Mãe.

Nico sorri. — Entre lá e me faça orgulhoso.

~*~

Jason já perdeu a sensação nas suas bochechas, mas ele não consegue parar de sorrir. Reyna está obviamente tentando conter um sorriso enquanto ela assiste a sua reação. Finalmente, depois de balbuciar por tempo demais, Jason inspira. — Mesmo?

Reyna acena com a cabeça. — Você vai ter que ajeitar umas coisas, e Frank vai ajudá-lo com isso, mas uma vez que tiver terminado, dentro do prazo definido pela Annabeth, é claro, estará pronto para a próxima edição.

Jason mal consegue respirar. — E vai ter o meu nome nele?

— Seu nome e em um lugar de destaque também. Não são muitos escritores novatos que podem dizer que fizeram isso.

— E eu posso... posso continuar escrevendo?

— Eu não vou mentir para você, Jason, pode levar um tempo até você ter a chance. — Ela dá de ombros. — É só do jeito que é. E você ainda não vai entrar oficialmente para a equipe de redação, não ainda, mas assim que você tiver escrito o suficiente para nós, eu o promoverei com prazer — contanto que encontremos outro conselheiro sentimental. Mas é claro que você será pago por tudo que escrever.

— Mas eu posso continuar escrevendo?

Reyna sorri abertamente. — Por que não?

O seu corpo todo parece pesar tanto quanto um balão de hélio. Ele não consegue se conter — uma risada escapa dele, ofegante e alegre e não parecendo nada com ele. Ele não consegue ficar parado. Está praticamente dançando em sua cadeira.

— Obrigado — ele diz. — Muito obrigado.

— O prazer foi meu. Tiveram algumas pessoas que me importunaram para te dar uma chance. Você deveria agradecê-las também.

— Nico, Annabeth e Frank — Jason acena alegremente com a cabeça. — Eu vou, acredite em mim.

— E teve mais um — Reyna dá um sorrisinho —, mas eu só acho que ele estava falando isso porque tem uma queda por você.

A respiração de Jason fica presa na garganta. — O que?

O sorrisinho de Reyna se alarga. Ela parece tão orgulhosa de si mesma. — Foi bem suspeito. Eu nem achava que vocês dois se conheciam, e ele só ficou apropriadamente interessado no artigo quando ele leu o seu nome. Então ele começou a falar sem parar sobre o quão excelente era e em como eu tinha que publicá-lo.

O queixo de Jason está no chão.

— Eu não sei como eu não percebi antes. Ele é melhor em guardar segredos do que eu pensava.

Jason finalmente consegue respirar. — Você sabe quem é o meu ladrão de sanduíche. — Não é uma pergunta.

Reyna nem dá um sorrisinho dessa vez. Ela sorri de orelha a orelha. — Sim.

— Meu deus do céu — Jason agarra os braços da sua cadeira. — Você sabe quem ele é. Você viu ele. Você o conheceu. Você conversou com ele. Sabe com certeza quem ele é.

Reyna assente, rindo para si mesma por causa da incredulidade dele.

— Meu deus.

— Antes que pergunte, eu não vou contar. Ele me fez prometer.

— É claro que ele fez. Qual seria o objetivo disso tudo se você só me dissesse quem ele é?

— Mas você não quer saber?

Jason hesita. Tanta coisa aconteceu nos últimos minutos. Seu coração está a mil, seu rosto está quente, e ele não consegue parar de sorrir.

Ele coloca a mão no bolso, passando os dedos sobre o broche guardado ali.

— Ele vai me contar logo, não vai? — ele pergunta.

— Foi o que pareceu.

Jason acena com a cabeça. — Então eu posso esperar. Contanto que ele queira que eu saiba.

Para a sua surpresa, Reyna ri. Não é uma gargalhada — porém, ele também nunca esperou que fosse ser — mas quando ela se acalma, está sorrindo largo para ele. — Eu nunca te imaginei como um romântico, Jason Grace.

— Só me diz isso. — Ele respira fundo. — Ele... ele é uma boa pessoa?

— Sem sombra de dúvida — Reyna responde prontamente, — e eu nunca pensei em vocês dois juntos de qualquer forma, mas agora que imaginei, faz sentido. Faz todo sentido.

Há provavelmente um milhão de perguntas que Jason pode perguntar, mas a sua mente está nublada com uma linda névoa verde-mar no momento. Ele dá um sorriso bobo, aperta o grampo na parte de trás do broche, e se pergunta como o seu coração ainda não explodiu de pura felicidade.

— Mais alguma pergunta? — Reyna questiona.

— Só uma — Jason responde ao se levantar. — E essa é importante: ele aprecia a beleza dos meus sanduíches como ele deveria?

Reyna ri. — Demais — ela diz, devolvendo-o seu artigo, — é até estranho de ver.

Naturalmente, Jason está convencido.

Chapter 7: O Sétimo Bilhete

Chapter Text

São nove horas da manhã quando Nico o encontra. Jason está surpreso que ele demorou tanto.

