Chapter Text
Pem! Pem! Pem
O barulho de um alarme soando em algum lugar despertou Mark. Não era o seu alarme, não podia ser, pois se lembrava de ter desligado-o na noite anterior. Preso no limbo entre estar acordado e estar adormecido, tentou identificar de onde o barulho estava vindo. Poderia ser o alarme de Chenle, seu colega de casa, ou o do vizinho no apartamento ao lado.
O som parou e imediatamente deixou de ser problema dele. Seu plano era virar para o lado e voltar a dormir, mas sua bexiga o impediu. Mark levantou devagar, se acostumando com a sensação de estar acordado, e saiu do quarto em direção ao banheiro.
— Bom dia — ouviu Chenle dizer de algum lugar, mas ainda não estava acordado o suficiente para responder.
Saindo do banheiro, porém, seguiu até a sala de estar para cumprimentar o amigo. O encontrou sentado no chão da sala, olhando algo em seu computador.
— O que está fazendo?
— Comprando ingressos pro show da Olivia Rodrigo — Chenle respondeu, sem desviar o olhar da tela. — Quer também?
Mark considerou. O relógio na parede marcava oito horas e treze minutos, muito cedo para decidir se gostaria de ir ou não no show de uma artista que ele não era fã.
— Quando é? — ele perguntou, então.
— Faltam exatamente 21 dias.
— E só abriu agora a venda dos ingressos?
Chenle demorou um pouco para responder, algo na tela travando seu raciocínio, quando pareceu resolver, disse: — Esses artistas de hoje em dia…
E a conversa acabou aí. Mark seguiu para a cozinha, procurando algo que pudesse comer de café da manhã.
— Você foi na padaria?! — perguntou, um pouco mais alto para Chenle ouvir.
— Estava fechada hoje! — Chenle respondeu na mesma altura. — Algo sobre um problema na família, o bilhete dizia que vai abrir amanhã.
— Tá bom!
Todo o pão na casa deles já tinha acabado e, de repente, Mark estava com uma preguiça enorme de fazer qualquer coisa. Voltou para a sala e se jogou no sofá, tirando seu celular do bolso.
— Você não vai trabalhar hoje? — Chenle perguntou.
— Tô de folga — Mark respondeu. — Acho que vou passear por aí, quer ir também?
— Não, vou trabalhar.
Assim seguiu o resto da manhã de Mark, ele tomou um café que Chenle passou para eles, voltou para o sofá e ficou por lá até sentir fome no horário de almoço.
Os dias de Mark eram todos iguais, ele entrava no trabalho às 14h e voltava às 22h, suas manhãs nunca tinham emoções, exceto quando ia à academia ou se aventurava no pilates. Na maior parte de seu tempo livre, trabalhava em sua tese de pós-doutorado, estando bem perto de concluí-la. Sexta-feira era seu dia de folga, seu fim de semana sempre começava mais cedo, e por isso ele era muito grato. Não costumava sair durante suas folgas, mas naquele dia em específico decidiu que deveria visitar um museu.
E foi assim que ele se viu em um museu praticamente vazio sexta-feira à tarde. Era uma exposição sobre literatura infantil, o tema de seu mestrado, então ele estava muito feliz de poder revisitar todo o seu conhecimento para entender cada obra ali exposta. Mark diria para qualquer um que perguntasse que ele não era uma pessoa que costumava frequentar museus e exposições, mas quando o assunto o interessava, era sempre o primeiro da fila.
— Com licença — ouviu alguém atrás de si perguntar. — Você é o autor desse?
Ele estava parado na frente de um livro sobre amizade entre animais há mais tempo do que havia percebido.
— Ah, não — riu um pouquinho, virando-se para o homem atrás de si. — Só achei interessante.
O homem tinha a mesma altura que ele e a cor lilás no cabelo. Ele estava vestindo preto da cabeça aos pés, mas levava consigo um sorriso gentil.
— Eu também — o desconhecido disse, dando uma boa olhada no texto complementar ao livro. — Eu gosto dessas exposições de literatura.
— Eu também! — Mark se animou. — O que é estranho, já que é o meu trabalho.
— Exposições?
— Literatura.
— Oh! Você escreve?
Mark já estava pronto para ir embora antes daquela conversa começar, mas agora estava animado de poder falar das coisas que mais gostava.
— Só artigos científicos — Mark respondeu, rindo e descansando o peso do corpo em uma perna só. — Eu sou professor.
— Legal! Você deve entender mesmo dessas coisas. — O homem balançou a cabeça, como se de repente se lembrasse de algo. — Qual é o seu nome mesmo?
— Eu sou o Mark — estendeu a mão —, e você é…?
— Eu sou o Hae…
Antes que ele pudesse terminar, porém, ouviram alguém dizer: — Mark?
Ao olhar para o lado, sorriu vendo um rosto conhecido.
— Jaemin! — exclamou, já a envolvendo em um abraço. — O que está fazendo aqui?
— Esse é meu! — ela apontou para o livro que Mark olhava antes. — Não me diga que você não leu quem era a autora.
Mark voltou o olhar para o texto e se surpreendeu ao ler “Na Jaemin” ali, escrito em letras garrafais.
— Meu Deus! Foi você! Meu amigo… — Quando Mark virou para apontar para o desconhecido que procurava o autor do livro, ele já não estava mais lá. — Ué.
— O que foi?
— Não, é que tinha um cara — Mark olhou ao redor, mas não o encontrou. — Deixa pra lá, devo estar com sono, tá livre pra ir tomar um café agora?
— Claro!
Adorava Jaemin. Ela também era professora na universidade onde lecionava e ele a considerava uma de suas melhores amigas, gostava dela o suficiente para não se sentir incomodado ao encontrar uma colega de trabalho no seu dia de folga. Ele podia considerar até que ela fazia parte de sua rotina, eles lecionam disciplinas complementares, dividem uma sala no instituto e sempre fazem o possível para ministrarem suas aulas o mais perto um do outro.
Jaemin era a pessoa mais perto de conforto que Mark tinha.
Exceto quando ela perguntava sobre sua vida amorosa.
— Já falei que não estou interessado nisso.
— Ah, qual é — Jaemin choramingou, deixando seu café na mesa. — Não tem ninguém? Nem uma boa moça interessada em se casar com você?
— Não — respondeu, sem elaborar mais, embora quisesse fazer muitos comentários.
— Um bom moço?
— Jaemin! — repreendeu. — Não tem ninguém.
— Hm… — ela cruzou os braços, parecendo pensativa. — Quando foi a última vez que você namorou, hein?
— Não faz muito tempo.
— Mentiroso! — Jaemin acusou. — Eu lembro exatamente quem foi porque você ficou todo xoxo quando ele foi embora.
Na mesa ao lado deles, uma criança que não devia ter mais que três anos derramou toda sua água na mesa e no chão, molhando um pouco o sapato de Mark. Ele nem se importou.
— Para, esse é um tópico sensível. — Mark suspirou, respondendo a amiga. — É, o Jeno foi meu último namorado, mas depois dele eu fiquei com outras pessoas.
— Você tem vinte e oito, Mark, o seu tempo de “ficar” já passou.
— Por que você disse isso como se vinte e oito fosse a média de expectativa de vida?! — ele perguntou, ofendido.
Jaemin riu e explicou: — Eu quero dizer que já passou da hora de você arrumar alguém para casar.