A chave reserva de Jason está no batente acima da sua porta, então ele fica deitado no sofá, escutando os grunhidos de irritação do Nico enquanto ele tenta pular para alcançá-la por cinco minutos inteiros até a chave ser enfiada na tranca e a porta abrir.

No momento em que eles fazem contato visual, Jason diz uma palavra. — Não.

Nico coloca as mãos na cintura e estuda Jason. Ele ainda está de pijamas, confortável em um cobertor azul felpudo, com um filme qualquer do Nicholas Sparks passando na TV. Um vaso grande cheio de flores murchando está na mesa de café na frente dele, e um broche de piscadela em seu peito. Ele está acariciando a superfície de plástico como se estivesse tirando conforto dela.

— E por que não? — Nico pergunta.

— Eu não consigo fazer isso — Jason faz beicinho. — Ninguém é tão legal na vida real quanto é por mensagem. Eu não vou gostar dele e então ele vai decidir que eu não valia a pena e nós dois vamos odiar um ao outro. Minhas expectativas estão muito altas, Nico. O que quer que aconteça agora só vai me decepcionar e me magoar.

— Não se ele for tão incrível quanto Reyna diz que ele é.

— E daí? Um monte de gente é incrível. Não quer dizer que eu me dou bem com elas. — Ele volta o olhar para a TV. — Me deixa sozinho com meu sofrimento.

— Ah, pelo amor de... — Nico avança, pega o cobertor enrolado nos pés dele e puxa com força, e o Jason cai no chão de uma vez.

É culpa dele mesmo, Jason pensa apático, enquanto o mundo gira ao seu redor. Ele devia saber melhor do que irritar o irmão de Hazel Levesque. A fúria deles é de família.

— Nico — ele resmunga de onde sua cara está estatelada no chão. Ele rola, estende o braço para o broche e pressiona ele contra sua palma. — Eu não posso...

— Cala a boca — Nico dispara, e então se senta em cima do peitoral de Jason.

Ele é mais pesado do que parece. Jason respira ruidosamente. — Que diabos...?

— Cala a boca.

— Nico, eu não acho que o Will apreciaria...

Nico estica o braço para cima, pega uma flor murcha do vaso e enfia a flor molhada na boca de Jason, o tempo todo repetindo “Cala a boca, cala a boca, cala a boca”.

Jason se contorce, tentando se libertar, mas Nico está segurando-o com firmeza. — Nico! — ele grita — Sai de cima, seu... — Nico enfia mais uma flor em sua boca, ainda repetindo as mesmas três palavras.

Decidindo que ele chegou no poço de raiva que ele sempre suspeitou que existia bem no fundo do seu melhor amigo, Jason para. Ele não leu em algum lugar que você deve cooperar com um assassino em série se esbarrar em um, para que ele não te estripe e te pendure para apodrecer?

— Vai ficar quieto agora? — Nico dispara de cima dele, suas mãos tampando com força a boca cheia de pétalas de Jason. — Que bom. Agora, você quer saber o que eu, seu melhor amigo, o observador de todo esse fiasco do ladrão de sanduíche, penso? Quer?

Jason acena com a cabeça.

— Não! Você não quer! Eu estou sempre te dando conselhos e você nunca entende que eu estou certo! Eu sei de coisas, Jason. Eu não tenho hábito de pensar demais sobre as coisas como você tem, eu sou uma pessoa vendo de fora, não envolvida; um espectador, e mais importante de tudo, sou o seu melhor amigo, então você devia ouvir o que tenho a dizer!

Ele está praticamente pulando no tórax de Jason quando termina de falar. Jason nunca o viu tão agitado assim antes. Ele deve ser demais mesmo para fazer isso com o Nico.

— Agora você vai parar de ser um idiota e ouvir? — Nico olha feio para ele.

Jason assente mais fervorosamente dessa vez, até fazendo um joinha para ele. Nico continua o encarando mesmo quando ele tira as mãos da boca dele, e Jason finalmente consegue cuspir as pétalas.

— Continue — ele diz, baixinho, para não o irritar de novo.

Nico revira os olhos e dá um tapa no lado da cabeça de Jason. — Para de me tratar como se eu fosse louco — ele exige.

— Eu pararia se você parasse de agir como um — Jason murmura. — Poderia pelo menos se sentar na minha barriga?

Com o rosto impassável, Nico desliza para trás até sua bunda estar em cima do abdômen de Jason. — Obrigado — Jason diz, — agora estou ouvindo.

Nico o encara com firmeza, e quando ele fala, ele fala devagar, como se para dar importância às suas palavras: — Eu sei que te assusta o quanto você gosta dele, ainda mais quando você nem o conhece. Você se sente estúpido por ter sentimentos por umas palavrinhas escritas em um pedaço de papel, mas é muito mais do que isso. Todas aquelas palavras, comida, aquelas flores, esse broche que você está segurando como se sua vida dependesse dele, todas essas coisas foram dadas a você por uma pessoa de verdade. Uma pessoa que quer te conhecer tanto quanto você quer conhecer ela. A única coisa que impede vocês é vocês dois achando que um não vai gostar do outro como o outro gosta de você, mas você não percebe? — Ele agarra os ombros de Jason e dá uma sacudida. — Isso não importa, nem um pouquinho. Ninguém pode dizer que você vai gostar dele romanticamente, mas isso não significa que você não vai gostar dele platonicamente. E só porque você não pode namorar ele, não quer dizer que vocês não podem ser amigos.