— Para de falar como se eu estivesse no fim da minha vida! — ele pediu. — Você é só um ano mais nova que eu!
Mark odiava aquele tópico, principalmente porque ele sempre acabava em Jeno. Ele não sentia mais falta de Jeno, não, já fazia três anos desde o término.
— Eu só tô dizendo.
— E você, hein? — Ele devolveu, na defensiva. — Quando você vai casar?
Jaemin olhou para ele com a sobrancelha arqueada, levou uma mão até o queixo como se estivesse pensando e Mark finalmente viu o anel brilhando no anelar esquerdo dela.
— Ele te pediu em casamento?! — perguntou, em um tom mais alto do que deveria.
O sorriso que Jaemin abriu, iluminaria uma cidade inteira.
— Alguns dias atrás — ela confirmou. — Estamos esperando um tempo para poder contar para as pessoas, mas já que você perguntou…
— Isso é ótimo, Jaem, parabéns! — Mark se levantou para abraçar a amiga.
— Obrigada, eu tô muito feliz. — Ela nem precisava ter dito, estava estampado em seu rosto.
Mark fez uma nota mental para lembrar de dar muitos socos em Chenle por não ter contado nada disso a ele. Ao voltar para seu lugar, percebeu que provavelmente estava gritando, pois muitos outros clientes do local estavam encarando-o.
— Eles odeiam ver uma mulher trans bisexual asiática vencendo — murmurou, arrancando uma risada bem alta de Jaemin.
— Você é muito besta.
E o resto da tarde seguiu assim, Jaemin contando todos seus planos para o casamento e se esquecendo completamente da vida amorosa de Mark. Ele tinha planos de visitar seu restaurante favorito e de assistir um filme no cinema, mas apreciava muito mais a companhia de Jaemin do que qualquer uma dessas coisas. Ele só tinha a agradecer.
[²]
Pem! Pem! Pem!
Mark acordou desnorteado, o mesmo alarme do dia anterior estava tocando novamente, ele só esperava que não fosse no mesmo horário. Então, como no dia anterior, o alarme parou sem que ele precisasse fazer nada a respeito, respirou aliviado. Poderia virar para o lado e voltar a dormir.
E foi o que fez.
Não sabia quanto tempo havia passado quando acordou de novo, se levantou devagar com a intenção de ir ao banheiro, mas parou ao ver Chenle calçando os sapatos perto da porta.
— Tá indo aonde? — perguntou, confuso.
— Trabalhar — Chenle respondeu, como se fosse óbvio. — Você não vai?
— Eu não trabalho hoje.
— Eu já estou atrasado, então vou indo — Chenle falou, se levantando. — Hein, você por acaso não quer ir no show da…
Mark parou de prestar atenção. Tentou se lembrar se Chenle já havia ido trabalhar no sábado alguma vez em sua vida, mas não tinha memória desse acontecimento. Antes que pudesse perguntar a respeito, porém, Chenle saiu de casa.
— Droga — Mark xingou baixinho. — Nem consegui falar com ele sobre o noivado.
Foi até a cozinha, mas não tinha pão, Chenle deve ter se esquecido de ir até a padaria, tomando essa como uma tarefa sua, trocou de roupa e saiu de casa em direção ao estabelecimento. Estava um dia lindo do lado de fora, tão lindo quanto o dia anterior, Mark se sentiu feliz por ter o privilégio de ter dias lindos uns seguidos dos outros.
Seu dia lindo ficou menos lindo quando parou na porta da padaria e leu o bilhete preso nela:
“Estamos fechados por problemas na família. Retornaremos às nossas atividades amanhã (13/04)”.
— Mas hoje é dia 13. — Mark murmurou para si mesmo.
Uma mensagem de texto em seu celular chamou sua atenção.
Jaemin: Ei, tá ocupado hoje?
Você: Nope, por que?
Jaemin: Tô expondo um livro meu aqui no Centro Cultural, vem ver.
Você: Outro???
Jaemin: Como assim “outro”?
Você: Ué, fui ontem ver essa exposição
Jaemin: Não, ela abriu hoje.
Você: Tá maluca, Jaemin? A gente até foi tomar café depois
Jaemin: Quem tá maluco é você, ontem a gente deu Sintaxe Gerativa juntos até às dez da noite.
Você: Pera aí.
Mark saiu do aplicativo de mensagens e olhou bem para a data que seu celular marcava. Sexta-feira 12/04. Ontem.
Você: Foi mal, acho que sonhei então. Vou sim, que horas te encontro?
[...]
Só podia ser sonho. Cara a cara com o livro infantil “A Zebra e o Leão”, Mark considerou a possibilidade de estar preso dentro de um sonho muito maluco.
— Mark!
— Eu já vi esse livro antes — ele disse, sem nem cumprimentar a amiga.
— O quê?
— Eu estive aqui ontem e vi esse livro.
Jaemin franziu o cenho e disse: — Impossível, ele só chegou aqui hoje.
— Sendo assim, estou tendo o caso mais severo de déjà vu da história.
— Olivia Rodrigo tem uma música assim.
— O quê?! — Mark riu, nervoso. — Jaemin, eu tô falando que já vivi hoje antes!
A expressão confusa continuou no rosto de Jaemin, ela não sabia o que dizer. Mark se compadeceu da sua dor e mudou de assunto:
— O que vai fazer depois daqui?
— Não sei ainda, estava pensando em ir jantar, mas você parece precisar de algo mais forte — ela analisou. — Quer ir tomar um café?
Mark pensou em responder “de novo?”, mas já não tinha certeza se isso tinha acontecido mesmo ou não. Concordou com a cabeça.
Estava apático. Observou, muito confuso, Jaemin pedir um caramel iced latte como o que pediu no dia anterior, escolher a mesma mesa, se sentar no mesmo lugar e começar o mesmo assunto. As respostas de Mark saíram no automático, ele não estava conseguindo se concentrar o suficiente para perguntar o que porra estava acontecendo ali.
— … ficou todo xoxo quando ele foi embora.
A esse ponto, Mark já tinha abraçado a ideia de que estava maluco. Tinha certeza absoluta que esse exato diálogo tinha acontecido no dia anterior, mas Jaemin parecia não se lembrar.
— Olha…
Na mesa ao lado deles, uma criança que não devia ter mais que três anos derramou toda sua água na mesa e no chão, molhando um pouco o sapato de Mark. Ele olhou para a criança como se ela fosse alienígena.
— O que foi? — Jaemin perguntou.
— É impossível você não se lembrar que isso aconteceu ontem — declarou, exasperado.
— Mark, ontem a gente deu aula o dia inteiro.
— Isso foi quinta!
— Sim, ontem, quinta-feira — Jaemin estava olhando para ele de um jeito estranho, falando devagar como se ele não conseguisse entender.
Piscando algumas vezes, Mark deu uma olhada ao redor. Não podia afirmar com certeza, mas achava que já havia visto todas aquelas pessoas, ontem, naquele mesmo lugar.
— A gente veio aqui ontem — ele insistiu. — Você me contou que está noiva.
Por instinto, a mão direita de Jaemin cobriu a aliança na mão esquerda e ela assumiu uma expressão chocada.
— O Chenle te contou?
— Não! — Mark exclamou. — Você me contou! Me contou ontem!
Ela balançou a cabeça em negação, como se não fizesse a menor ideia do que Mark estava falando. Exasperado, ele se levantou.
— Eu vou embora. Vou dormir e amanhã nada disso vai ser real.
E foi embora antes que Jaemin pudesse impedir.
[³]
Pem! Pem! Pem!
Mark não sabia se havia acordado ou se nem sequer estava dormindo. Não conseguiu descansar direito pensando no que havia acontecido — ou não — no dia anterior. Passou a noite toda pensando que finalmente havia perdido tudo e agora estava maluco.
O alarme parou sozinho. Ele ainda não sabia de quem era esse alarme, mas não estava com cabeça para voltar a dormir, então apenas se levantou e saiu do quarto.
— Bom dia — ouviu Chenle dizer de algum lugar, mas não estava prestando atenção o suficiente para responder.
Entrou no banheiro e encarou o próprio reflexo no espelho. Suas olheiras estavam bem profundas, fruto de um fenômeno que ele chamava de Metade do Semestre, não tinha muito que ele pudesse fazer sobre isso.
Saindo do banheiro, seguiu até a sala de estar para conversar com o amigo. O encontrou sentado no chão da sala, olhando algo em seu computador.
— O que está fazendo?
— Comprando ingressos pro show da Olivia Rodrigo — Chenle respondeu, sem desviar o olhar da tela. — Quer também?
Mark travou no lugar. Olhou para o relógio na parede: oito e treze da manhã. Impossível. Isso não podia acontecer com ele, não de novo.
— Você já não tinha comprado? — optou por perguntar, seguindo um caminho seguro.
— Nope, abriu hoje — Chenle sorriu. — Estou comprando para mim e pra Nana.
— Ah, que bom que você tocou no assunto! — Mark se animou. — Parabéns pelo noivado.
Chenle olhou para ele por alguns segundos, uma expressão indecifrável em seu rosto. Voltou sua atenção para a tela e disse: — Obrigado, não sabia que ela tinha te contado.
— Ela me contou ontem. — Ou antes de ontem, ele não sabia mais.
— Ela te contou sobre o noivado no trabalho? — ele perguntou. — Estranho, ela disse que ia te levar no restaurante favorito de vocês pra contar.
Não.
Mark pensou. Considerou. Perguntou: — Você foi na padaria hoje?
— Estava fechada — Chenle respondeu. — Algo sobre um problema na família, o bilhete dizia que vai abrir amanhã.
— Chenle, que dia é hoje?
Chenle demorou a responder, algo na tela do computador travando seu raciocínio, quando pareceu resolver, disse: — Sexta.
— Tem certeza?
— Absoluta, tenho que ir trabalhar daqui a pouco. — Chenle comentou. — Você não vai?
O dia de Mark acabou ali. Desligou seu celular e se trancou no quarto, se recusando a sair. Lidaria com as consequências disso depois.
[⁴]
Pem! Pem! Pem!
No quarto dia doze de abril daquele ano, Mark decidiu que faria tudo igual à primeira vez. Foi ao banheiro, conversou sobre Olivia Rodrigo com Chenle e foi para a cozinha.
Fez perguntas sobre a padaria e ouviu a mesma resposta de antes: Fechada por problemas familiares. Ok, estava esperando isso.
Não fez nada até o horário de almoço quando seguiu para o Centro Cultural. Olhou as obras expostas e esperou pacientemente Jaemin aparecer, ela apareceu, eles foram para o café.
Iced caramel latte. Sua vida amorosa. Água no seu sapato. Casamento.
Tudo exatamente como na primeira vez, nada mudou, ainda era sexta-feira doze de abril.
[⁵]
Pem! Pem! Pem!
Tinha um pássaro na janela de Mark. Um que ele viu no primeiro, no terceiro e no quarto dia e estava vendo de novo agora. Nos outros dias não viu porque não olhou para janela ao acordar. Se tentasse, conseguiria ouvir o barulho característico de Chenle saindo do banheiro e indo para a sala de estar ligar seu computador, os ingressos para o show da Olivia Rodrigo começariam a ser vendidos em breve. Do lado de fora, uma sirene, provavelmente da polícia, soou rapidamente como se a viatura estivesse em alta velocidade. Mark suspirou. Doze de Abril.
Estava ficando maluco. Não tinha nem ideia de como sair dessa situação, não sabia nem pra quem pedir ajuda, já tinha cogitado todas as ideias mais extremas, então, se levantou e escolheu caos. Encontrou Chenle na sala de estar, como sempre, e olhou para ele por três segundos antes de dizer:
— A Jaemin tá muito brava com você, ela me falou que quer terminar.
E foi ao banheiro sem mais explicações. Tomou banho, trocou de roupa, entrou no carro e foi até o Centro Cultural. Um vira-lata passou na frente de seu carro, um motorista bêbado quase bateu no poste de luz, uma criança tropeçou na rua e foi segurada pela mãe. Tudo igual ao primeiro dia.
A única parte boa daquele arranjo era que ele podia ver com mais calma cada obra na exposição sem ficar o dia inteiro perambulando por lá. Estava vendo um livro sobre boas maneiras quando, de canto de olho, viu uma sombra passar por ele, quando olhou melhor, viu que era Jaemin.
— Amiga!
Jaemin, que estava prestes a ir embora, pareceu chocada ao vê-lo lá, óbvio, ele não havia olhado o celular, logo, não respondeu às mensagens dela e não tinha como ela saber que ele estava lá, assim como no primeiro dia. Mark decidiu não pensar muito sobre isso, não era a primeira vez que fazia algo diferente.
— Oi! — Jaemin cumprimentou, sorrindo. — Você falou pro Chenle que eu quero terminar com ele?
Ele se segurou para não rir, colocou sua expressão mais surpresa no rosto e disse: — Não! Ele me disse que queria terminar com você e estava procurando uma desculpa.
— Ele ficou maluco?! — Jaemin exclamou.
Mark sorriu satisfeito e começou a guiar a amiga em direção ao café, no caminho para fora do Centro, ele disse “Essa é só amanhã” junto com o guarda do evento, arrancando um olhar confuso de Jaemin para ele, ele fez um sinal para ela deixar para lá e continuar falando. Eles entraram no café junto com a menina de cabelo rosa e o cara do café preto, como sempre. Sentaram-se na mesma mesa e Mark nem se incomodou em dizer — pelo que parecia ser a milésima vez — que não estava interessado em ninguém romanticamente.
Quando a criança derramou a água, Mark já tinha tirado suas pernas do caminho e, quando Jaemin anunciou alegremente seu noivado, Mark percebeu que viver o dia doze de abril estava se tornando rotina.
É isso que não pode acontecer.
[⁶]
Pem! Pem! Pem!
Mark acordou e imediatamente olhou a tela do seu celular. Sexta-feira, doze de abril, oito da manhã.
Ah. Que bom.
— Bom dia! — Chenle disse, quando ele saiu do quarto.
— Bom dia é o caralho — foi tudo que respondeu antes de entrar no banheiro.
Seu reflexo no espelho era o mesmo do dia anterior, suas olheiras profundas e os fios de cabelo no mesmo lugar. Mark suspirou cansado, já era a quinta vez que vivia o dia doze de abril.
— Pelo menos é o meu dia de folga — disse para si mesmo. — Imagina estar vivendo essa merda e ainda ter que ir trabalhar.
Com esse pensamento, saiu do banheiro e encontrou Chenle na sala, na mesma posição que o encontrou nos últimos dias.