— E! — Ele continua, sacudindo Jason com mais força ao ver ele pressionar os lábios. — E se vocês não quiserem nem ser amigos, tudo bem! Você pode escolher seus amigos, certo? Se você decidir que não gosta mesmo dele, vocês podem só se separar e todos nós seguimos em frente.

“Mas se você não conhecer ele, vai sempre se perguntar o que poderia ter acontecido. Você vai acabar pensando que ele era o cara para você, e vai ficar comparando todo mundo que namorar com uma ideia impossível dele que você cria na sua cabeça. Isso não é pior do que conhecer ele, se magoar e se decepcionar por causa dos seus próprios sentimentos, e então superar toda a situação depois de umas semanas?

Então ele para, com as sobrancelhas arqueadas, esperando pela resposta de Jason. O grampo do broche deve ter deixado uma marca permanente na sua pele a essa altura. Jason respira fundo e assente com a cabeça.

Nico assente com ele, um sorriso encorajador aparecendo nos lábios. — E quer saber? Pensa pelo outro lado. Ele pode acabar sendo tudo o que você vem sonhando esse tempo todo.

Jason sacode a cabeça. — Eu acho que não. A pessoa que eu criei na minha cabeça... ele não pode ser tão perfeito.

— Ninguém nunca é perfeito, Jason. Pessoas só são tão perfeitas quanto você as considera, e quando você está apaixonado por alguém, nada e nem ninguém é melhor aos seus olhos.

Jason abre um sorriso. — Então você tá dizendo que ele pode ser um baladeiro que anda com as calças na canela, mas desde que eu ame ele, ele é perfeito?

— Eu estou dizendo que de todas as coisas que você poderia fazer agora, ficar em casa pensando demais até ficar miserável por causa de uns bilhetinhos de um admirador secreto, que nem um típico adolescente sem experiência, é a mais estúpida.

Jason suspira. — Você é tão mau comigo. Por que somos amigos?

— Porque você estaria perdido sem mim.

— Pelo menos eu não teria quase me engasgado em um buquê.

— Isso é culpa do seu ladrão de sanduíche. Se ele tivesse te dado um buquê de doces como o meu namorado, você teria se engasgado nele de bom grado.

Jason ri. — Obrigado, Nico.

Nico sorri para ele. — Sem problema. Eu vou sempre estar aqui para te lembrar do quão idiota você é.

— Ainda bem — ele fecha a mão em volta do broche. — Alguém tem que fazer isso.

~*~

Reyna não o repreende por chegar atrasado, ainda bem. Ela só levanta uma sobrancelha quando ele aparece, mas não comenta.

Ele se vestiu com muito mais dedicação do que ele normalmente se vestiria, sem dúvida. Ele está usando as roupas mais novas que tem — um par novo de calças jeans (que, de acordo com o Nico, fazia a bunda dele ficar bonita, ele confia na opinião do Nico) e uma camiseta de manga longa, feita de um tecido que parecia se colar nele, mas não de um jeito desconfortável. Nico enrolou um pouco as mangas, e então torturou o couro cabeludo do Jason de novo com um pente. Jason passou uma quantidade excessiva de spray corporal nele mesmo (ele gosta de ficar cheiroso, e daí?) e então calçou os tênis mais bonitos que ele tinha antes de sair de casa.

Mas, até Nico não soube, Jason passou uns minutos a mais no banheiro cuidado da sua região bucal: escovando os dentes, usando enxaguante, gargarejando, fazendo a barba, e até mastigando uma bala de hálito fresco de menta. Ele não ousa achar que vai mesmo beijar o seu ladrão hoje, mas ele pode sonhar, não pode?

E, é claro, como um toque final, o seu broche de piscadela guardado com segurança no seu bolso, ao seu alcance.

~*~

Ele passa a maior parte do dia trabalhando com Frank no seu artigo para deixá-lo perfeito o mais rápido possível.

Ele reserva quinze minutos inteiros especialmente para agradecer às pessoas que opinaram a favor dele para a Reyna. É claro, ele não pode fazer isso cara-a-cara com o ladrão de sanduíche, pelo menos não ainda, mas ele agradece em seu bilhete, que escreveu com quase tanto carinho quanto como ele fez o seu sanduíche.

Querido Ladrão de Sanduíche,

Eu espero que essa seja a minha última carta para você, já que você disse que nos encontraríamos em breve e se nos encontrarmos, escrever cartas será a última coisa em minha mente.