— Show da Olivia Rodrigo? — perguntou, a voz bem cansada.
— Sim! — Chenle respondeu. — Quer ir também?
— Não.
E seguiu para a cozinha, pensando no que faria. Pelo que conseguiu coletar, podia fazer o que quisesse, não precisava seguir um roteiro. Podia encontrar Jaemin no Centro Cultural, podia ficar em casa, podia acordar na hora que quisesse, não importava. No dia seguinte acordaria e seria sexta-feira doze de abril novamente.
Estava preso em um loop temporal. Não sabia como e nem porquê, apenas estava preso.
— Chenle — chamou, saindo da cozinha. — Deixa eu te fazer uma pergunta.
— Hm?
Respirou fundo, pensando em como faria isso. — Você já assistiu “Feitiço do Tempo”?
Seu amigo nem se preocupou em olhar para ele, a atenção focada no computador, rebateu: — Aquele filme com o Bill Murray?
— Sim.
— Já vi, mas faz tempo.
Mark mordeu o lábio inferior, hesitando, mesmo assim perguntou: — O que você faria se estivesse naquela situação?
— Em um loop temporal?
— Aham.
— Hm. — Chenle pensou no assunto. — Eu pediria ajuda pro Jisung.
— Park Jisung? — Mark franziu o cenho.
— É, ele tá fazendo um projeto em física quântica com foco no tempo-espaço — Chenle contou, orgulhoso do melhor amigo. — Talvez ele não pudesse resolver, mas poderia ajudar com certeza.
— Papo reto…
Sem mais perguntas a serem feitas, Mark voltou ao seu quarto e pegou o celular, enviando uma mensagem de texto para Jaemin.
Você: Quer ir na casa do Jisung comigo hoje?
Jaemin: Por que nós iríamos na casa do melhor amigo do seu ex?
Você: Porque ele também é melhor amigo do seu atual.
Jaemin: E dai?
Você: Seria muito engraçado se você contasse pra ele sobre o noivado antes do Chenle.
Jaemin: O CHENLE TE CONTOU SOBRE O NOIVADO?
Você: Te explico tudo quando a gente se encontrar
Jaemin: Te vejo lá.
Batidas na porta o fizeram largar o celular assustado, nem precisou se levantar para abrir a porta, pois Chenle não esperou ser convidado.
— Como você sabe sobre o noivado?
Já esperando aquela pergunta, Mark deu de ombros e respondeu: — Adivinhei.
[...]
Eles estavam esperando que Jisung não fosse entender bem o que estavam fazendo na casa dele, logo, não se surpreenderam quando ele não os deixou entrar de primeira.
— A gente precisa conversar — Mark explicou. — Tanto eu quanto ela temos coisas pra te contar.
Jisung olhou para ele, olhou para Jaemin e seu olhar imediatamente desceu até a aliança no dedo dela. Óbvio que Jisung já sabia, era o melhor amigo.
— Entrem — ele permitiu, dando espaço para os dois entrarem. — Aceitam uma água?
— Não, obrigada — Mark e Jaemin disseram em uníssono.
Jisung pediu para que eles se acomodassem no sofá e fez o mesmo, sentando-se em uma poltrona ao lado.
— O que os traz aqui?
— Eu tenho que te contar! — Jaemin exclamou, já animada.
— Você está grávida? — Jisung tentou adivinhar.
Mark soprou uma risada e Jaemin semi-cerrou os olhos, indignada.
— É fisicamente impossível, mas foi um bom palpite — ela disse e levantou a mão esquerda. — Ele me pediu em casamento!
O sorriso de Jisung acompanhou o de Jaemin e ele logo a envolveu em um abraço de parabéns, desejando coisas boas para ela enquanto o fazia. Após o momento de felicitação, ambos voltaram a se sentar.
— E você, Mark? Também vai casar? — Jisung perguntou.
Ignorando o jeito que Jaemin murmurou “quem dera”, Mark se ajeitou no sofá e começou: — Posso te contar uma história maluca?
— Sempre.
— Cinco dias atrás eu acordei no meu dia de folga, conversei com o Chenle, fui em uma exposição de arte, encontrei a Jaemin e fomos tomar café para ela me contar sobre o noivado. — Mark disse e Jaemin abriu a boca para protestar, mas foi interrompida quando ele continuou: — No dia seguinte eu acordei, conversei com o Chenle, recebi mensagens da Jaemin me convidando para a mesma exposição que eu fui no dia anterior e quando eu chequei a data no relógio, era sexta-feira doze de abril, meu dia de folga.
Ele deu um tempo para Jaemin e Jisung conferirem a data do dia em seus telefones, mas não abriu espaço para perguntas, continuou:
— Tudo estava igual ao dia anterior. As pessoas, os diálogos, os locais. Igual — A cada palavra, Jisung parecia se interessar mais pela história. — No dia seguinte, quando acordei e olhei a data no meu celular, era sexta-feira doze de abril de novo. E de novo no dia seguinte. E de novo. E já faz uma semana que eu acordo de manhã e é sexta-feira dia doze de abril.
Jisung contemplou a história por alguns segundos: — Você está me dizendo que…
— Eu acho que estou preso em um loop temporal — confessou, se sentindo maluco de proferir as palavras em voz alta. — E eu não sei como sair.
Silêncio. Mark deixou Jisung e Jaemin processarem o que ele havia acabado de dizer.
— Ok — Jisung declarou. — Vem comigo.
Não esperou respostas antes de se levantar e sumir dentro da própria casa, Mark e Jaemin não tiveram escolha além de seguirem ele escada abaixo até o porão.
— Considerando que eu sou o seu Dr. Brown, eu preciso primeiro saber como exatamente isso está acontecendo — Jisung disse, procurando algo entre suas coisas.
— Doutor…?
— De volta para o futuro — Jaemin explicou e Mark concordou com a cabeça, ela sorriu, feliz por ser útil.
O porão de Jisung parecia mesmo ter saído de uma ficção científica. Caixas, máquinas, telas e tudo que Mark sempre imaginou que um cientista teria. Quando conheceu Jisung, anos atrás, já sabia que, se tivesse uma emergência científica, era ele quem deveria procurar, óbvio que ele nunca imaginou que o dia chegaria, mas agora estava agradecendo aos céus por ter colocado ele em seu caminho.
— Achei! — Jisung exclamou, tirando algo de uma das caixas.
— O que é isso? — Jaemin perguntou, curiosa.
— Isso aqui vai me dizer há quanto tempo exatamente o Mark está preso nesse loop.
— Como?
— Eu poderia te explicar — Jisung disse, se aproximando. — Mas, com todo respeito, duvido que você vá entender.
Mark não discordou, nunca foi um cara da física. Obedeceu quando Jisung pediu para que ele se sentasse e ficou meio nervoso quando ele configurou o aparelho e apontou para si, murmurando “hm” enquanto olhava para a tela. Jaemin, que sem dúvida alguma não estava entendendo nada, o acompanhou.
— Mais ou menos 100 horas atrás as suas, hm, partículas de tempo ficaram confusas e pararam de se renovar — Jisung tentou explicar da melhor forma possível, mesmo todos na sala sabendo que não era isso que tinha acontecido.
— O que isso quer dizer? — Mark perguntou.
— Quer dizer que alguma coisa que aconteceu entre às duas e cinco da tarde foi o gatilho dessa situação — respondeu, olhando para o relógio. — O que você percebe de comum em todos os dias?
— Hm… Excluindo o dia em que eu me recusei a sair de casa, a Jaemin estava em todos eles — sua amiga sorriu ao ser mencionada —, e ela está sempre vestindo a mesma roupa. O Chenle compra ingressos para o show da Olivia Rodrigo, a padaria está fechada. Se vamos a um café, uma criança derrama água no meu sapato e Jaemin me conta sobre o noivado. Em três ocasiões, incluindo a primeira vez, fui ver a exposição dela no Centro Cultural.
— Como você sabe que estou expondo lá?
— Jaem — Mark suspirou. — Não é a minha primeira vez vivendo hoje.
— Ah é.
— Interessante — Jisung murmurou. — Nada parece ser o fator em comum de todos os dias.
— Todos os dias de manhã um alarme que eu não sei quem é o dono toca por 15 segundos e depois para — Mark lembrou. — É isso que me acorda todos os dias.
— Você já tinha escutado esse alarme antes?
— Não.
— Hm.
— É o único fator em comum porque, depois disso, cada dia eu fiz uma coisa diferente — concluiu. — Só pra testar.
— E quando você frequentou o mesmo lugar mais de uma vez, as pessoas eram as mesmas?
— Sim. Se nós formos agora no café, vamos encontrar a criança da água, uma adolescente de cabelo rosa, um homem de terno pedindo um café preto e um casal terminando o namoro perto da janela.
Não era difícil perceber que Jisung estava tentando conter um sorriso, claramente fascinado com aquela história toda, Mark não podia culpá-lo, aquela era uma situação saída direta dos piores delírios do realismo fantástico, ele mal via a hora de escrever sobre isso e conseguia ver nos olhos de Jaemin que ela estava pensando o mesmo.
— Eu quero fazer uma pergunta burra, mas você não pode rir e nem me olhar como se a pergunta fosse burra — Mark disse, já envergonhado.
— Como é aquilo que vocês professores dizem? “Nenhuma pergunta é burra”?
Jaemin riu daquilo, Mark revirou os olhos.
— Quando eu assisti aquele filme, o protagonista tinha que mudar suas atitudes para sair do loop — começou, a voz diminuindo à medida em que ficava mais envergonhado. — Existe a possibilidade de eu ter que fazer isso também?
Jisung ponderou. Ele não tinha muita informação sobre o que estava acontecendo, então não sabia como resolver o problema de Mark, não descartaria nenhuma opção.
— Depende. Você é uma pessoa ruim?
Muito ofendido, Mark respondeu: — Eu não.
— Às vezes tinha algo que você precisava fazer da primeira vez e não fez — Jaemin sugeriu, de onde estava sentada. — E agora o dia está se repetindo até você fazer.
— Isso… meio que faz sentido — Jisung concedeu.
— Meio?
— Não exatamente, porque… — Jisung fez uma pausa, tentando encontrar as palavras para explicar.
Jaemin suspirou: — Só diz logo.
— Tá, acompanhem o raciocínio. O Mark pode fazer o que ele quiser, certo? — Os outros dois concordaram com a cabeça, ele continuou: — O equilíbrio do universo está preparado para qualquer coisa que ele decidir fazer, tudo que ele não fizer com a intenção de arruinar o mundo, pode ser feito. E, penso eu, que você não estava secretamente planejando romper o fio do espaço-tempo.
— Nope.
— Então, imaginem que o universo estava preparado pro Mark… Sei lá, vestir uma camisa verde no dia doze de abril, mas ele não fez isso. Não seria o suficiente para brincar com o tempo porque o universo também estava preparado para qualquer outra cor que ele decidisse vestir, até se ele quisesse sair pelado na rua, seria problema só dele. — Jisung fez outra pausa, para ver se os amigos estavam acompanhando.
— Então não tem como ter sido algo que eu não fiz? — Mark indagou.
A expressão no rosto de Jisung dizia “não exatamente”, mas ele se contentou em dizer: — Imagine que você devia vestir a camisa verde, mas uma voz do além mandou você não vestir e você obedeceu. Digamos que vestir a camisa verde era crucial para a descoberta da cura do câncer, mas você não fez por causa da voz misteriosa.
— Uma voz que não estava em equilíbrio com o universo? — perguntou Jaemin.
— Isso! Uma voz, que não deveria estar lá, impediu a descoberta da cura do câncer — Jisung concluiu. — Sendo assim, faria sentido você ter que viver o dia de novo e de novo até vestir uma camisa verde.
Mark piscou algumas vezes, processando, disse: — Então, algo que não era pra ter acontecido comigo, aconteceu, e agora eu preciso viver esse dia de novo e de novo até deixar de acontecer?
— Não! — Jaemin exclamou. — Algo que não devia acontecer te impediu de fazer algo, agora você precisa viver esse dia de novo até você fazer essa coisa.
— Mas o que é?!
— Eu sei lá!
Os três se encararam por um tempo, ninguém sabendo o que dizer em seguida. A solução para o problema de Mark podia ser qualquer coisa e eles não tinham tempo o suficiente para brainstorming.
— Volte aqui amanhã — Jisung pediu. — Bate aqui em casa, me diz tudo que eu acabei de te dizer e diz que precisamos pensar em uma solução.
— Você vai acreditar em mim?
— Eu acreditei hoje, né?
Bom. Sim. Mark nem tinha percebido que Jisung e Jaemin aceitaram sua história com tamanha facilidade, era muito grato por ter amigos e principalmente amigos que nunca foram céticos sobre nada.
[⁷]
Pem! Pem! Pem!
O suspiro frustrado que Mark soltou ao acordar deve ter sido ouvido por todos no prédio em que morava. Não deu tempo ao azar, porém, se levantou rápido, era um homem em missão. Ouviu o bom dia de Chenle enquanto seguia até o banheiro e conferiu a data em seu celular só para garantir. É. Doze de abril. Pela sétima vez.
Naquela manhã, não ficou para conversar com Chenle sobre Olivia Rodrigo, trocou de roupa — e vestiu uma camisa verde, só por precaução —, pegou as chaves do seu carro e começou seu caminho até a casa de Jaemin, se desse sorte, a encontraria antes dela sair de casa. Àquela altura, Jaemin era seu apoio emocional, não conseguiria enfrentar isso sem ela, mesmo que ela ainda não soubesse o que estava acontecendo.
No caminho, Mark parou no sinal vermelho e olhou para fora da janela. Estava parado na frente de um hospital, um bem chique que seu plano de saúde não cobria, Mark odiava hospitais, o lembravam ele. Um homem de jaleco apareceu atrás das portas de vidro do hospital, um homem que despertava certa familiaridade em Mark, mas estava sem óculos, então não conseguiu ver quem era. Melhor assim, não queria lidar com a inevitável descoberta de que pensava tanto em Jeno que estava começando a ver seu rosto em outras pessoas.
O sinal abriu, Mark acelerou.
Quando chegou à casa de Jaemin, teve a sorte de encontrá-la trancando a porta atrás de si, pronta para começar seu dia.
— Entra no carro! — Mark ordenou, assustando-a levemente.
— Mark? O que está fazendo aqui?
— Entra no carro, Jaemin!
— Mas eu tenho que…
— Vem logo, eu te explico tudo no caminho.