Reyna me contou que você me apoiou com meu artigo e eu quero te agradecer. Sério, de verdade, do fundo do meu coração. Mesmo se você ache que sua opinião não importa muito, importa para mim que você me apoiou.

Tá bom, eu vou falar logo. Você. Está. Me. Matando.

Eu não me lembro da última vez que eu fiquei tão afetado por causa de alguém que eu nunca nem vi. Eu já imaginei mil e um cenários diferentes te conhecendo, como você vai ser, como vai ser falar com você de verdade, e mais um monte de coisas constrangedoras que eu não vou confessar.

Resumindo: eu quero muito, muito, MUITO te ver. Quero tanto que eu estou até um pouco assustado, mas a única coisa mais assustadora que te encontrar seria não te encontrar.

Tudo o que eu preciso é de uma dica. Uma dica propositalmente óbvia que você tem certeza de que eu vou entender. Você nem vai ter que fazer uma grande revelação. Eu só irei até você. Eu acho que isso daria certo.

Aproveite o seu sanduíche.

Seu,

Jason Grace.

~*~

— E aqui — Hazel diz com um clique final do seu mouse, indicando um espaço na página da revista na tela — é onde o seu nome vai estar, acima do resto do artigo.

Ela está sorrindo com os dentes para ele enquanto fala, e atrás dele Leo agarrou os seus ombros e está pulando para cima e para baixo com empolgação, cantando “Jason vai ser um escritor, Jason vai ser um escritor!” de novo e de novo. Do lado de Hazel, Piper está recostada em uma cadeira, com o pé da Hazel no colo enquanto ela passa esmalte nas unhas dos dedos do pé. Ela desenha uma carinha sorridente no dedão de Hazel e mostra para Jason. Ele a corrigiria se não estivesse tão feliz.

— Bom o bastante? — Hazel pergunta a ele.

— É claro — Jason fala na hora. — Isso é... — uma risadinha fina esquisita escapa de sua boca. — Isso é incrível. Eu não tenho absolutamente nada para reclamar.

— Bom, que bom, porque não adiantaria de nada de qualquer jeito — Piper diz.

— Isso não é demais? — Leo praticamente grita no ouvido dele. — Esse é o melhor dia de todos, cara!

— Em mais de um sentido — Hazel acrescenta, trocando olhares com Piper.

— Tem mais alguma coisa acontecendo? — Leo exclama. Jason está certo de que ele roubou do esconderijo de doces do Nico hoje — ele tem estado tão empolgado, os pés dele mal tocaram o chão. Mesmo agora, ele está quase escalando as costas de Jason.

— Eu só sei o que o Nico me contou. Vocês deveriam ouvir tudo direto do Jason.

Jason olha feio para ela sem maldade alguma enquanto Leo dramaticamente respira fundo em espanto e segura a cabeça de Jason de onde ele está no cangote dele. — Tem a ver com você?

Jason está levemente preocupado com as pupilas dilatadas de Leo. Quanto doce exatamente ele consumiu? — Tem a ver comigo. — Sua voz não soa nada como ele, está rouca e suave, como a de Nico quando ele fala com o Will pelo celular (Jason não quer bisbilhotar, só acontece às vezes).

— Ou mais especificamente — Piper se manifesta — com o ladrão de sanduíche dele.

— Alguém disse “ladrão de sanduíche”? — Frank enfia a cabeça no escritório de Hazel. — Eu tenho escutado muito essa frase esses últimos dias.

— Eu sei, né? — Leo vira o corpo para que possa olhar direito para Frank. — Quem já ouviu falar em alguém roubando comida? Essa é a coisa mais idiota... ai, meu deus — ele dá um tapa no próprio rosto, seus olhos arregalando. — O Hamburglar. Meu deus do céu. Eu não acredito que eu me esqueci dele. O que tá acontecendo comigo? Como eu pude fazer isso? Senhor, me perdoe.

— Ele comeu o próprio peso em doces hoje — Piper explica ao ver a expressão de confusão de Frank. — Eu também, mas eu não sou fraca para doce que nem ele.

— Não liga para o Leo — Hazel ignora ele. — Jason, conta para a gente — ela se inclina para frente, os olhos brilhando. — A gente vai conhecer o famoso ladrão de sanduíche hoje?

Todos eles param o que estão fazendo, se virando para olharem para ele com expectativa — até Leo olha para ele de onde ele está sentado em seu cangote (e caramba, o seu pescoço está doendo). O peso dos olhares deles quase apaga o sorriso bobo do rosto de Jason. Quase.

— Eu não tenho certeza — ele admite. — Mas se eu encontrar ele... eu acho que gostaria de passar o dia sozinho com ele.

Os outro 4 o encaram, Leo piscando assustadoramente rápido. Finalmente, Piper funga e enxuga uma lágrima imaginária de seu olho. — Nosso bebezinho encontrou O Cara — ela fala baixinho, abraçando a perna da Hazel.

— Eles crescem tão rápido — Hazel concorda, esfregando o braço dela.