E, por isso, Jaemin era sua amiga favorita, ela só inclinou a cabeça para o lado um pouco, em óbvio sinal de confusão, antes de dar de ombros e entrar no veículo, jogando sua bolsa no banco de trás e se acomodando no banco do passageiro.
— Para onde vamos?
[...]
Ao abrir a porta e ver quem estava do outro lado, Jisung checou o relógio no pulso: oito e quarenta e sete da manhã, com a voz embargada de sono, tentou: — Bom d…
— Jaemin tá noiva e eu tô preso em um loop temporal — Mark interrompeu, indo direto ao assunto.
— Como você sabe que eu estou noiva? — Jaemin murmurou.
— Vamos pro seu porão para você conferir como o tempo está me afetando, ou algo assim, e eu explico tudo do início.
Dito e feito. Em uma releitura quase perfeita do dia anterior, Jisung usou aquele dispositivo em Mark e, quando estava convencido, ouviu Mark explicar tudo que ele próprio havia dito. Jisung fez algumas perguntas e respondeu outras de Jaemin, mas ao final da história o objetivo deles era claro: descobrir o que Mark precisava fazer para sair dessa situação.
— Você tinha algo importante para fazer no primeiro dia e não fez? — Jaemin sugeriu.
— Não, eu já até terminei de corrigir minhas provas — Mark respondeu, olhando para o chá gelado em seu copo.
— Você ia encontrar alguém? — perguntou Jisung.
— Também não.
Frustrados era pouco para descrever o estado dos três naquele momento. Nada que sugerissem parecia certo, até onde eles sabiam, era a primeira vez na história que alguém precisava lidar com aquilo.
— Você tá cansado? — Jisung perguntou, de repente.
— Muito — Mark respondeu, sincero. — No dia cinco eu inventei que o Chenle estava traindo a Jaemin.
— Você o quê?! — Jaemin exclamou, chocada.
— Foi engraçado por um tempo, mas quando eu percebi que no dia seguinte ninguém lembraria disso, fiquei triste.
Jisung murmurou: — É melhor que ninguém lembre. — Ao mesmo tempo em que Jaemin gritava: — Você estava brincando com meu relacionamento?
— Foi uma ideia melhor do que o que eu tinha planejado para aquele dia.
— E o que era?
Silêncio. O rosto de Mark assumiu uma coloração avermelhada, envergonhado com o tanto que aquela situação estava o afetando.
— Você ia se matar? — Jisung perguntou, como se estivesse lendo sua mente.
— O quê? — Foi Jaemin quem reagiu, parecendo ofendida por Mark.
— É comum em retratação desse tipo de fenômeno — Jisung disse, dando de ombros. — A pessoa afetada começa a pensar em soluções extremas para acabar com o loop.
Com uma voz baixa, como se algum jeito Jaemin não fosse ouvir, Mark disse: — Eu queria saber se ia acordar no mesmo dia como se nada tivesse acontecido.
O sermão que levou de Jaemin — e Jisung por consequência? — foi o suficiente para Mark nunca mais tocar no assunto.
[⁸]
Pem! Pem! Pem!
Quando o alarme soou naquela manhã, Mark nem se mexeu. Não tinha nenhum plano para aquele dia, ia fazer tudo no automático, por isso, se viu na porta da casa de Park Jisung às duas da tarde.
— Mark? O que você quer?
— Vem que eu te mostro.
E, assim, acabou dentro de seu próprio carro, narrando para Jisung tudo que ia acontecer no caminho com três segundos de antecedência.
— Cachorro — disse e esperou o cachorro passar, antes de seguir. — Bêbado no poste.
O barulho do carro freiando antes de bater chamou a atenção de Jisung que olhou pela janela, assustado.
— E… criança tropeçando na calçada — suspirou. — Na sua esquerda.
Jisung olhou bem a tempo de ver a criança segundo segurada pela mãe para não cair.
— Mark, o que está acontecendo?
— Espera, vai ficar divertido.
Ele estacionou na mesma vaga de sempre no Centro Cultural, mas não desceu do carro, Jisung também não.
— Aquele cara vai deixar o chapéu cair. — Apontou. — E aquela mulher perdeu as chaves do carro.
Aos poucos, Jisung começou a acompanhar, mesmo ainda achando aquilo loucura. Ele viu Jaemin do lado de fora com o celular na mão, Mark checou as horas no relógio e entregou o próprio celular na mão de Jisung.
— “Ei, tá ocupado hoje?” — Mark recitou, meio segundo antes da mensagem chegar em seu celular. — “Estou expondo um livro meu aqui no Centro Cultural, vem ver”.
Jisung franziu o cenho ao ver que Mark havia recitado perfeitamente as mensagens, ele abriu a boca para fazer perguntas, mas Mark deu partida no carro e saiu de lá.
— Para onde vamos agora?
— Você vai ver.
Jisung reconheceu o caminho de volta para a sua casa, mas Mark não chegou até lá, parou no sinal vermelho em frente a praça e apontou:
— Cachorro mordendo a criança. — Esperou acontecer, antes de apontar para o outro lado e dizer: — Mulher de vestido laranja horroroso.
Quando uma mulher desceu de um carro vestindo um vestido laranja bem feio, Jisung deixou o queixo cair em surpresa.
— Mark…
— Ainda não acabei.
O caminho até o café favorito de Mark foi silencioso, ele não tinha mais o que dizer e Jisung não estava conseguindo formular as perguntas que gostaria. Eles pararam na frente do estabelecimento e, dessa vez, Jisung nem se surpreendeu quando Mark adivinhou corretamente cada pessoa que entraria lá.
— Hm, ela não vem quando eu não estou junto — Mark notou, olhando para o relógio.
— Ela quem?
— A Jaemin.
— Pra onde ela vai?
— Acho que vou ter que descobrir amanhã.
— Ou você pode enviar uma mensagem para ela — Jisung sugeriu.
— Não, hoje estou testando se passar o dia sem me comunicar com ela muda algo.
— E mudou?
— Só vou saber amanhã.
[⁹]
Pem! Pem! Pem!
Nada mudou.
[¹⁰]
Pem! Pem! Pem!
No seu décimo dia doze de abril, Mark começou um diário. Escreveu três linhas até perceber que no dia seguinte tudo desapareceria.
Suspirou.
Só mais um dia doze de abril.
[¹¹]
Pem! Pem! Pem!
No décimo primeiro dia, quando o alarme tocou — não dentro de sua casa, Mark notou — já estava na porta pronto para sair. Decidiu que precisava forçar diálogos diferentes se quisesse descobrir o que havia de errado, por isso, às oito e quinze da manhã estava na casa de Jaemin dizendo:
— Eu acho que vou morrer.
— Como assim?
— Você tem que me ajudar.
— Vamos pra um hospital! — Jaemin exclamou, já pegando a bolsa.
— Não… — Mark hesitou. — Vamos para a casa do Jisung.
— Por que o Jisung? — Ela cruzou os braços. — Seu ex-namorado médico é outro.
Mark piscou na direção dela: — Você tá insinuando que o Jisung é meu ex?
— Não é?
— Claro que não! — Mark riu. — Eu namorei o melhor amigo dele, ia ser paia se eu tivesse namorado ele também.
— Você não devia pensar assim. — Jaemin fechou a porta atrás de si. — A pista tá salgada e o Jisung é uma boa pessoa.