— Você ainda tem que trazer ele aqui para que eu possa verificar ele — Frank diz com seriedade. — Nós não queremos Reyna quebrando ossos desnecessariamente.

— Posso ser a sua dama de honra? — Leo belisca o nariz de Jason.

—Eu odeio todos vocês — Jason declara, mas ele não pode deixar de se juntar ao riso deles.

~*~

Jason fica parado por cinco minutos inteiros com o bilhete em mãos, sem se mover, sem abrir o papel.

Nico, como a criatura linda e compreensiva que ele é, não reage e nem questiona Jason sobre a sua imitação de estátua. Ele só se encosta no balcão, digitando em seu celular, até que Jason esteja pronto para se mexer.

Para falar a verdade, Jason mesmo não tem certeza do porquê ele não está.

É o nervosismo atacando de novo, exceto que não é só isso. Seu coração está batendo forte, suas mãos estão suadas, seu estômago está revirando de um jeito que não é nem agradável, nem desagradável — no meio termo. De repente o broche virou uma rocha incandescente em seu bolso. Por que ele está tão nervoso, ele não tem certeza. Afinal, é só um bilhete.

Exceto que tem muitas coisas que poderiam ser perturbadoras sobre essa situação, sobre as últimas duas semanas, sobre receber presentes e trocar cartas com um desconhecido. Ele tem estado tão estático ultimamente, e ele está com medo do momento em que ele vai cair na real.

E ele eventualmente vai, é claro. Só depende de se o seu ladrão é um paraquedas, ou uma rocha amarrada ao seu peito.

— É isso?

Jason dá um salto, e vira para encarar Annabeth, que parece tão assustada quanto ele. — Foi mal — ela diz —, não tive a intenção de interromper a sua... meditação?

— Eu tava só... — Jason abaixa o olhar para o seu sanduíche — olhando.

— Eu percebi. Você ainda não abriu o bilhete?

— Ele abriu a lancheira — Nico diz. — Olha o que tá dentro dela. — Ele enfia a mão na lancheira e tira um sanduíche. — A versão do ladrão do sanduíche do Jason — ele sorri. — Não é magnífico?

— Você não comeu nada — Annabeth diz para Jason.

— Ele já está sentindo como se fosse vomitar, mas você devia ter visto a cara dele quando viu o sanduíche. Enfim, você precisava de alguma coisa? A gente vai ficar um tempo aqui.

— Não, eu só ia dar uma olhada no bilhete. Eu não quero ler ele, mas eu queria que você soubesse que eu acho que reconheci a caligrafia naquele bilhete que veio com o buquê. Eu acho que é um dos meus amigos. Melhores amigos, até.

— Deixa eu adivinhar — Jason diz ironicamente —, é familiar, mas você não se lembra de quem é a letra?

Ela não responde na hora, só fica lá parada e sorrindo para ele por alguns segundos. Nico e Jason trocam olhares confusos, e então quando Jason levanta as sobrancelhas, ela só sorri mais largo. — Não — ela finalmente responde —, não reconheço mesmo.

Então ela passa por ele sem olhar para trás. Jason e Nico ficam olhando para ela.

— Ai, meu deus — Nico sussurra depois de uns segundos, seu tom de voz quase reverente. — Ela sabe.

Jason só o encara de queixo caído. — Ela soube esse tempo todo? Ela... ela é cúmplice dele?

— E ela só te deixou ficar sabendo agora — Nico percebe. Ele pressiona as mãos no seu rosto, como se não conseguisse compreender isso. — Ele está te deixando saber disso. Eu sabia que ele tinha um tipo. Por que eu não percebi isso antes?

O mundo desaba sob seus pés, mas como se ele estivesse voando, não caindo. É mais como asas do que paraquedas. Tudo o que preciso é de uma dica, ele pensa. — Mas quem é ele?

—Quem é ele? Jason, pensa nisso. — A boca de Nico, que estava escancarada até agora, se curva em um sorriso enorme. — Se a Annabeth é a cúmplice, quem poderia ser o autor do crime?

Jason acha que sabe a resposta. Deuses, ele acha que sabe a resposta.

Agora ele tem certeza de como Nico o apresentou durante a sua festa de aniversário: “O melhor amigo da Annebeth”.

Só tem uma coisa a se fazer agora, óbvio.

Jason abre o bilhete.

Há duas coisas que me fizeram querer fazer tudo o que eu fiz durante a semana passada: seus olhos e seu queijo.

É a coisa mais boba, mais idiota que alguém poderia escrever para outra pessoa. Mas mesmo enquanto Jason ri, ele entende.

~*~

Ele está recostado em sua cadeira, vestindo uma camisa simples e calças jeans como ontem, mas quando ele levanta o olhar assim que Jason entra, seu rosto inteiro irradia uma felicidade infinita.

Nenhum deles fala nada por alguns momentos, enquanto Jason se balança para frente e para trás no espaço à frente da sua mesa (bem grande) e ele fica sentado atrás dela, sorrindo presunçosamente para Jason com os lábios, com os olhos e com o corpo todo. Os segundos passam como se eles estivessem mergulhados em um molho, e por muito tempo eles só se olham, as pontas dos dedos de Jason formigando, seu rosto quente, arrepios percorrendo todo o seu corpo enquanto suas entranhas se reviram.

E ele desfruta disso por um instante: do caleidoscópio de cores rolando em seu coração, de flores perfumadas desabrochando em sua mente, do sentimento de não estar exatamente apaixonado, mas em algum lugar desesperadamente perto de estar — um lugar aterrorizante, emocionante e completamente lindo, tudo ao mesmo tempo.

E só porque ele finalmente o encontrou.

Depois de todo esse tempo, de toda essa espera, e de escrever, esperar e ansiar, ele finalmente sabe quem o seu ladrão de sanduíche – o seu admirador secreto – é:

Um merdinha, isso que ele é.

— Ontem — Jason diz, lutando para manter sua alegria fora de sua voz — você estava falando de si mesmo. E você não me contou.

Ele obviamente fracassa nisso, porque Percy só sorri. — Você nem lembrava do meu nome — ele responde, felicidade refletindo de cada palavra como a luz reflete de seus olhos.

Tem um alto suspiro de choque de trás de Jason. — Você não lembrava do nome dele?

Pela primeira vez, as sobrancelhas de Percy franzem. Ele se levanta e enxerga Nico, que está olhando para Jason como se ele tivesse acabado de assassinar o seu primogênito. — Você já viu ele mais vezes do que eu posso contar! — Nico exclama. — Ele esteve te mandando cartinhas de admirador secreto, comida e presentes e você não lembrava do nome dele?

Ele parece tão horrorizado, Jason não sabe o que dizer. Ele olha impotente para Percy, que imediatamente faz um beicinho exagerado e diz: — Foi bem ofensivo.

Ele está aproveitando cada segundo disso, Jason consegue ver. Ele vai mostrar para ele o que é ofensivo.

— Você não tem jeito — Nico grunhe.

— Bom, pelo menos eu sei o nome dele agora!

Percy se anima com isso, seu beicinho sumindo. — Você sabe?

— É claro — Jason diz. — Você é o Percy Jackson.

E ele não tem intenção, mas as palavras saem com uma estranha importância. Talvez seja porque é a primeira vez que ele está propriamente encontrando ele, esse cara por quem ele está tendo sentimentos fortes demais. Talvez seja porque ele não conseguiu desviar seus olhos dos dele enquanto ele dizia seu nome, independente do quanto ele tentou, não que ele queria mesmo. E talvez seja por causa de como o rosto de Percy se abre em um sorriso; um de adoração, quase de alívio, e ele sabe que Percy também não consegue desviar o olhar.

— É — ele responde, sua voz suave de repente —, e você é o Jason Grace.

É um eco quase perfeito da conversa deles no elevador ontem. Jason não consegue superar isso. Percy é o seu ladrão de sanduíche. Percy escreveu bilhetes para ele com uma caneta lilás, desenhou sorrisinhos tortos, mandou para ele as flores que estão pressionadas entre as páginas dos seus livros nesse momento, a carta para a sua coluna, o broche em seu bolso.

É surreal.

Ele não percebeu que eles não se moveram até Nico declarar: — E eu sou Nico di Angelo, atualmente se sentindo como uma vela, deixando os dois idiotas para a sua competição de encarar, que Jason definitivamente vai me contar sobre mais tarde.

Ele já está indo em direção à porta enquanto fala e o coração de Jason palpita com a ideia de ficar sozinho com Percy — por apreensão ou empolgação, ele não sabe.

Mesmo assim, eventualmente a porta se fecha atrás de Nico. E é só eles dois.

Jason não examinou a mesa de Percy antes, mas agora que ele observa, ele vê todas as coisas que esteve procurando durante os últimos dias: tem uma caneta lilás fina na lapiseira, um caderno aberto que tem a mesma folha de caderno dos bilhetes. Ele quase não consegue acreditar nisso, como se tudo isso fosse uma miragem.

Percy se moveu para a frente da mesa agora, ao mesmo tempo muito perto e longe demais. Por alguns segundos, nenhum deles fala nada, mas quando Jason abre a boca, palavras saem automaticamente.

— Você é tão mentiroso.

Percy não parece ofendido. Ele só sorri agradavelmente. — Como você descobriu?

— Você não está nem um pouco intimidado.

Ele ri. — Se eu não estivesse intimidado, eu teria feito tudo isso cara-a-cara ao invés de me esconder atrás de bilhetes.

— E me espionando por meio de uma cúmplice — Jason ressalta.

— Eu não espionei — Percy revira os olhos com afeto, se movendo ainda mais perto —, Annabeth só estava garantindo que tudo corresse sem problemas, e que você não estava incomodado por minha causa. — Ele dá de ombros, tímido. — Além disso, ela estava de saco cheio de me ouvir falar de você, então decidiu que a gente tinha que fazer alguma coisa sobre isso.