— Namore com ele, então.
— Não posso, já estou muito bem comprometida com… — ela pareceu se tocar ali — … o melhor amigo dele.
— Tá vendo? Nada de Jisung, agora entra no carro para irmos ver ele.
[...]
— Você e o Mark namoraram? — Jaemin perguntou, assim que Jisung abriu a porta.
— O quê? Não! — ele olhou para Mark buscando respostas.
— Eu tentei falar pra ela, mas ela não me ouviu.
— Vocês vieram até a minha casa só pra me perguntar isso?!
— Nope, temos um problema — Mark disse, empurrando ele de leve para poder entrar na casa, Jaemin o seguiu.
— Se isso é sobre o Jeno, eu já aviso logo que…
— Não tem nada a ver com Jeno — Mark se interrompeu, parou, pensou e perguntou: — Como essa sua frase ia terminar?
— Se isso é sobre o Jeno, eu já aviso que ele não está aqui.
— Nós sabemos — Jaemin falou, se acomodando no sofá. — Ele foi embora há uns três anos.
— Ah — Jisung soltou, quase sem querer. — Vocês não sabem.
— Não sabemos o quê? — Mark pressionou.
Jisung soltou um suspiro audível, olhou no fundo dos olhos de Mark e disse: — Ele voltou.
— O quê?
— Ele foi transferido para um hospital daqui. Já faz um mês.
E o mundo de Mark caiu.
[interlude]
Era uma tarde de primavera como qualquer outra quando Jeno o deixou. Essa história soava bem mais dramática do que realmente era, mas não havia forma alguma de evitar, era um término. Mark e Jeno estavam felizes em um relacionamento há pouco mais de sete meses quando o e-mail chegou.
Desde que se conheceram, por influência de um amigo em comum, Mark sempre soube que Jeno aspirava coisas grandes, que ele tinha sido feito para coisas grandes. Quando o conheceu, ele já estava na metade do internato, e seus objetivos sempre estiveram abertos para todos verem: Lee Jeno seria cirurgião traumatologista, um dos bons, e trabalhava duro para isso.
No fatídico dia em que o e-mail chegou, Jeno não cometeu um único erro, nunca cometia. Ele informou Mark sobre a proposta de emprego, explicou todos os detalhes — residência em outro país, hospital de elite, grandes chances de ser residente chefe ao final do ciclo —, pediu para que ele desse sua opinião no assunto, discutiu suas opções com ele e o informou de sua decisão assim que a tomou.
Jeno fez tudo certo, mas isso não queria dizer que doeu menos.
A ideia do término partiu de Mark, após muito pensar e discutir com o namorado, os amigos e seu psicólogo, ele chegou a conclusão de que não aguentaria viver em um mundo onde Jeno era seu na teoria, mas nem tanto na prática. Sentiria falta dele todos os dias e essa saudade pioraria com a ideia de que Jeno ainda era seu namorado, ele só não podia tê-lo. Terminar com Jeno foi fácil, ele sempre foi uma pessoa prática, tudo que você quisesse dele era só informar e ele te diria se estava de acordo ou não.
— Você tem certeza? — Jeno perguntou, na ocasião.
Aquilo estava sendo devastador para Mark. Tendo o namorado deitado em seu peito, prestes a aceitar o término sem fazer perguntas, com as malas dele já feitas no canto do quarto, Mark pensou que fosse morrer ali mesmo.
— Tenho.
— Tudo bem — Jeno concordou, levantou a cabeça e deixou um selinho em seus lábios. Acrescentou: — Você ainda vai me levar no aeroporto?
— Óbvio, quero olhar para você o máximo que eu conseguir.
No fim das contas, a última visão que Mark teve de Jeno estava borrada pelas lágrimas que se acumularam em seu rosto quando ele disse “adeus” ao seu maior amor. No dia em que o mundo de Mark acabou, o céu estava azul, as flores tinham cores vibrantes e os pássaros cantavam.
[¹²]
Pem! Pem! Pem!
Doze de Abril. Doze vezes.
Naquela manhã, Mark não estava com vontade de levantar da cama, a ideia de que Jeno estava em algum lugar pela cidade parecia assustadora demais para ele. Não era como se ele ainda estivesse apaixonado por Jeno, não, já fazia mais de três anos desde o término deles, mas Jeno era como uma força da natureza, ele era inevitável.
Ainda mais para o pobre coração frágil de Mark.
De vez em quando, Mark gostava de se lembrar dos seus momentos favoritos ao lado de Jeno, mas essas sessões sempre acabavam com a terrível percepção de que todos os momentos que passou com ele eram especiais à sua maneira.
Chenle bateu na porta. Mark ignorou, virou para o lado e fechou os olhos. Naquela manhã, sonhou com o lindo sorriso encravado em seu coração.
[☆]
— Amanhã eu posso, hoje estou de plantão — Jeno disse, abrindo a geladeira. — Acabou o leite?
— Tem mais no armário. — Mark gesticulou vagamente. — Eu posso amanhã também, vou dar aula até às seis.
O barulho no balcão chamou a atenção de Mark, era Jeno deixando a caixa de leite em cima dele e o encarando fixamente.
— O que foi? — Mark perguntou.
— Nós deveríamos morar juntos — Jeno declarou, confiante.
— O quê?
— Nossos horários nunca batem — ele reclamou. — Se morássemos juntos, pelo menos nos veríamos com mais frequência.
Mark considerou. Eles estavam juntos há pouco mais de três meses, parecia cedo demais.
— Eu vou entender se você não quiser — Jeno disse, dando de ombros. — Não foi um convite, foi mais um comentário.
— Meu amor…
— E não precisa responder agora. — Jeno deu a volta no balcão e deixou um beijinho nos lábios do namorado. — Eu te amo, não importa onde você more.
— Eu também te amo, meu bem.
[☆]
Pem! Pem! Pem!
Doze de abril, treze vezes. A primeira coisa que Mark fez foi soltar um longo suspiro derrotado. Aquilo estava começando a ficar chato.
[...]
Pem! Pem! Pem!
Quatorze. Nada novo.
[...]
Pem! Pem! Pem!
Quinze. Nada novo.
[...]
Pem! Pem! Pem!
Dezesseis. Nada novo.
[¹⁷]
Uma brisa suave batia contra os fios de cabelo dele, fruto da proximidade que ele tinha do rio. A ponte estava vazia naquele horário, tarde da noite, um carro passava a cada 20 minutos, desde que Mark chegou lá, quatro carros já tinham passado. Ele não tinha nenhum objetivo em mente, apenas observava o rio correndo pensando se ele desaguaria em algum lugar próximo.
A água do rio nunca era a mesma, mas Mark tinha certeza que se voltasse lá no dia seguinte, seria.
— Moço, você não vai se jogar, né?
Olhando por cima do ombro, Mark viu uma garota que não podia ter mais de vinte anos parada atrás dele, o carro dela estacionado na frente do seu.
— Não vou — ele garantiu, voltando a olhar para o rio.
— Tem certeza? O que está fazendo aqui?
— Olhando. Procurando novas paisagens.
— Ah — a garota olhou ao redor, parecendo procurar algo. — Não se joga, tá?
— Eu não vou — Mark repetiu, soprando uma risada. Não era como se ele não tivesse cogitado a ideia, mas a descartou rapidamente.
— Que bom… — ela fez uma pausa. — Isso não vai resolver nada.