É o tipo de elogio sutil que ele também escreveria em seus bilhetes. Jason faz a mesma coisa que fazia quando ele os lia — ele cora. Percy sorri largo quando ele vê.

— E por “fazer alguma coisa” você quer dizer roubar meus sanduíches? — Jason pergunta, colocando a mão no bolso, acariciando o broche. — Tem certeza de que não eram os sanduíches que você queria?

— Eu estava tentando passar uma mensagem — Percy ri —, além disso, seus sanduíches são bons de verdade. Tenho que ser sincero, eu não achei que você fosse descobrir.

— Azul. É do que você gosta.

Percy sorri. — Seus olhos são azuis.

— O queijo também era.

— Eu reparei nos seus olhos primeiro.

— Claro que reparou.

Você nem lembrou do meu nome.

Você roubou meus sanduíches.

— Eles eram bons demais. Eu não pude resistir.

Jason levanta o queixo, vitorioso. — Então foi pela comida.

Percy para, e quando ele fala, sua voz está quieta. — Não pela comida — ele diz enfaticamente.

Jason hesita. Ele pisca — uma, duas vezes — e percebe que eles dois estão mais perto do que estavam há uns segundos. Os olhos de Percy tem manchinhas douradas de perto e os seus dentes da frente têm um espaço fofo entre eles. Ele consegue ver isso porque ele está sorrindo tão largo.

Leo estava certo mesmo. Ele gosta mesmo dos bonitinhos.

As palavras entalam em sua garganta, mas ele as força para fora. — Como? — ele pergunta. — A gente... você... — ele suspira. — Você nem me conhece.

Percy não parece afetado, como se ele tivesse esperado por isso. Jason supõe que ele considerou todos os piores cenários em sua mente, como Jason mesmo fez.

— Isso é verdade — ele concorda. — E você não me conhece. Mas eu gostaria que a gente se conhecesse. Muito.

Jason ergue as sobrancelhas. — Você gostaria de conhecer um cara que te deu laxante?

— Contanto que ele não me dê mais um — Percy sorri.

— Só quando você precisar de um.

— Por favor, não fale sobre eu cagando agora — Percy grunhe. — Eu estou tentando te impressionar aqui.

O coração de Jason dá um salto patético. — Mesmo? — ele sorri. — Eu nem percebi com todas as cartas e flores e comida e...

— Você está me provocando, Jason Grace? Depois de tudo que eu passei por você em nome do amor.

Isso pega o Jason de surpresa. Ele encara um Percy sorridente. — Amor? — A voz dele soa irritantemente rouca.

Ele consegue ver o momento em que Percy percebe o que acabou de falar, e ele fica definitivamente surpreso ao ver — pela primeiríssima vez — Percy Jackson corar. — Não amor-amor — Percy balbucia, — não, isso seria bizarro, né? Só, você sabe, uma queda. Uma quedinha. Não amor-amor.

— Uma quedinha — Jason repete.

— Exatamente — ele fala, as bochechas ainda vermelhas.

Jason não acha que Percy entenda, mas Jason entende. Seu coração está acelerado. —Você... tem uma quedinha por mim?

As bochechas de Percy ficam ainda mais coradas, e num instante, seus lábios também se repuxam em um sorriso. Seus olhos percorrem pelo rosto de Jason com tanta intensidade que Jason tem que suprimir a vontade de abaixar a cabeça.

Finalmente, ele fixa seus olhos nos de Jason e fala, com uma voz inesperadamente tímida: — Eu tenho uma quedinha por você.

E ele pensa em eu só quero segurar a mão dele e pensa em você é exatamente vinte e sete vezes mais fofo que elas e pensa em eu tenho uma quedinha por você, todas essas palavras, sentimentos e devaneios culminando nesse único momento, e mais tarde ele não vai se lembrar de quando ou como ele avançou, só de que ele avançou.

Os lábios dele são mais macios do que pareciam ser, as mãos dele são quentes nos braços de Jason, e ele tem cheiro do litoral quando Jason se encosta nele, sólido e forte e ali. Não é realmente um beijo, é só um encostar de lábios, mas quando Percy sorri durante, ele sabe que ele se sente tão inebriado e extraordinariamente feliz quanto Jason.

Eles se separam, mas nem tanto, seus rostos apenas a alguns centímetros de distância um do outro. Percy está sorrindo loucamente. — O que foi isso? — ele pergunta.

Jason dá de ombros despreocupadamente, seu sorriso firme no rosto. — Eu só queria provar meu sanduíche uma última vez, só isso.

Percy solta um som entre uma risada e um ronco. É tão adorável que o coração de Jason se aperta. — Aham.

— Sim. É o melhor sanduíche no mundo, sabe.

— Ah, eu não sei.

As sobrancelhas de Jason se levantam. — Você está dizendo que já comeu um melhor?

— Em uma lanchonetezinha bacana a dois quarteirões daqui — Percy inclina a cabeça. — Vem comigo?

Uma bolha dourada de alegria cresce no peito de Jason. Ela praticamente bloqueia as suas vias aéreas, e se passam alguns segundos antes que ele consiga responder.

— Claro — ele diz tão casualmente quanto pode. — Só pelos sanduíches, óbvio.

Percy ri e então faz a coisa mais fofa possível — ele se inclina para frente e esfrega seu nariz no de Jason. — Só pelos sanduíches.

~*~

Uma lista de coisas que Jason vem a aprender sobre Percy Jackson:

  1. Ele ficou duas horas no banheiro masculino do trabalho, e mais quatro no próprio banheiro, depois de comer o sanduíche recheado com laxativo de Jason.
  2. A primeira vez que ele viu Jason foi na verdade dois meses antes do aniversário do Nico, quando ele começou a trabalhar para a revista. Ele conta para Jason que foram os olhos dele que chamaram a sua atenção, mas é só semanas depois, no meio da noite, que ele sussurra para ele que na realidade foi a bunda de Jason que chamou sua atenção.
  3. Ele tem uma cadela chamada Srta. O’Leary e uma mãe chamada Sally. Ele nunca consegue decidir quem ele gosta de abraçar mais.
  4. Ele é um representante sênior — o equivalente do Nico em Publicidade, apesar do seu escritório ser maior. Em certos dias ele tem que ir para o trabalho de terno e gravata. Jason gosta desses dias.
  5. Ele leva o broche de piscadela com ele sempre que se sente triste, e geralmente o prende na roupa de Jason sempre que ele acha que Jason está triste. Quando ele rabisca, ele desenha piscadelas.
  6. Quando o primeiro artigo de Jason é publicado ele quer dar uma festa, até que Jason fala para ele que prefere passar a noite juntinho dele, assistindo Netflix. Percy não tem nada reclamações.
  7. Ele tem crises de riso nos momentos mais inapropriados durante filmes e quando fazem sexo, e Jason não sabe qual é pior.
  8. Piper chama ele de “melhor amigo” (para o desgosto de Leo), Hazel trata ele como um irmão mais velho (mas nem um pouco como ela trata o seu irmão mais velho de verdade) e Annabeth é a sua melhor amiga desde que eles eram crianças. Percy ainda não conta para Jason os seus segredos de negócios.
  9. Sua cor favorita é azul. Mais especificamente, “Azul-Jason”.
  10. Ele sente muita cócega sempre que Jason coloca suas mãos nele, mas nem um pouco quando coloca a boca nele.
  11. É um pesadelo dormir com ele. Ele chuta, rouba os lençóis, baba e ronca muito alto, mas ele fica abraçadinho a Jason como se sua vida dependesse disso e enche Jason de beijos logo que eles acordam, então Jason não pode reclamar.
  12. Ele encara Jason com olhos cheios de amor e carinho por horas, cora intensamente sempre que é flagrado, e então nega que toda a situação sequer aconteceu.
  13. Ele lê cada um dos artigos de Jason, mesmo que demore horas e o faça ter dor de cabeça por causa da sua dislexia.
  14. Ele guarda todos as cartas de Jason em uma grande ostra artificial. Jason mantém todos os bilhetes de Percy em um bauzinho de madeira. Eles memorizaram cada um deles.
  15. Ele ama dar presentes a Jason e ama receber também, contanto que Jason no fim das contas acabe usando ao invés dele. O que, como Jason já explicou para ele inúmeras vezes, é exatamente o oposto do propósito de um presente.
  16. Percy nunca deixa Jason esquecer que ele não sabia o seu nome enquanto ele sonhava com Jason. Nunca.
  17. A lasanha de Leo não é nada comparada à dele, mas ele ainda ama a velha receita de sanduíche. Ele diz que tem gosto de memórias. Jason não pode deixar de concordar.

~*~

Nico já está abrindo a porta do escritório, com os olhos fixos nos papéis na sua mão. — Percy — ele começa —, Reyna disse que você tem que ver isso e pensar numa boa—

— Nico!

Nico se assusta com o grito de Jason, levanta o olhar e congela, na esperança de que ele não esteja vendo o que ele acha que está vendo.

Jason e Percy o encaram da posição deles na mesa de Percy por alguns segundos, nenhum deles se movendo. E então Nico larga os papéis, tampa os olhos e corre para a porta.

— Nico, espera! — Percy grita, soando sem fôlego — é claro que estava, tendo em vista o que ele estava fazendo. — Não conta para a Reyna! Ela vai me matar!

— E deveria! — Nico se encosta na parede do lado de fora do escritório e esfrega os olhos. — Vocês dois são nojentos!

— Você e o Will fazem a mesma coisa o tempo todo! — Jason grita.

— Não com todos esses brinquedos! — Nico grita de volta.

Há uma pausa. Um sussurro, uma risadinha e então um “shh, shh”. Finalmente, Percy — com a voz cheia de malícia — diz: — Você gostaria?

Nico bate a porta enquanto eles gargalham, resmungando para si mesmo enquanto vai pisando forte até o elevador. Ele vai muito denunciar eles.