E Mark supôs que não, não ia resolver mesmo.
[...]
Pem! Pem! Pem!
Dezenove. Nada novo.
[...]
Pem! Pem! Pem!
Vinte e um.
Se o tempo estivesse correndo da forma correta, seria o dia do show da Olivia Rodrigo. Mark estava começando a considerar que talvez ela tivesse algo a ver com essa situação. Enfim, nada novo.
[...]
Pem! Pem! Pem!
Vinte e três. Nada novo.
[²⁴]
Antes do alarme tocar no vigésimo quarto dia, Mark estava debruçado em sua janela, esperando para ouvir de onde o som viria. Estava tão terrivelmente entediado que faria qualquer coisa para dar um ar de novidade aos seus dias. O relógio do seu celular marcava 7:59, a qualquer momento o alarme tocaria.
Estava muito mais animado com aquilo do que deveria, dada a situação, mas nem se importava, estava prestes a descobrir quem era o dono do alarme misterioso e, se tivesse sorte, poderia ir até lá descobrir o que de tão importante a pessoa tem para fazer pela manhã!
Céus.
Mark estava mesmo enlouquecendo.
Pem! Pem! Pem!
O alarme soou ao mesmo tempo em que uma dor muito forte atingiu a cabeça de Mark, fazendo-o fechar os olhos e levar a mão até ela. A dor era quase insuportável, de um jeito que fazia Mark querer bater a cabeça na parede, mas não o fez. A dor parou ao mesmo tempo que o alarme.
— Droga! Não ouvi quem era.
Sem mais ideias do que fazer durante o dia, Mark foi ajudar Chenle a conseguir os ingressos para o show da Olivia Rodrigo. Eles conseguiram de primeira.
Ótimo, no dia seguinte Mark ajudaria de novo.
[...]
Pem! Pem! Pem!
Vinte e cinco. Nada novo.
Exceto que, quando o sol se pôs, Mark teve a brilhante ideia de ficar acordado a noite toda para tentar forçar o dia a mudar.
[²⁶]
Pem! Pem! Pem!
O plano foi por água abaixo cedo demais, quando ele dormiu, mal era meia noite. Nada novo.
[²⁷]
Pem! Pem! Pem!
O alarme é do vizinho do apartamento 212, provavelmente.
Fora isso, nada novo.
[²⁸]
Pem! Pem! Pem!
Com um dia inteiro de mesma coisa pela frente, Mark entrou no carro e foi para a casa de Jaemin, sentindo falta da amiga, pois já fazia quatro dias desde a última vez que a viu.
— Nos vimos ontem, Mark — ela disse, entrando no carro. — Para onde estamos indo?
— Para a casa do Jisung.
— Por quê?
— Parabéns pelo noivado! — ele disse, mudando de assunto. Em seus testes, já tinha percebido que era melhor explicar as coisas se Jisung estivesse junto para tirar as dúvidas da amiga. — Eu vi a aliança no dedo dele hoje de manhã.
Percebeu também que era melhor para todos se ele fingisse que descobriu sozinho sobre o noivado, dessa forma, não comprometeria ninguém.
— Obrigada! A gente tinha planejado…
E estavam de volta ao roteiro.
Chegando na casa de Jisung, ele nem esperou o “bom dia” antes de ir entrando, se jogou no sofá, afastou as almofadas e olhou para os dois amigos ainda parados na porta.
— Estou preso em um loop temporal.
Explicar a história se mostrava uma tarefa cada vez mais fácil, ele estava começando a entender quais eram os pontos cruciais e onde os amigos sempre tinham mais perguntas, então agora tinha uma explicação quase perfeita para a situação. Ao fim do conto, eles desceram para o porão e, quando todos estavam satisfeitos e acreditando na história, Mark disse:
— Hoje é o meu vigésimo sexto dia doze de abril e, como não encontramos uma solução antes, imagino que eu esteja preso nessa para sempre.
Jisung riu, mesmo tentando segurar, e perguntou: — Então por que você está aqui?
Mark deu de ombros: — Estava entediado. — Se levantou. — Me oferece um pouco do chá gelado que você faz, por favor.
— Como você… — Jisung começou, mas percebeu no meio da frase. — Vem.
Os três subiram para a cozinha, Jisung serviu o chá e eles se sentaram ao redor da mesa.
— Ela vem toda vez? — Jisung perguntou.
— Só teve uma vez que eu não trouxe ela, mas foi quando eu estava testando a influência dela no loop.
— Por que eu venho? — Jaemin perguntou, tão curiosa quanto Jisung.
— Porque eu te amo e você é meu apoio emocional.
A resposta satisfez a todos, não tinham mais perguntas sobre Jaemin.
— Então… Você disse que estava entediado?
— Eu preciso de ideias novas, me ajudem! — Mark implorou.
— Você pode ir ao parque.
— Chato.
— Você pode ir ver a minha exposição no… — Jaemin começou, animada.
— Fiz isso nos dias um, dois, quatro, cinco, oito e quinze — Mark interrompeu. — É uma exposição linda.
Jaemin sorriu com o elogio, mas o sorriso logo sumiu ao perceber que não tinha mais ideias. Jisung, por sua vez, perguntou:
— Você pensou muito em morte desde que ficou preso?
— Consideravelmente — Mark respondeu, concordando com a cabeça. — Eu já li algumas histórias em que a personagem ficava presa no loop porque ela ou alguém próximo a ela morreu.
— E…?
— E eu sei que eu não morri ao fim do dia, mas…
— Você está se perguntando se alguém morreu e você ainda não sabe — Jaemin completou por ele.
— Isso.
— Mark, olha — Jisung pareceu pensar nas palavras certas para dizer. —, eu não acho que alguém que você ama esteja morrendo.
— Por que não?
— Acho que você já teria percebido. — Jisung considerou. — E normalmente quando esse é o problema, a personagem tem o poder de fazer algo para impedir, você não tem.
E lá se foi a teoria mais plausível que Mark tinha para aquela situação. Um silêncio desconfortável pairou sobre eles, até que Jaemin perguntou, baixinho:
— Você já fez tudo mesmo?
— Vivi o mesmo dia vinte e cinco vezes, nada mais me surpreende hoje.
E, em um timing digno de comédia, aconteceu. Batidas na porta assustaram Mark, ele olhou para a porta, olhou para os amigos, olhou para o relógio na parede e decidiu que, sim, deveria entrar em pânico.
— Espera — ele pediu ao ver Jisung se levantar. — É a primeira vez que isso acontece.
— O quê?!
— Já estive aqui neste mesmo horário umas mil vezes e ninguém nunca bateu na porta.
Os três encararam a porta assustados.
— O que isso quer dizer? — Jaemin perguntou, ofegante.
A pessoa do lado de fora bateu de novo, parecendo mais desesperada.
— Se escondam. — Jisung ordenou. — Não saiam até eu dizer que podem sair.
Mark e Jaemin concordaram e se esconderam em um lugar onde ficassem longe do campo de visão de quem estivesse na porta, mas ao mesmo tempo pudessem escutar a conversa. Jisung tirou os copos da mesa e correu para abrir, dando de cara com quem menos esperava naquele momento.
— Você precisa me ajudar — disse a voz inconfundível de Lee Jeno. — Eu acho que estou vivendo o mesmo dia em looping.
Ah. Ótimo. Era só o que faltava.
